“Aos 40 anos, nos tornamos aquilo que somos.” A frase, concebida um século atrás pelo escritor francês Charles Péguy, ajusta-se com precisão à história de ISTOÉ. Ao completar quatro décadas em 2016, a revista confirmou aquilo que sempre foi: protagonista e agente transformadora dos acontecimentos mais marcantes da história recente do Brasil. Foi assim desde a primeira edição, em maio de 1976, quando a publicação clamou pelo fim do regime totalitário e pela volta à democracia, mesmo com o País vivendo sob a sombra da ditadura. Depois da corajosa capa de ISTOÉ, os gritos em prol da liberdade se tornaram mais assíduos. Foi assim na edição de 8 de julho de 1992, que trouxe uma reportagem de capa em que o motorista Eriberto França revelava, com exclusividade, que PC Farias, ex-caixa de campanha de Fernando Collor, bancava as despesas da família do presidente. Em seguida ao depoimento de Eriberto à CPI, Collor caiu. Foi assim em março de 2016, com a reportagem “Delcídio Conta Tudo.” Nela, os leitores conheceram, também com exclusividade, o teor explosivo da delação premiada do senador. Após as revelações de Delcídio, o impeachment se tornou um caminho sem volta para a então presidente Dilma Rousseff.
Graças a seu jornalismo independente, ISTOÉ foi determinante para o afastamento de dois presidentes da República envolvidos em episódios nebulosos. Nenhuma outra publicação brasileira, em qualquer período da história, pode se orgulhar de ter feito o mesmo. “A revista contribuiu para as profundas transformações do Brasil nas últimas quatro décadas”, diz Domingo Alzugaray, fundador da Editora Três, que publica ISTOÉ. “E fez isso sem se atrelar a nenhum grupo político ou econômico.” Mesmo em momentos de turbulência (o País, em quarenta anos, enfrentou um sem-número de crises políticas, econômicas e institucionais), a revista jamais se curvou. “Nossa trajetória é marcada pela independência”, diz Caco Alzugaray, presidente executivo da Editora Três. “Ser independente não significa ser isento. Não somos isentos: estamos do lado do Brasil e dos brasileiros.” Filho de Domingo, Caco começou a trabalhar na Editora Três em 1989 e passou por todos os departamentos da empresa antes de se tornar presidente executivo, em 2007.
Denúncia das mazelas nacionais
ISTOÉ nasceu em maio de 1976 como revista mensal, mas logo se transformaria na primeira semanal da editora, com direção do jornalista Mino Carta. Reportagens que denunciavam as mazelas nacionais — corrupção, miséria, violência — se tornaram frequentes nas páginas da revista, que rapidamente começou a deixar sua marca no mercado. O regime militar ia relutantemente se abrindo e a revista aproveitava cada brecha. Naquele período pulsante, as reuniões de pauta pareciam comícios, de tanta vibração política. Participavam delas convidados ilustres, como o futuro presidente Fernando Henrique Cardoso.
ISTOÉ descobriu, e pôs na capa, um irrequieto líder metalúrgico do ABC, Luiz Inácio da Silva, apelidado de Lula. Era a estreia dele em uma publicação de alcance nacional, o que reforça a contribuição da revista para cristalizar a democracia no País. Com ISTOÉ, milhões de leitores descobriram que o bom jornalismo nasce da contradição e do debate, e não do pensamento único. Esse espírito moveu a publicação em toda a sua história. Em maio de 1993, ISTOÉ trouxe uma reportagem que mostrava as relações obscuras do então ministro da Economia, Elizeu Rezende, com uma grande empreiteira. O ministro caiu e para o seu lugar o presidente Itamar Franco convocou Fernando Henrique Cardoso. Ao assumir o comando da economia, FHC lançou o Plano Real e, em 1994, foi eleito presidente do Brasil. Dois anos depois, ISTOÉ revelou o primeiro escândalo do governo FHC: as manobras na definição de uma licitação de US$ 1,4 bilhão para a compra de radares na Amazônia, em um caso que depois veio a ser conhecido como o escândalo do Sivam e levou à queda do embaixador Júlio César Gomes dos Santos.
Avanços e desvios na história do País foram apurados e escancarados por ISTOÉ, sempre pautada pelo compromisso de buscar a verdade dos fatos e o papel de seus atores. A primeira prova de caixa 2 nas campanhas eleitorais se deu em uma reportagem publicada em 1995, que exibiu documentos comprometedores de parlamentares, no caso conhecido como o escândalo da “Pasta Rosa.” Outro rumoroso evento que maculou a imagem do Congresso, a fraude no painel eletrônico do Senado, foi apresentado pela primeira vez nas páginas da revista. O escândalo resultou na renúncia dos senadores Antônio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, à época algumas das figuras mais poderosas do País. Em 2010, ISTOÉ foi a primeira publicação a denunciar os desvios de dinheiro, feitos pelo engenheiro Paulo Preto, na campanha de José Serra à Presidência. O episódio foi determinante para que a então candidata Dilma Rousseff ultrapassasse Serra na corrida presidencial. Em 2015, foi a vez de a revista revelar que o amigo íntimo de Lula, José Carlos Bumlai, contraiu um empréstimo irregular de R$ 12 milhões para favorecer o PT e jogou o ex-presidente no rol dos envolvidos no Petrolão.
Vocação inovadora
A trajetória de ISTOÉ não está ligada apenas à política. Inovadora, a revista foi a primeira do País a dar espaço para assuntos de interesse geral. “Ampliamos as áreas de comportamento e cultura e logo fomos imitados pelos concorrentes”, diz o jornalista Tão Gomes Pinto, que dirigiu a revista entre 1993 e 1996. Seu sucessor, Hélio Campos Mello, que ficou à frente da publicação por mais de uma década, afirma que a história vitoriosa da revista deve ser creditada ao “espírito guerreiro de uma bravíssima equipe de jornalistas.” Diretor editorial da Editora Três, Carlos José Marques reforça os princípios que estão impressos no DNA da empresa. “Nessas quatro décadas, desde a primeira edição, ISTOÉ vem confirmando sua vocação para registrar, provocar e participar das mudanças no País, sempre pautada por um jornalismo noticioso, analítico, plural e independente”, diz Marques. “Nosso maior dever, e o objetivo essencial, é trazer ao leitor a informação completa e abalizada.” Atual diretor de redação, Mário Simas Filho destaca a busca incessante pela qualidade. “O jornalismo da revista não compactua com interesses específicos de grupos ou pessoas”, afirma Simas.
Para os próximos 40 anos, a ISTOÉ tem o dever de se manter sintonizada com as mudanças da sociedade. A internet impôs, ao mesmo tempo, enormes desafios e oportunidades ao mercado editorial. Nesse aspecto, a revista está bem posicionada. De acordo com os mais recentes dados disponíveis do Instituto ComScore, o site de ISTOÉ registrou, em 30 dias, 3,1 milhões de visitantes únicos. Principal concorrente da publicação, a revista Veja acumulou 4,9 milhões no mesmo período, enquanto Época não passou de 2,7 milhões. Outro indicador que comprova o alcance de ISTOÉ diz respeito ao nível de engajamento (quando alguém compartilha e interage com uma notícia) de seus leitores em redes sociais. Segundo o ranking Torabit, um dos mais confiáveis do setor, ISTOÉ é o sexto veículo noticioso com maior capacidade de engajar seus leitores. Se o passado de ISTOÉ merece aplausos, seu futuro é igualmente promissor. “Além de estar na vanguarda do meio digital, no impresso a revista se mantém como a segunda maior revista em circulação no Brasil, conforme atesta recente pesquisa do Ibope TGI, considerada a mais importante pelo mercado publicitário brasileiro”, afirma Caco Alzugaray.
- No ano em que a revista ISTOÉ completa 40 anos, relembre 40 fatos que transformaram o Brasil e o mundo nas últimas quatro décadas
- 1976 – A ditadura e a tortura escancarada: os assassinatos de Vladimir Herzog e Fiel Filho nos porões da ditadura deram início à implosão do regime militar
- 1978 – Nasce o primeiro bebê de proveta: a fertilização in vitro trouxe aos casais com problemas reprodutivos a chance de realizar o sonho de ter filhos
- 1978 – As greves que mudaram o Brasil: movimento no ABC colocou os trabalhadores no processo de democratização e apresentou ao País lideranças como o sindicalista Lula
- 1981 – As bombas que explodiram o regime: ataque frustrado no Riocentro evidenciou a radicalização nas Forças Armadas e a urgência da redemocratização
- 1982 – Descoberto o vírus da Aids: a epidemia surgiu avassaladora – e cercada de preconceito. De ameaça mortal, tornou-se doença crônica
- 1983 – Diretas já, o clamor das ruas: num movimento de mobilização inédito, brasileiros exigiram a volta da democracia e o direito de eleger seus presidentes
- 1985 – O Brasil perde Tancredo Neves: a morte de Tancredo às vésperas da posse como presidente da República causou comoção nacional, num reencontro da população com civismo
- 1986 – A tragédia em Chernobyl: acidentes em usinas nucleares aterrorizaram o mundo, mas o uso dessa forma de energia continuou crescendo
- 1988 – A Constituição cidadã: carta Magna garantiu direitos básicos a todos os brasileiros, mas faltou discriminar a origem dos recursos para que o Estado cumpra seus deveres
- 1988 – Chico Mendes, o mártir dos povos da floresta: ele conseguiu levar adiante a implantação das reservas extrativistas e seu assassinato revelou a violência agrária no Brasil
- 1989 – O massacre na Praça da Paz Celestial: após a violenta repressão aos manifestantes que pediam abertura política, governo chinês buscou a legitimidade no crescimento econômico
- 1989 – A frustração com Collor: primeiro presidente eleito após o fim do regime militar, Fernando Collor de Mello traiu seus eleitores ao confiscar a poupança e gerar crise gigantesca
- 1989 – A queda do muro de Berlim: o maior símbolo da divisão mundial foi derrubado por populares em ato que marcou o fim da Guerra Fria e o colapso do império comunista da URSS
- 1991 – A invenção da internet: depois de mudar a economia e os hábitos das pessoas, a internet deverá avançar ainda mais sobre os serviços e os objetos
- 1992 – Collor, o primeiro impeachment: afogado em um mar de corrupção e com os caras-pintadas nas ruas, Fernando Collor renunciou antes de ser cassado pelo Congresso
- 1992 – A revolução do Euro: em continente marcado por cicatrizes de guerras, UE trouxe riqueza e liberdade aos países da região
- 1994 – Real, o plano que funcionou: proposta de FHC estabiliza a inflação e coloca a economia brasileira em outro patamar
- 1994 – O Brasil chora a morte de Senna: reverenciado em todo o mundo, o piloto se tornou um exemplo de determinação e superação de limites
- 2001 – 11 de Setembro, o ataque que mudou o mundo: atentados marcam o avanço do extremismo sobre o Ocidente e criam era de insegurança
- 2003 – Lula, o metalúrgico chega à Presidência: inclusão social e ascensão da classe média marcaram o governo Lula, que acabou manchado pela corrupção
- 2005 – Mensalão, o País pune os corruptos: o PT é flagrado comprando apoio político e seus principais líderes são condenados
- 2007 – A revolução do iPhone: Steve Jobs redefiniu a forma de interagir e transformou os negócios ao lançar um aparelho de design elegante e aberto a novos aplicativos
- 2008 – Crise financeira de 2008, a quebra do século: falência do Lehman Brothers foi o estopim da maior crise econômica mundial desde a recessão de 1929
- 2008 – Barack Obama, o estadista: a histórica ascensão dos negros, os pactos climáticos, a reaproximação de Cuba: Obama mudou o olhar do mundo para a América
- 2009 – Adeus a Michael Jackson: morte do rei do pop chocou o mundo e pôs em debate o uso excessivo de drogas lícitas
- 2010 – A primavera árabe: convocado pela internet e pelas redes sociais, levante inédito derrubou chefes de Estado opressores, mas gerou guerras civis sangrentas e crise migratória
- 2012 – Malala e a revanche feminina: o atentado contra Malala deu voz a um novo feminismo e expôs ao mundo a realidade de 65 milhões de meninas que continuam longe das escolas
- 2013 – Junho de 2013, o grito das ruas: as manifestações que levaram milhões de jovens de volta às ruas pautaram uma nova forma de olhar a política e a ética
- 2013 – Francisco, o Papa do povo: após a renúncia de Bento XVII, o argentino Jorge Mario Bergoglio torna-se o papa Francisco, com um discurso de inclusão, humildade e simplicidade
- 2013 – Mandela, símbolo da luta pela liberdade: o legado do ativista que combateu o regime segregacionista do Apartheid e liderou a pacificação de um país ainda dividido pela cor da pele
- 2014 – Sergio Moro passa o Brasil a limpo: a Lava Jato mostrou a gravidade da corrupção no Brasil ao mandar para a cadeia empresários e políticos que se imaginavam inatingíveis
- 2014 – O maior vexame da história: o Brasil sofreu para provar que era capaz de organizar uma Copa, mas penaria ainda mais em campo, com a derrota por 7 a 1 para a Alemanha
- 2015 – Crise dos refugiados, a catástrofe do nosso tempo: problema coloca 65 milhões de pessoas vagando e revela o crescimento da xenofobia e da extrema direita
- 2015 – Desastre de Mariana e o Brasil na lama: o rompimento de uma barragem da Samarco em Mariana, MG, provocou a maior tragédia ambiental da história do Brasil
- 2015 – Atentados em série transformaram a França em principal vítima do radicalismo islâmico, expondo a dificuldade em antecipar as ações dos terroristas
- 2016 – O impeachment de Dilma Rousseff: impopular, incapaz de manter a governabilidade e em meio a escândalos, a primeira presidente eleita no País teve seu mandato cassado
- 2016 – Michel Temer presidente: peemedebista chega ao poder com o desafio de recolocar o País nos trilhos
- 2016 – Brexit, o fim de um sonho: britânicos votam pela saída da União Europeia e podem dar início ao esfacelamento do bloco
- 2016 – Rio-2016, o resgate do orgulho nacional: Olimpíada no Rio supera desconfiança mundial, deixa legado histórico e revela novos heróis do esporte brasileiro
- 2016 – A vitória de Donald Trump: com um discurso xenófobo, protecionista e ameaçador, o magnata americano se elegeu presidente da maior potência mundial
Esta é uma versão da matéria que integra a Edição Especial de 40 anos da Revista ISTOÉ, que circulou em 25.11.2016 (Edição #2451).