Apesar da sinalização favorável do governo ao por a construção civil dentro dos setores considerados essenciais, empresários do segmento de infraestrutura ainda demonstram preocupação com o destino dos projetos. Entre os maiores receios estão o crescimento nos custos diante das exigências para conter a propagação do vírus, além da falta de um critério mais claro de como a segurança deve ser feita nos canteiros de obras.

Na quinta-feira, dia 7, o governo publicou no Diário Oficial da União (DOU) decreto que altera texto de março e incluiu no rol de atividades essenciais o setor de construção civil. O texto destaca, entretanto, que as atividades precisam obedecer determinações do Ministério da Saúde – trecho considerado vago por especialistas. A medida veio para trazer mais segurança ao setor, que estava travando uma verdadeira batalha judicial para conseguir avançar com obras em algumas localidades.

A incerteza era tamanha que fez a Camargo Corrêa Infra parar quase toda a obra de construção de uma linha de transmissão para a EDP em Santa Catarina, na região entre os municípios de Biguaçu e Campos Novos. Os trabalhos, segundo fontes, foram retomados apenas agora, depois da edição do decreto feita pelo presidente da República.

Ainda assim, muitas dúvidas não foram devidamente endereçadas. Entre as preocupações da Camargo Correia Infra, por exemplo, está o fato de a empresa ter de mobilizar 2 mil funcionários para avançar com a obra, próxima a cidades de pequeno porte.

Alguns municípios travaram uma verdadeira guerra com empreiteiras em todo o País nas primeiras semanas de quarentena, com decisões judiciais suspendendo as operações. Por determinação da Justiça, ao fim de março, as obras de duplicação da Rodovia dos Tamoios (SP-0099) chegaram a ser interrompidas. A decisão caiu e os trabalhos foram retomados alguns dias depois.

Procurada, a EDP disse que não iria se manifestar. Já a Camargo Corrêa Infra destacou que sua principal prioridade é preservar a saúde e o bem-estar de seus profissionais e da sociedade. “Diante do cenário de disseminação do coronavírus no país, a empresa segue as recomendações das autoridades de saúde para assegurar condições aprovadas para execução de trabalhos”.

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Segundo o sócio da Toledo Marchetti Advogados e presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Construção (IBDiC), Leonardo Toledo da Silva, a pandemia tem se mostrado uma barreira aos projetos, mesmo com a liberação do setor. “O empresário não sabe se tem de executar a obra agora porque a produtividade vai cair pela metade. Porque no transporte do pessoal, ele vai ter de levar em consideração o distanciamento, usar máscaras, coisas que antes não era preciso”.

Ele destacou ainda que, diante da falta de critérios mais claros sobre o que as empresas precisam fazer, crescem as incertezas sobre eventuais responsabilidades das companhias diante de trabalhadores infectados.

Já Luis Felipe Valerim, sócio do XVV Advogados, disse que faltam definições, mas o cenário é bem melhor hoje. “Saímos de uma insegurança para um detalhamento técnico. Está tranquilo que eu posso continuar a obra, mas preciso saber como. Se eu tinha mil trabalhadores em um canteiro, vou poder ter apenas 600? São detalhes, mas que precisam ser respondidos”. Ele lembrou que, assim como nos contratos de concessão, as obras públicas quase sempre utilizam mecanismos de reequilíbrio em que o imprevisto e os riscos são alocados ao poder público.

Procurado, o Ministério da Saúde afirmou, em nota, que as orientações técnicas sobre isolamento foram publicadas a partir do Boletim Epidemiológico número 5 e não houve alterações das recomendações. “Não haverá respostas únicas para um país continental. Cada localidade possui suas características e condições, o que implicará em medidas diferenciadas, que podem ser trabalhadas de forma conjunta com a pasta”.

Segundo Venilton Tadini, presidente-executivo da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib), há uma preocupação grande com os protocolos de segurança no setor. “Não será trivial, sempre têm muitos detalhes, é complexo, desde o fato de ter de comprar máscaras para uma força de trabalho de 2 milhões a 3 milhões de empregados, que atuam na construção”.

Na avaliação de Tadini, o maior problema é a falta de investimento. E, até o momento, o impacto é moderado. “Tem uma perspectiva de impacto mais forte no segundo semestre. Boa parte dos contratos são curtos e precisam de renovação, e há perspectiva muito baixa de assinatura de novos contratos entre março até junho de 2020”, disse.


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