13/10/2021 - 12:25
Entre as várias coisas que Jair Bolsonaro prometeu na campanha eleitoral e não cumpriu, está o fato de que não aumentaria os impostos. Não surpreenderá se, nos próximos meses, o presidente dar outra canetada para elevar a arrecadação da União e bancar seus projetos eleitoreiros para o ano que vem. A última vez foi exatamente assim: ele decretou a alta do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) horas antes de embarcar para Nova York (EUA), para a Assembleia Geral da ONU – onde, aliás, sabia que seu discurso funcionaria como uma cortina de fumaça em torno da decisão.
O ponto, no entanto, é que é a reação do mercado que opera como principal ônus do aumento de impostos e que criticou profundamente a medida. Foi assim, então, que a elevação do IOF foi interpretada pelo mercado, hegemonicamente, como um apontamento inequívoco de que Bolsonaro e Guedes sequer têm uma agenda econômica definida, e que eles não encontram nenhum problema em fazer com que o Estado dê um calote nas suas dívidas para abrir espaço para o projeto de 2022, como acontece com os precatórios.
Na verdade, o próprio mercado admitiu que os poucos mais de R$ 2 bilhões que serão arrecadados com o aumento do IOF é pouco dinheiro. E, embora haja os que digam que a gritaria foi mais forte do que o necessário, o fato é que isso pegou muito mal, mostrando que o governo usa seu poder para impor restrições ao livre mercado. Era contra isso que Guedes dizia que trabalharia no ministério, com a adoção das suas cartilhas liberais da Universidade de Chicago.
Essa narrativa, porém, triunfou sobre a real perversidade do decreto de Bolsonaro. Ao elevar o IOF de uma hora para outra, sem nenhum indicativo do seu planejamento econômico, e por meio de uma manobra institucional (sequer deu tempo de o Congresso aprová-lo), o presidente jogou sobre os mais pobres a responsabilidade de pagar a conta. Isso porque, em um País com 25,6% das famílias inadimplentes, sendo que oito em cada dez (83%) delas estão com a fatura do cartão de crédito atrasada, a alta desse imposto vai fazer com que o rotativo fique 20,5% maior nos dois próximos meses, segundo dados da consultoria ROIT. Em outras palavras, quem já está enforcado no cartão ainda terá um sobrepeso significativo na conta daqui até o fim do ano — e não por sua própria culpa.
Vale dizer que, como diversas pesquisas já mostraram, o cartão de crédito é a modalidade de empréstimo mais comum para as classes mais baixas. Quando o dinheiro acaba antes do fim do mês, ou quando o orçamento cai, é para ele que as famílias recorrem para manter o consumo. Assim, a linha do endividamento e da inadimplência não revela, neste momento, um cenário de aquecimento da economia, mas justamente da sua deterioração.
O mesmo raciocínio vale para o aumento de 23,9% sobre o imposto do cheque especial de pessoas físicas, que vem na esteira do IOF, e que também vai penalizar aquelas famílias que, durante a pandemia, têm vivido na ponta do lápis.
Se é “pouco dinheiro” para o mercado, é porque esses R$ 2 bilhões a mais que o Estado vai arrecadar com o decreto de Bolsonaro, vai sair principalmente de outro lugar: do bolso do consumidor.