Inversão de papéis: Moro será julgado por Cristiano Zanin no STF

Andressa Anholete/Agência Senado / Rosinei Coutinho/STF
Senador Sergio Moro (União Brasil-PR) e o ministro Cristiano Zanin Foto: Andressa Anholete/Agência Senado / Rosinei Coutinho/STF

Em um novo capítulo, mas em posições diferentes, o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) e o ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, vão ter um novo confronto. A Primeira Turma da Corte julgará, a partir de 3 de outubro, uma ação contra o parlamentar, acusado de calúnia contra o ministro Gilmar Mendes.

A denúncia, aceita pelo STF em junho de 2024, partiu da PGR (Procuradoria-Geral da República), que acusou Moro de caluniar o decano em um vídeo divulgado nas redes sociais. O Ministério Público Federal ainda solicitou que o ex-juiz perca o mandato caso seja condenado a mais de quatro anos.

A análise do caso ocorrerá pelo plenário virtual, em que os ministros apenas publicam seus votos até o dia 10 de outubro. A Primeira Turma do STF é composta pelos ministros Cármen Lúcia (relatora da ação), Alexandre de Moraes, Flávio Dino, Luiz Fux e Cristiano Zanin.

  • Vale lembrar: Zanin passará a presidência da turma para Flávio Dino a partir de 1º de outubro.

No vídeo que provocou a abertura da ação, Moro aparece em uma festa junina, em 2022, conversando com algumas pessoas. No diálogo, uma mulher diz: “Está subornando o velho”. O ex-juiz responde: “Não, isso é fiança. Instituto para comprar um habeas corpus do Gilmar Mendes”. A gravação veio a público somente em abril de 2023.

À época, por meio de nota enviada para a revista IstoÉ, Moro afirmou que a fala foi retirada de contexto, visto que foi divulgado apenas um fragmento, “e não contém nenhuma acusação contra ninguém”. Para a PGR, no entanto, o ex-juiz agiu com a intenção de manchar a imagem de Gilmar Mendes ao atribuir-lhe uma falsa prática de crime de corrupção passiva.

O ex-juiz contra-argumentou dizendo que o comentário foi feito em tom de brincadeira e que, depois, retratou-se publicamente, o que deveria extinguir a punibilidade. Moro ainda questionou o fato de o caso ser analisado pela Suprema Corte, visto que não exercia mandato público na data do ocorrido. O Ministério Público afirmou que as declarações ganharam repercussão nacional quando Moro já exercia o mandato de senador, o que justifica a tramitação no STF.

Virada de jogo: Moro, Zanin e a Lava Jato

Quando atuava como juiz federal da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sergio Moro esteve envolvido em uma das maiores e mais complexas investigações de combate à corrupção da história do Brasil: a Operação Lava Jato.

Moro foi o responsável por julgar os casos em primeira instância. Sua condução foi marcada pela aplicação de prisões preventivas e pelo uso de delações premiadas para obter informações sobre o esquema de corrupção.

Um dos pontos mais significativos da operação foi a acusação contra o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As investigações apontaram que petista teria recebido um triplex em um condomínio no Guarujá, litoral paulista, como propina da empreiteira OAS em troca de contratos com a Petrobras.

Com base na denúncia do Ministério Público Federal de que a doação do imóvel configurava vantagem indevida, Sergio Moro condenou Lula em 2017 a nove anos e seis meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

À época, Cristiano Zanin, um dos principais advogados de Lula no caso, entrou com uma série de ações e recursos nos quais questionou a atuação de Moro e a competência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar seu cliente. Além disso, argumentou que a operação era usada como instrumento de perseguição política.

A ação mais significativa de Zanin foi o pedido de suspeição do então juiz Sergio Moro, que acabou sendo levado ao STF. A solicitação ainda enfatizava que o magistrado agia, ao mesmo tempo, como juiz e acusador.

Durante a tramitação da ação, em junho de 2019, foi publicada uma série de reportagens do jornal The Intercept Brasil, conhecida como “Vaza Jato”, que revelou conversas privadas trocadas por aplicativo de mensagens entre Sergio Moro, o procurador Deltan Dallagnol (coordenador da força-tarefa) e outros membros da equipe.

As mensagens indicavam conselhos e sugestões de Moro para que os procuradores conduzissem as acusações em casos específicos. Além disso, mostravam críticas dos membros da operação à atuação dos advogados de defesa e discussões sobre o impacto político das decisões da Lava Jato.

Em 2021, ao julgar o pedido de habeas corpus, o STF decidiu, por 7 votos a 4, que Sergio Moro agiu com parcialidade no julgamento do caso do triplex, o que resultou na anulação de todas as condenações contra Lula.