A dramaturga espanhola Angélica Liddell transforma em arte os mais tenebrosos resquícios da violência em família. Foi assim em Eu Não Sou Bonita, espetáculo apresentado na primeira edição da Mostra Internacional de Teatro de São Paulo, em 2014, trabalho em que ela parte de uma experiência de abuso sexual na infância para mergulhar nas fissuras do modelo patriarcal ainda vigente.

E também em Hysterica Passio, denso espetáculo que reestreia neste sábado, 28, na SP Escola de Teatro, com sessões gratuitas, cumprindo com o projeto de difusão do teatro promovido pelo Prêmio Zé Renato, conquistado pelo Teatro Kaus Cia. Experimental, responsável pela montagem. Trata-se de uma peça que busca atingir o âmago das dores que atormentam a alma.

A peça acompanha a relação de Hipólito (Alessandro Hernandez) com a mãe, a esquálida enfermeira Thora (Amália Pereira), e o pai, o pálido dentista Senderovich (também vivido por Hernandez). Não se trata, porém, de um plácido relacionamento – atuando como uma espécie de mestre de cerimônias, que inclui a representação do pai morto e também dele mesmo quando criança, Hipólito quer confrontar a mãe com a dor que ainda sente provocada pelos abusos que sofreu ao longo da infância pelos pais.

Assim, ainda que reine um ambiente lúdico, o clima é pesado, com Hipólito detalhando sem pudor todas as vicissitudes a que foi obrigado a viver, especialmente as espinhosas situações de violência física e sexual.

“Angélica Liddell é uma contundente dramaturga, que aprofunda as questões acerca do ser humano e suas dores mais íntimas”, comenta o diretor do espetáculo, Reginaldo Nascimento. “É uma autora que faz sangrar as palavras e me possibilita uma investigação poética, estética e cênica, onde o foco é o ser humano e sua aventura de viver.” Esse é o segundo texto da dramaturga espanhola encenada pelo Teatro Kaus – o primeiro foi O Casal Palavrakis, em 2012, e ambos fazem parte da obra Tríptico da Aflição.

O tom opressivo do texto, narrado de forma hipnotizante por Hernandez e Amália, contrasta com o cenário criado por Nascimento e o figurino de Telumi Helen em tom branco. Assim, junto com a iluminação, o conjunto acentua a assepsia da montagem e reforça o estado sombrio dos dois personagens.

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“A encenação abusa da teatralidade e explicita a angústia destes seres numa interpretação que transita com a alegoria, e brinca com os expedientes do circo de feras e de horrores para tentar dar cor a uma vida de dor”, finaliza Nascimento.

HYSTERICA PASSIO

SP Escola de Teatro. Praça

Roosevelt, 210, República, tel. 3775-8600. Sáb, 21h30; dom. e 2ª, 20h. Grátis. Até 4/7.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.


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