A imprensa europeia ficou atônita neste sábado (11) diante da interminável crise política vivida pela França, onde o presidente Emmanuel Macron voltou a nomear o centrista Sébastien Lecornu como primeiro-ministro apenas alguns dias após sua renúncia.
A decisão foi criticada por todos, inclusive pela própria família política de Macron. E coloca Lecornu sob a ameaça de uma moção de censura mesmo antes de anunciar a composição de seu novo governo, a princípio neste fim de semana.
A nomeação, na sexta-feira à noite, provocou uma onda de reações nos principais jornais europeus, preocupados com as repercussões econômicas e financeiras dessa crise desencadeada com a antecipação das eleições de 2024.
No âmbito político, o jornal britânico Financial Times considera que esse enésimo sobressalto marca o fim do macronismo.
“Após uma semana de caos (…) está cada vez mais claro que a experiência de quase uma década da França com a política centrista rebelde de Macron está chegando ao fim”, escreveu.
O jornal espanhol El País descreveu, por sua vez, uma “sensação de ‘fin de siècle'” ou fim de uma era, em francês.
Macron, cuja popularidade se encontra em seu nível mais baixo, “é um líder completamente isolado, detestado por uma parte de sua própria formação, envolvido em uma espiral delirante de decadência”, acrescentou em uma análise.
“O brilhante tecnocrata, o reformista sem partido, o filósofo e banqueiro convertido em presidente da V República perdeu terreno. Resiste, agarra-se ao poder. Nada mais”, continuou o jornal espanhol.
Lecornu, um político de 39 anos que se define como “um monge soldado”, terá a missão de buscar uma maioria parlamentar com o objetivo de aprovar um orçamento para 2026 que permita sanear os endividados cofres públicos.
Mas o desafio não é nada fácil. A antecipação eleitoral de 2024, convocada por Macron sem consultar seus aliados, deixou uma Assembleia Nacional sem maiorias e dividida em três blocos: esquerda, centro-direita e extrema direita.
A crise também se traduziu em uma sucessão de quatro primeiros-ministros em um ano e meio.
E essa instabilidade crônica agravou-se na segunda-feira, quando Lecornu renunciou apenas 14 horas depois de revelar seu gabinete, cuja composição provocou desconforto no partido conservador Os Republicanos (LR), seus parceiros de governo.
A formação confirmou neste sábado, em comunicado, que não participará do novo Executivo de Lecornu.
– Comédia burlesca –
O jornal britânico The Guardian destaca a “pressão” exercida sobre o primeiro-ministro “para que forme um governo rapidamente”. E tudo em um prazo recorde, já que o projeto de orçamento para 2026 deve ser apresentado nesta segunda-feira.
Nenhum dirigente europeu reagiu publicamente neste sábado diante deste enésimo episódio da crise. Mas os últimos acontecimentos estão sendo acompanhados de perto.
A impossibilidade de aprovar um orçamento antes do final do ano teria repercussões internacionais, particularmente na ajuda prestada à Ucrânia.
O semanário alemão Der Spiegel ironiza sobre a “má comédia” de Emmanuel Macron, comparando com as comédias burlescas em que “o amante secreto, que tinha sido escoltado até a saída, retorna pela janela do quarto”.
Mas o que mais preocupa esse veículo é a “perigosa espiral descendente” enfrentada pelo país vizinho da Alemanha.
“A crise política francesa preocupa os parceiros da União Europeia e os credores do país há semanas”, insiste o semanário. “O país parece ingovernável, a dívida pública aumenta sem controle e a economia sofre”, ressalta.
A dívida pública da França, segunda economia da zona do euro, alcançou em junho 115,6% do PIB.
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