Iranianos manifestam medo e incerteza nas redes sociais

População se vê pressionada entre ataques estrangeiros e violência do regime dos aiatolás. Vítimas fatais do conflito chegam a 430 no Irã, a maioria civis.Em menos de duas semanas, iranianos testemunharam ataques sem precedentes de Israel e EUA contra o Irã. Mísseis atingiram instalações nucleares e militares, mas também áreas residenciais. Nas redes sociais, muitos dizem viver sob a incerteza do que pode acontecer a seguir, seja pelo risco de um novo ataque estrangeiro, seja pelo medo da repressão imposta pelo regime dos aiatolás.

O Ministério da Saúde do Irã estima que, até o sábado (21/06), pelo menos 430 morreram em consequência dos ataques israelenses, a maioria civis. Mais de 3.500 ficaram feridos, milhares foram obrigados a deixar suas casas.

Após os EUA entrarem ativamente no conflito, as atenções se voltaram para o regime iraniano, cuja complexa estrutura segue na mira do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. Ele já insinuou que uma possível consequência da atual campanha militar seria uma "mudança de regime" no Irã. Muitos iranianos temem que tal pressão externa sobre os aiatolás seja pretexto para os líderes islâmicos intensificarem as táticas violentas contra seus próprios cidadãos.

No poder desde 1979, o governo teocrático em Teerã acumula denúncias de repressão e violação de direitos humanos. Protestos em 2022 contra o regime, por exemplo, deixaram mais de 200 mortos.

Muitos iranianos que vivem no exterior usaram as redes sociais para expressar preocupação com seus familiares no país. Alguns consideram deixar permanentemente o Irã, ou enviar seus filhos para nações vizinhas como Turquia ou Armênia nos próximos dias, especialmente se o conflito se exacerbar.

Repressão à população

Proibida de fazer reportagens em solo iraniano ou de transmitir no Irã, a DW recorreu às redes sociais do país para entender o que a população pensa sobre o conflito.

Muitos usuários das acreditam que, se os aiatolás permanecerem no poder, a vingança recairá sobre a própria população. Há relatos de que moradores estão sendo sistematicamente vigiados em postos de controle instalados nas entradas de várias cidades.

"Eles não conseguem enfrentar os aviões de guerra americanos e israelenses no céu, então montaram postos de controle no chão, para o povo", escreveu um usuário nas redes sociais.

Nas redes também há discussões sobre um aumento no número de prisões dentro do Irã sob acusações de "apoio a Israel".

As execuções relacionadas a vínculos com Israel também cresceram. Neste domingo, a agência oficial do judiciário iraniano informou que Majid Masibi foi executado sob acusação de "espionagem para Israel". As autoridades alegaram que ele havia mantido contato com a agência de inteligência israelense Mossad. Uma semana antes, outro indivíduo foi executado sob o mesmo pretexto.

Retaliação do regime amplia o medo

Após o ataque dos EUA ao centro de enriquecimento nuclear de Fordo, um usuário escreveu que teme o que o regime fará em resposta: "O mundo já era assustador com a República Islâmica no poder. Mas, se o regime sobreviver a esses ataques, o mundo se tornará um lugar ainda mais aterrorizante, muito pior do que antes."

Outros iranianos opinaram de que os ataques militares não bastarão para derrubar os aiatolás. Eles argumentam que apenas um levante popular interno, conduzido pelo próprio povo, pode levar à derrocada do governo.

O regime iraniano vem tentando minimizar os impactos da ofensiva americana, ao mesmo tempo em que comunica ao público que responderá de forma decisiva. O programa nuclear da República Islâmica é tomado internamente como uma fonte de poder e legitimidade.

Meios de comunicação estatais publicaram vídeos alegando que a vida próxima à instalação nuclear de Fordo segue normal e que os moradores continuam suas rotinas. A DW não pôde verificar a autenticidade desses vídeos de forma independente.

"Eles protegem urânio e poder, nunca os iranianos"

Iranianos que se dispuseram a criticar o regime questionam o enorme custo financeiro para manter o programa nuclear ao longo de décadas, especialmente agora que materiais e infraestrutura estão sendo destruídos.

Muitos argumentam que se, em vez de priorizar ambições militares, as lideranças religiosas tivessem investido esses recursos na criação de empregos ou no desenvolvimento nacional, o Irã não estaria enfrentando uma guerra, e provavelmente desfrutaria de uma posição econômica, social e política mais forte.

O líder pró-democracia iraniano Reza Pahlavi afirmou no X que os ataques foram "resultado da busca catastrófica do regime por armas nucleares, às custas do povo iraniano": "Ali Khamenei e seu regime terrorista em ruínas fracassaram com a nação. A única maneira segura de alcançar a paz é o fim desse regime agora."

Já Masih Alinejad, jornalista e ativista iraniano-americana, argumentou que a instalação nuclear de Fordo "nunca visou produção de energia para fins pacíficos": "Foi construída sob uma montanha para esconder do mundo seu programa nuclear, enquanto o regime dizia a seu próprio povo que não podia sequer oferecer água limpa ou abrigo. Agora, o mesmo regime está em guerra e ainda não construiu um único abrigo antiaéreo. Eles protegem o urânio. Protegem o poder. Nunca protegem os iranianos."

"Zombaria dos princípios do direito internacional"

Por outro lado, muitos tomaram as ruas de Teerã para protestar contra Israel. Como observado por analistas, as manifestações se partem de um sentimento de defesa nacional e não necessariamente do apoio ao regime dos aiatolás.

Segundo o holandês Grupo para Análise e Medição de Atitudes no Irã (Gamaan), mais de 80% da população alfabetizada iraniana não apoiava a República Islâmica em 2023.

No entanto, defensores do regime continuam ativos. Além de manifestações públicas contra os ataques dos EUA e de Israel, muitos também recorreram às redes sociais. Mohsen Borhani, advogado baseado no Irã, publicou na rede X que o ataque de Trump aos centros nucleares zombou de todos os princípios do direito internacional".

Outros clamam por retaliações contra alvos americanos e argumentam que o Irã agora tem o direito de se retirar do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), argumentando que não há mais justificativa para permanecer no acordo global.