Com incidência maior que a do câncer de mama, o câncer do colo do útero impõe um desafio sanitário no Amazonas. Na capital do Estado, o Board Review EVA 2025 reúne especialistas neste sábado para debater prevenção, acesso ao tratamento e equidade em saúde.
O estado do Amazonas vive uma epidemia silenciosa — e, em grande parte, evitável. O câncer do colo do útero, que já supera o câncer de mama em número de casos na região, impõe um cenário de emergência em saúde pública. Segundo estudo publicado no International Journal of Gynecological Cancer, o Amazonas lidera o Brasil em taxa de mortalidade pela doença, com 12 mortes por 100 mil mulheres — o dobro da média nacional —, e apresenta índices semelhantes aos de países africanos com menos acesso a políticas públicas de saúde.
É nesse contexto que acontece neste sábado, 26 de abril, em Manaus, o Board Review EVA 2025, encontro promovido pelo Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA). Com entrada gratuita e participação de oncologistas e especialistas de todo o país, o evento será realizado no Quality Manaus Hotel e visa fortalecer estratégias de prevenção e tratamento dos principais cânceres ginecológicos — com foco especial no câncer cervical, que atinge desproporcionalmente as mulheres da região amazônica.
“Estamos lidando com uma tragédia evitável. O câncer de colo do útero pode ser prevenido com vacina e detectado precocemente com exames simples”, alerta a médica Andrea Gadelha, presidente do EVA. “Vacinar meninas e meninos é um ato de proteção à vida e de justiça social.”
O desafio da prevenção esbarra, porém, em uma infraestrutura precária e na escassez de profissionais de saúde treinados para atuar nas áreas remotas do estado. Atualmente, apenas dois hospitais públicos oferecem tratamento oncológico completo em Manaus. No restante do estado, há apenas quatro centros de radioterapia, dos quais apenas um atende pelo SUS. Cerca de 75% dos diagnósticos chegam em estágio avançado, o que reduz as chances de cura.
“O principal obstáculo é garantir capacitação e suporte para quem está na linha de frente, em comunidades indígenas e cidades pequenas do interior”, afirma o oncologista Jeancarllo Silva, um dos coordenadores do evento. Ele lidera um programa de formação médica a distância, apoiado pela UEA e pela UFAM, que leva conhecimento técnico via videoconferência a agentes de saúde na floresta e em regiões isoladas.
A programação do encontro inclui módulos sobre câncer de endométrio, ovário, colo do útero, menopausa, oncogenética, rastreamento populacional e temas de ponta como cirurgia robótica, biomarcadores e imunoterapia. Um dos focos principais será o debate sobre equidade no acesso ao tratamento oncológico — uma pauta ainda distante da realidade amazônica.
Além de reforçar a urgência de políticas públicas mais robustas para o Norte do Brasil, o Board Review EVA 2025 também ecoa um alerta global: não há justiça climática sem justiça em saúde. Em um ano em que a Amazônia estará sob os holofotes internacionais com a realização da COP30, em Belém, o evento em Manaus assume um papel simbólico e estratégico ao colocar a vida das mulheres amazônicas no centro das discussões.
“É inadmissível continuarmos perdendo vidas para uma doença que pode ser prevenida com duas ações básicas: vacina e exame preventivo”, resume Jeancarllo Silva. “É hora de romper o ciclo da desinformação e desta realidade.”