Uma pesquisa com ratos de laboratório mostrou pela primeira vez que a infecção pelo vírus zika pode danificar células cerebrais adultas, e não apenas de fetos em desenvolvimento, segundo um estudo publicado na quinta-feira na revista Cell Stem Cell.

Células adultas ligadas à aprendizagem e à memória podem ser destruídas pela infecção viral, que também é responsabilizada por um aumento de casos de recém-nascidos com malformações congênitas, como a microcefalia, de acordo com o estudo.

“O zika pode claramente entrar no cérebro dos adultos e pode causar estragos”, disse a coautora Sujan Shresta, professora no Instituto de Alergia e Imunologia La Jolla.

Os pesquisadores sabem que o zika pode ser “catastrófico para o desenvolvimento inicial do cérebro”, acrescentou, e muitas vezes os adultos que estão infectados não apresentam sintomas. Aqueles que se sentem doentes podem relatar erupção cutânea, dor no corpo e olhos vermelhos.

“Seu efeito sobre o cérebro adulto pode ser mais sutil, e agora sabemos o que procurar”, disse Shresta.

Os pesquisadores se concentraram em células progenitoras neurais, que são as primeiras formas de células cerebrais que se tornam neurônios.

Os cientistas as descrevem como as células-tronco do cérebro.

O zika pode atacar estas células progenitoras neurais nos fetos em desenvolvimento, causando microcefalia em bebês, que nascem com cabeças menores que a média, danos cerebrais e deficiências.

Os cérebros adultos retém alguns nichos destas células progenitoras neurais, que repõem neurônios em partes do cérebro ligadas à aprendizagem e à memória.

Usando biomarcadores fluorescentes em ratos, os pesquisadores viram que as células progenitoras neurais adultas que foram modificadas para serem vulneráveis ​​à infecção pelo zika foram mortas pelo vírus.

O estudo concluiu que a infecção pelo zika estava ligada a uma queda de quatro a dez vezes maior na proliferação de células estaminais adultas dos ratos.

Duas partes do cérebro, incluindo o hipocampo, que é associado com a memória, mostraram evidências de morte celular e produção reduzida de novos neurônios, disse o estudo.

Resultados ‘dramáticos’

“Nossos resultados são bastante dramáticos”, disse o coautor Joseph Gleeson, professor adjunto da Universidade Rockefeller.

“Nas partes do cérebro que se iluminaram, era como uma árvore de Natal”, acrescentou.

Ainda não está claro qual é exatamente o efeito que a infecção pelo zika pode ter sobre o cérebro humano adulto ao longo do tempo.

Os pesquisadores sabem, a partir de estudos anteriores, que a integração de novos neurônios em circuitos de aprendizagem e memória é essencial para a capacidade do cérebro de se adaptar e mudar.

Sem este processo, o cérebro entra em declínio cognitivo, e outras condições, como a depressão ou a doença de Alzheimer, podem surgir.

“Ficou muito claro que o vírus não estava afetando todo o cérebro de maneira uniforme, como as pessoas estão vendo nos fetos (humanos)”, disse Gleeson, referindo-se à pesquisa com ratos.

“No adulto, são apenas essas duas populações que são muito específicas para as células-tronco que são afetadas pelo vírus. Estas células são especiais, e de alguma forma muito suscetíveis à infecção”.

Até agora, as autoridades de saúde têm se preocupado principalmente com o perigo que o zika representa para as mulheres grávidas e seus fetos.

O zika também foi associado a uma doença conhecida como síndrome de Guillain-Barré, que pode causar problemas no sistema nervoso, como fraqueza e paralisia.

Shresta disse que o surgimento de Guillain-Barré, que geralmente se desenvolve depois que a infecção pelo zika foi eliminada, pode estar ligado à infecção de células progenitoras neuronais adultas.

Mas os cientistas alertam que mais pesquisas são necessárias, visto que o modelo com ratos pode não refletir a forma como o vírus age em seres humanos.

“Em casos mais sutis, o vírus poderia teoricamente afetar a memória de longo prazo ou o risco de depressão”, disse Gleeson.

“Mas não existem ferramentas para testar os efeitos de longo prazo do zika sobre as populações de células-tronco adultas”, concluiu.