Aos 20 anos, o rapaz não havia terminado o ensino médio. Tinha pouca paciência com os professores, não fazia as provas, abandonou a escola. Mas era brilhante em matemática. O pai o levou ao Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), na zona sul do Rio. Os pesquisadores o acolheram, com a condição de que se tornasse disciplinado. Leonardo Macarini concluiu o doutorado sem ter pisado numa faculdade, aos 23 anos. Foi preciso autorização especial do Conselho Nacional de Educação para que o diploma fosse validado. Hoje, ele é professor do Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Histórias como essas são possíveis por causa do perfil do Impa, instituição de pesquisa de ponta, uma das mais respeitadas do mundo. “Fazemos qualquer coisa para nos ajustar ao mérito”, resume o diretor-geral, Marcelo Viana. Quarenta e sete pesquisadores e 195 alunos atuam num prédio de 12 mil metros quadrados, em meio a um trecho de Mata Atlântica, no Horto. Dali saíram pesquisas que mereceram reconhecimento internacional, como a medalha Fields, considerado o Nobel da Matemática, recebida por Artur Avila, em 2014. Nesta quarta-feira, Viana se tornará o primeiro matemático do mundo a receber o Grande Prêmio Científico Louis D., principal comenda da França em Ciências.

Fundado em 1952 como instituto federal, com dois pesquisadores e um diretor, desde 2001 o Impa se transformou em Organização Social. “É mais cômodo ser funcionário público, por outro lado há mais amarras. Então fizemos a opção consciente, difícil, de que encararíamos o risco de ser uma OS”, afirma Viana. Recentemente, enfrentou o sufoco da incerteza sobre a renovação do convênio com o governo federal, depois da extinção do Ministério da Ciência e Tecnologia (fundido com o das Comunicações). Se o contrato não fosse assinado, o Impa fecharia. “Em seis meses de mandato, tratei com quatro ministros da Ciência e Tecnologia diferentes. Todos bem intencionados, mas você começa o diálogo com um ministro diferente e é difícil avançar.”

O matemático Jacob Palis era o diretor do Impa nessa transição para OS. “O ministro (Ronaldo) Sardenberg corria de mim nos corredores do MCT. Eu sentia uma frustração muito grande por não poder contratar professores, tinha de esperar o Ministério do Planejamento abrir uma vaga. E depois do concurso não tinha previsão de quando haveria a posse. Era um grilhão”, afirma Palis, de 76 anos, que está no instituto desde 1968. “Só dois pesquisadores não aprovaram. Fui acusado de privatizar o Impa.”

A mudança facilitou a adoção de um dos lemas do instituto. Ali, não se olha passaporte – nem de professor nem de alunos. Pelos longos corredores do Impa circulam russos, alemães, franceses, iranianos, peruanos, argentinos. No último concurso internacional para professores, os brasileiros eram minoria entre os cem candidatos. Havia três vagas, mas só dois foram contratados. “O crescimento sempre foi ponderado e rigoroso. Em 60 anos, o Impa cometeu poucos erros.”

O acesso dos alunos é feito por meio de dossiês, em que os candidatos apresentam cartas de recomendação, histórico escolar e respondem a perguntas como quais os livros já leram. As cartas de recomendação precisam informar ainda como os estudantes lidam com a competição e como é a estabilidade emocional dos jovens, que vão enfrentar grande pressão. Em 2012, uma tragédia abalou o instituto: o estudante de mestrado José Leandro Pinheiro, de 21 anos, foi morto a facadas por um colega numa república estudantil. Hoje, o Impa arca com metade dos custos do tratamento psicológico para os alunos que requisitarem esse tipo de atendimento.

Olimpíada

A face mais popular do Impa é a de organizador da Olimpíada Brasileira de Matemática da Escola Pública (Obmep), que teve 18 milhões de candidatos em 2015. Do orçamento anual de R$ 89 milhões, R$ 53 milhões são destinados à competição. As provas da primeira etapa da 12ª edição ocorrem amanhã. “A gente descobre talentos, mas a missão é melhorar o ensino da matemática no País”, afirma o diretor adjunto, Claudio Landim. A instituição produz material didático, disponível na internet no Portal da Matemática, e que vem sendo adotado por escolas particulares.

“A olimpíada dá uma visibilidade que o Impa não tinha. Mas a instituição, do ponto de vista científico, tem reconhecimento internacional em razão da qualidade da pesquisa”, diz Landin. Poucos sabem, mas dos laboratórios do Impa saem aplicativos de tablet e smartphones, como o Blues Machine, instrumento musical que pode ser “tocado” pela tela do tablet, por exemplo; ou o Lua, linguagem usada para programar jogos; ou ainda o Botanic, aplicativo que permite fazer uma passeio pelo Jardim Botânico, mediado por Tom Jobim e o fotógrafo Zeka Araujo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.