13/01/2020 - 15:01
Autoridades iraquianas temem um “colapso” econômico do país se Washington impuser sanções ao Iraque, especialmente se bloquear o acesso à conta nos Estados Unidos onde o país tem sua receita proveniente do petróleo. A commodity representa 90% do orçamento nacional.
O presidente americano, Donald Trump, criticou duramente a decisão do Parlamento iraquiano, anunciada em 5 de janeiro, de expulsar as forças militares estrangeiras. Deste contingente, fazem parte 5.200 militares americanos, que ajudam desde 2014 os soldados locais a combaterem os extremistas.
Se as tropas americanas forem forçadas por Bagdá a partir, Trump ameaçou: “imporemos sanções como nunca vistas”.
Washington enviou uma mensagem incomum e direta ao gabinete do primeiro-ministro Adel Abdel Mahdi, segundo autoridades da AFP.
“O escritório recebeu uma ligação ameaçando que, se as tropas americanas fossem expulsas, Washington bloquearia a conta [do Iraque] no Federal Reserve (Fed) em Nova York”, disse uma autoridade.
A decisão do Parlamento iraquiano sobre a presença militar americana foi tomada dois dias depois que um drone dos Estados Unidos matou uma dúzia de pessoas em Bagdá, incluindo o general iraniano Qassem Soleimani, chefe das forças Al-Quds, e seu braço direito no Iraque, Abu Mahdi al-Muhandis.
Este ataque causou indignação unânime no Iraque.
A conta do Iraque no Fed foi aberta em 2003, após a invasão militar dos Estados Unidos que tirou o ditador Saddam Hussein do poder.
De acordo com a resolução 1483 do Conselho de Segurança da ONU, que diminuiu as sanções e o embargo do petróleo imposto ao Iraque depois da decisão de Saddam de invadir o Kuwait, todos os recursos provenientes das vendas de petróleo do Iraque devem ir para essa conta.
O Iraque é o segundo maior produtor na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Mais de 90% de seu orçamento estatal – US$ 112 bilhões em 2019 – vem da receita com a commodity.
Até agora, essas receitas são pagas diariamente em dólares na conta do Fed, que hoje totaliza cerca de 35 bilhões de dólares, segundo fontes iraquianas.
“Somos um país produtor de petróleo. Essas contas estão em dólares. Impedir o acesso a elas significa fechar completamente a torneira”, disse uma autoridade iraquiana.
Um segundo responsável alerta que isso significaria que o governo seria incapaz de pagar suas despesas diárias e salários.
– Trump ‘politiza tudo’ –
Uma terceira autoridade iraquiana confirmou que os Estados Unidos consideram “restringir” o acesso a “um terço” da liquidez “que normalmente envia”.
O Federal Reserve se recusou a comentar as ameaças de Trump a esse respeito.
Uma fonte do Departamento de Estado americano confirmou à AFP que “aumentou” a possibilidade de restringir o acesso à conta do Fed, após a votação no Parlamento iraquiano.
“É possível imaginar por que: porque, se as tropas forem expulsas, os bancos ficariam nervosos em enviar quantias de liquidez para Bagdá”, explica.
Essa ameaça dos Estados Unidos parece incomum, uma vez que o Fed deve ser independente da política externa do país.
“A tentativa de politizar as remessas em dólares preocupa o banco, pois afeta seu prestígio e integridade, no relacionamento diário com os clientes”, afirmou a mesma fonte do Departamento de Estado ouvida pela AFP.
“É óbvio que Trump quer politizar tudo”, acrescentou.
As relações entre os Estados Unidos e o Iraque pioraram claramente nos últimos meses, devido à crescente influência do Irã nos assuntos domésticos do Iraque e aos ataques às instalações americanas por facções iraquianas.
Essas relações caíram a seu nível mais baixo após o assassinato do general Soleimani em 3 de janeiro passado.