O debate na noite de ontem na TV Globo foi a última chance de Jair Bolsonaro reverter um quadro dramático para sua candidatura. E sua reação após o final do programa deu uma medida do seu estado de nervos. Abandonou uma entrevista coletiva depois de brigar com jornalistas. O pastelão envolveu até o presidente dizer que não responderia a um profissional português porque “não fala portunhol”.

É o retrato perfeito do final da campanha: o presidente isolado, irritado, falando apenas para a própria base e sem oferecer uma proposta que abarcasse o conjunto da população. Aliás, Bolsonaro nunca se portou como um mandatário de todos os brasileiros, mas apenas líder de sua facção. Lula soube explorar isso ao “pedir desculpas” aos espectadores pelo nível do debate.

O petista acertou ao  se mostrar mais equilibrado e ao centrar seu discurso nas benesses econômicas que promete. Mas escorregou ao atacar enfaticamente Michel Temer, chamando-o de “golpista”. Isso se choca com a necessidade de dialogar mais com o centro, a classe média e os empresários. Além disso, Simone Tebet, aliada de Temer, se tornou um trunfo importante do ex-presidente na reta final da campanha. Lula não tinha dito que desejava fazer um governo “além do PT”? Ou ele será apenas para os “companheiros e companheiras”? (o petista se dirigiu assim aos espectadores em outro momento, em nova gafe)

De resto, o debate também foi um retrato fiel de uma campanha polarizada, que aconteceu em meio a uma guerra suja nas redes sociais e com golpes baixos impedindo qualquer discussão séria sobre os desafios do País. Bolsonaro ameaçou o tempo todo dar um golpe para impedir o pleito, até na última semana da disputa. Mas o Centrão, a cúpula militar e os poucos políticos razoáveis que o cercam não embarcaram nessa canoa furada. O factóide do “radiolão” e o ataque kamikaze de Roberto Jefferson mostraram que a ameaça do “Capitólio tupiniquim” era apenas uma operação Tabajara, uma caricatura do que foi a interminável gestão Bolsonaro.

Essa campanha foi uma disputa de rejeições. Os números mostram que o bolsonarismo e o petismo ainda são amplamente reprovados. Se Lula confirmar o favoritismo e vencer neste domingo, precisará dialogar com toda a sociedade para pacificar o País. Se, como mostrou ao citar Temer, transformar sua eventual gestão em uma revanche contra o Judiciário, tentando surfar numa falsa hegemonia petista, vai acirrar ainda mais a divisão na população.

Que os bons momentos de Lula no debate sejam uma luz para ele e indiquem o caminho da reconstrução do País. Já Bolsonaro, após o sprint final, terá apenas a opção de continuar pregando para a própria bolha e, mais dramático para ele, enfrentar a Justiça. A expectativa de não ter mais foro privilegiado daqui a dois meses, precisando prestar contas de todos os seus atos no governo como réu, pode ser a verdadeira explicação para tamanho destempero ao