PASTO Currais clandestinos no Mato Grosso: a pecuária desmata e o governo quer permiti-la em reservas indígenas (Crédito:Divulgação)

Ele não desiste. Enquanto houver no País indígenas com seus pedaços de terra, um ex-capitão da reserva vai querer tomar-lhe o chão. Durante a sua campanha presidencial e nos primeiros meses de governo, Bolsonaro pretendia pretendia substituir indígenas por garimpeiros nessas áreas. O desprezo por essa população, no entanto, parece aumentar cada vez mais. Agora, o presidente se prepara para enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei que não se limita à mineração, mas prevê também a exploração de petróleo e gás, a construção de hidrelétricas e, embora pareça inacreditável, o governo fala ainda em projetos de pecuária e até turismo.

Aos indígenas, alvo do governo cujas terras são garantidas pela Constituição, o que restará? Apenas as migalhas. O projeto de lei, que possui oito capítulos e 46 artigos, estabelece que a etnia receberá pela exploração de sua área uma porcentagem pequena dos ganhos: da produção de gás natural e petróleo, de 0,5% a 1%; no caso de energia elétrica produzida, 0,7% de seu valor; e 50% do valor da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais. Se tratando de ouro, por exemplo, o ganho é de 1%. Repete-se, assim, os erros da história. Quando os portugueses chegaram ao Brasil, deram aos indígenas espelhos e facões e em troca ganharam um país inteiro. Em resumo: aos brancos tudo, aos indígenas, nada.

DESTRUIÇÃO Essa imagem revela o quanto o garimpo protege os indígenas, como prega o governo de Jair Bolsonaro (Crédito:Divulgação)

Um projeto que explore economicamente terras indígenas nunca encontrou força para ser aprovado pelo Congresso desde que a Constituição de 1988, chamada de Cidadã ­— e que garante o direito das minorias —, foi promulgada. O artigo 231 da Carta Magna prevê que os povos indígenas têm direito permanente às terras que ocupam, e lhes cabe “o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes”. Pela Lei Maior, a exploração dessas terras só pode ocorrer com aprovação do Congresso e pelos próprios indígenas, e por meio de lei complementar. Diante dessa brecha legal, a Presidência quer transformar essas reservas em verdadeiras áreas exploradas economicamente por não indígenas. Seu argumento, pelo menos ao que se refere à extração mineral, é o fato de já existir garimpo ilegal nas reservas. Nas terras do povo ianomâmi, por exemplo, são 20 mil garimpeiros ilegais. O governo acredita que, sem regulamentação, o País está sendo prejudicado, pois não recebe compensações financeiras e tributos pelas extrações. Além disso, os povos estariam expostos a riscos a sua saúde, tradições e costumes, além de conflitos com os extratores.

Preservação Natural

Para conter esses riscos, no entanto, mais eficiente seria combater o garimpo ilegal nas regiões. É sabido que a presença dos povos indígenas nas terras e a sua posse é fundamental para a preservação ambiental dessas áreas. Os indígenas trazem em sua cultura e DNA técnicas sustentáveis de desenvolvimento e manejo das matas. Legalizar a exploração dessas terras é dar um tiro no próprio pé, pois permitirá a degradação da floresta amazônica. Apesar dessas atividades exploratórias darem retorno financeiro a curto prazo, estudos mostram que, em pé, a Amazônia gera ganhos bastante altos a longo prazo, para toda a humanidade.

XINGU Queimadas atingiram níveis alarmantes: 150 mil hectares de floresta amazônica foram destruídos (Crédito:Divulgação)

Apesar de o governo ter encontrado essa brecha legal, o mais arriscado para os povos indígenas — desde sempre colocados à margem da sociedade, é bom lembrar —, é a forma como eles serão ouvidos a respeito da exploração das terras que são suas por direito adquirido. O projeto que está na Casa Civil da Presidência garante que eles sempre serão consultados sobre a implementação de projetos em suas demarcações. Mas atenção: eles não poderão vetar as atividades. Como o governo Bolsonaro não dialoga com Organizações Não Governamentais, nem com grupos que representam as minorias, pelo contrário, os vê como “inimigos”, é certo que com os povos indígenas não será diferente. Além disso, o pouco caso que ele faz da importância da preservação dos recursos naturais faz acender o sinal vermelho sobre a questão.

Diante desse alarmante quadro, surgem como um alento as forças de oposição ao presidente. À sua frente, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, que falou no final do ano passado que não pautará projetos no Plenário da Casa que tratem da exploração mineral em terra indígena. A ideia de Maia é sinalizar para o exterior que o Brasil se preocupa com a preservação do meio ambiente e com os povos nativos da Amazônia e, assim, preservar a imagem do País diante da comunidade internacional.