A igreja ortodoxa ucraniana, até agora afiliada a Moscou, anunciou nesta sexta-feira (27) a ruptura de seus laços com a Rússia devido à invasão da Ucrânia, declarando “plena independência” em uma decisão histórica contra as autoridades religiosas russas.

“Não estamos de acordo com a posição do patriarca Kirill de Moscou… sobre a guerra”, disse a igreja ucraniana em um comunicado, após um conselho dedicado à “agressão” da Rússia contra a Ucrânia, onde se declarou a “plena independência e autonomia da Igreja Ortodoxa Ucraniana”.

O patriarca russo Kirill manifestou claro apoio à ofensiva de Moscou na Ucrânia.

“O Conselho condena a guerra como uma violação do mandamento de Deus ‘Não matarás’ e expressa suas condolências a todos os que sofreram na guerra”, disse a igreja ucraniana.

Suas relações com os líderes de Moscou foram “complicadas ou inexistentes” desde que a lei marcial foi declarada na Ucrânia, acrescenta a nota.

O conselho também pediu aos dois países que “sigam com o processo de negociação” e busquem uma maneira de “parar o derramamento de sangue”.

A igreja ortodoxa russa, por sua vez, disse que “não havia recebido uma declaração oficial da Igreja Ortodoxa Ucraniana” e que não poderia fazer comentários, segundo escreveu o porta-voz Vladimir Legoida no Telegram.

Legoida garantiu que a igreja ortodoxa ucraniana se encontrava em “uma posição muito difícil e sob muitas pressões: das autoridades, dos conspiradores, das pessoas de mentalidade nacionalista… e dos meios de comunicação”, acusando “forças externas de tentar destruir a unidade da Igreja Ortodoxa Russa”.

A Ucrânia esteva sob a liderança espiritual de Moscou há centenas de anos, desde pelo menos o século XVII.

O anúncio marca o segundo cisma ortodoxo na Ucrânia nos últimos anos, já que parte da igreja ortodoxa ucraniana se separou de Moscou em 2019 pela anexação russa da Crimeia e o apoio proporcionado aos separatistas pró-Rússia no leste do país.

A invasão de Putin e o apoio de Kirill a ela colocaram a igreja afiliada a Moscou na Ucrânia em uma posição cada vez mais delicada. Centenas de seus sacerdotes assinaram, nas últimas semanas, uma carta pedindo que Kirill seja levado a um tribunal religioso por causa da guerra.

O metropolitano Onufriy, líder da igreja ortodoxa na Ucrânia, não se pronunciou pessoalmente contra seu chefe em Moscou. Mas, desde a invasão, expressou claro apoio ao exército ucraniano, dando regularmente sermões sobre seus soldados mortos.

No início do conflito, também propôs a realização de uma procissão de Páscoa para a cidade portuária de Mariupol, no sul, para resgatar os soldados ucranianos entrincheirados na siderúrgica de Azovstal.

As paróquias da igreja ucraniana subordinada a Moscou também serviram de abrigo contra os bombardeios russos.

Ainda não está claro se seus clérigos se unirão aos que se separaram em 2019, que agora juram lealdade ao patriarca Bartolomeu de Constantinopla (Istambul), na Turquia.

A Ucrânia é fundamental para a igreja ortodoxa russa, pois alguns de seus mosteiros mais importantes estão localizados no país vizinho.