Um projeto de lei sobre o uso do véu na cabeça no Irã provoca um intenso debate no poder, no qual os conservadores se mobilizam contra a rejeição de um número crescente de mulheres em cobrir a cabeça.

Desde a Revolução Islâmica de 1979, a lei iraniana exige que todas as mulheres usem um hijab que cubra a cabeça e o pescoço em locais públicos.

No entanto, cada vez mais mulheres iranianas estão saindo às ruas sem os hijabs, uma tendência que foi acentuada pelo movimento de protesto desencadeado pela morte de Mahsa Amini, uma jovem presa por violar o rígido código de vestimenta do país.

Os conservadores defendem com veemência a obrigatoriedade do uso do véu e consideram que seu desaparecimento daria início a um processo que modificaria profundamente as “normas sociais”.

Nesse contexto, o Judiciário e o governo propuseram, em maio, um projeto de lei chamado “Apoio à cultura do hijab e da castidade” para “proteger a sociedade” e “fortalecer a vida familiar”.

Este texto sugere o reforço das sanções, particularmente financeiras, contra “qualquer mulher que retire o véu em locais públicos, ou na Internet”.

“Este projeto de lei propõe criminalizar o não uso do hijab, assim como uma infração de trânsito, mas com multas mais severas”, disse à AFP o sociólogo Abbas Abdi.

Desde a morte de Mahsa Amini, a sociedade “não aceita que uma mulher seja presa por não usar o véu”, afirmou.

Nos últimos meses, as autoridades tomaram várias iniciativas, desde o fechamento de lojas, principalmente restaurantes, até a instalação de câmeras nas ruas para perseguir mulheres que desafiam a proibição.

Nos últimos dias, pelo menos três funcionários foram demitidos, ou detidos, por permitir o acesso de mulheres sem véu a locais históricos.

– Insuficientemente dissuasivo –

O projeto de lei, que foi publicado na mídia pró-governo, prevê que as infratoras recebam primeiro uma mensagem de advertência da polícia.

Em caso de reincidência, enfrentam uma multa de 500.000 a 6 milhões de tomans (cerca de 11 a 129 dólares ou 54 a 635 reais no câmbio atual), uma quantia significativa para muitas iranianas.

A isso soma-se a privação de direitos sociais e o confisco do carro por dez dias para as mulheres que dirigem.

O chefe do Judiciário, Gholamhossein Mohseni Ejei, defendeu o texto, frisando a necessidade de não polarizar a sociedade, apesar de compreender as “preocupações dos crentes” sobre o descumprimento do véu.

Enquanto aguarda a análise do Parlamento, o projeto de lei desperta a ira dos ultraconservadores, muito ativos no atual governo, para os quais não é “suficientemente dissuasivo”.

O jornal Kayhan considerou que vai encorajar “a expansão de um fenômeno repugnante”.

Os promotores da lei “não sabem que o inimigo” procura, ao eliminar o véu, “destruir a instituição familiar e atacar os fundamentos do sistema islâmico”, adverte o jornal.

Para alguns ultraconservadores, esses apelos à “desobediência social” são lançados pelas mídias sociais e pela mídia estrangeira, principalmente canais de televisão em língua persa.

No poder, “não há consenso sobre o hijab” entre os que preferem o caminho da repressão e os que “pensam que se deve tentar outros meios”, observa Abdi.

Nesse contexto, “o projeto de lei não satisfaz nem os defensores do hijab obrigatório nem os defensores da escolha das mulheres de cobrir ou não a cabeça”, completa.

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