Dono da voz que ecoava de uma das mesquitas mais belas de Israel, há 15 anos Ibrahim Masri era o responsável por chamar os muçulmanos a orar diariamente.
Mas, a partir de agora, outro muezim assumirá a responsabilidade de convocar os fiéis às orações cinco vezes por dias na mesquita El Jazzar do Acre (São João do Acre para os cristãos), isso devido à outra atividade mais profana de Masri: o fisiculturismo.
O ministro israelense do Interior, Aryeh Deri, que supervisiona temas religiosos nas comunidades não judaicas, demitiu Masri após chegar à conclusão de que o levantamento de peso, que geralmente envolve usar pouca roupa para exibir os músculos, não combina com o papel de muezim de uma mesquita.
Neste fim de semana, Masri terá a demissão oficializada e, por consequência, perderá sua principal fonte de renda.
– “Inapropriado” –
Ibrahim Masri, 46 anos e 105 quilos, levanta peso desde a adolescência. Na mesquita de Acre, na antiga cidade portuária fortificada e catalogada como patrimônio da humanidade, no norte do país, é tão conhecido pelos ombros largos e o tamanho dos bíceps como pela voz única que viaja pelas ruas através dos alto-falantes. Ele garante nunca ter visto uma contradição entre as duas atividades.
“É uma decisão injusta”, declarou este membro da comunidade árabe de Israel à AFP, que o visitou na mesquita. “O islã incentiva a todos a praticar esportes”.
Os problemas começaram quando Masri ganhou o campeonato de Israel de fisiculturismo em 2017. Alguns meses depois, foi convocado por uma comissão de funcionários religiosos.
“Me mostraram fotos minhas durante a competição e me disseram que achavam que era inapropriado para um muezim praticar este esporte”, lembrou. Segundo a comissão, o fato de usar pouca roupa enquanto compete é inaceitável para pessoas mais religiosas.
Após o processo, o Ministério do Interior informou a Masri que ele perderia o emprego ao final de janeiro.
Masri se defendeu das acusações na época, afirmando que o ministério sabia que ele tinha o fisiculturismo como segunda atividade e que havia prometido parar de competir.
– “Nada a acrescentar” –
Masri foi demitido “de acordo com as regras”, afirmou um porta-voz do ministério. O recurso apresentado foi examinado pela comissão competente, “que chegou à conclusão de que não havia nada a acrescentar à decisão do ministério e a demissão foi aprovada”, completou.
Esta decisão foi mal recebida em Acre, uma cidade que era principalmente cristã e muçulmana antes da fundação do Estado de Israel, e cuja população é hoje majoritariamente judaica (72%), segundo a prefeitura, embora siga contando com uma minoria significante de árabes.
“Como podem privar Ibrahim de seu emprego só porque participou de uma competição?”, questiona Wissam Zalafi, um guarda da mesquita. “Nenhum muezim tem uma voz tão bonita em Acre”, afirma.
O xeque Mohamed Kiwan, líder dos imãs da mesquita, argumentou que Ibrahim Masri “não pediu permissão à administração antes de participar da competição”.
“Não lhe corresponde mostrar sua intimidade diante de homens, mulheres e crianças”, completou, admitindo, porém, que poderia ter sido melhor dar a Masri um ultimo aviso antes de demiti-lo.
Agora, Masri poderá dedicar mais tempo ao clube de fisiculturismo para jovens que ajudou a abrir em Acre. Um desses garotos, Amal Jatib, garante que a academia lhe ajudou a se estabilizar e a encontrar um emprego.
Masri ainda tem um recurso em andamento que deve ser examinado nos próximos dias, e um manifesto de apoio foi lançando, explicou seu advogado, Lior Ben Binyamin.
Jaber Mushahi, um homem de 80 anos que costuma rezar em El Jazzar, explicou que fez a peregrinação a Meca e que “em nenhum lugar há uma voz tão bonita” como a de Ibrahim Masri.