Quando o fotógrafo do jornal O Estado de S. Paulo saca sua câmera no hall do Teatro Procópio Ferreira, o ator e humorista Eduardo Sterblitch abre o sorriso pela primeira vez. “Vou imitar a cara de felicidade do Procópio”, diz em frente à foto do pai de Bibi Ferreira.

A entrevista já tinha chegado ao fim e o carioca de 32 anos falou sobre os últimos projetos, a dificuldade de trabalhar no País, abriu o jogo sobre depressão e ainda comentou a repercussão das últimas decisões do governo federal no campo da cultura.

Desde março, ele está em cartaz com a peça Sterblitch Não Tem Um Talk-Show, entre idas e vindas no eixo Rio-SP. A capital paulista estava no fim da lista de uma temporada iniciada em 2016, quando estreou no Recife. “É uma forma estratégica de produzir”, diz. “Por aqui, os teatro são sempre caros, é difícil fazer parcerias. Fora do Sudeste, conseguimos aproximar o espetáculo da cidade e do público, e o trabalho acaba ganhando um corpo brasileiro.”

Essa aproximação também acontece no formato do espetáculo. A plateia vai acompanhar a gravação – de mentirinha – de um programa de entrevistas, com direito a palco, convidados especiais, intervalos comerciais e câmeras. “É o destino de todo humorista, ganhar um talk-show, o que não foi o meu caso. É uma sátira ao mercado”, diz. “Agora quem faz stand-up virou youtuber.”

Nos últimos anos, o humorista esteve na penúltima temporada do Tá no Ar e não entrou na despedida do programa porque, diz ele, foi cotado para o elenco da série Shippados, uma comédia romântica em que contracena com Tatá Werneck, ainda sem data de lançamento na Globoplay. “Por mim, teria feito os dois”, recorda.

Se na televisão os projetos aguardam tempo para amadurecer, ele não perde tempo e engata novidades nos palcos. Em maio, Sterblitch estreia TIO, ao lado de Renata Gaspar, ex-colega de Tá no Ar. “Foi uma forma de a gente continuar próximo, depois que eu saí do programa.” Na montagem com direção de Débora Lamm, a dupla é representante de uma civilização extraterrestre que vem à Terra conhecer a vida e seus moradores. “Somos sujeitos evoluídos e chegamos a este planeta para conhecer quem vive aqui e entender o que está acontecendo”, conta.

O texto da peça é de Veronica Debom, também egressa de Tá no Ar, e Célio Porto, de Isso A Globo Não Mostra, quadro de humor do Fantástico, idealizado por Daniela Ocampo e Marcius Melhem. Com pouco mais de quatro minutos, o quadro que vai ao ar nos domingo recupera as principais notícias da semana – de política aos bastidores da TV Globo, com ironia e o ritmo característicos da navegação online, em que os memes dominam a rede. “Estão faltando paródias de qualidade como essa”, avalia Sterblitch. “Às vezes, fica-se repetindo e repetindo a mesma piada, como se fosse a única maneira de fazer rir.”

Nos tempos em que a ideia de politicamente correto continua no centro de um debate marcado por processos, o ex-Pânico na TV apela para uma posição ponderada sobre a famigerada liberdade de expressão: “Toda profissão tem ética, e o humorista também. De fato, não somos professores, mas talvez um mágico, criador de ilusões”.

Para eles, esse é apenas um dos desafios de todo artista brasileiro. Na última semana, Sterblitch e o Brasil acompanharam as alterações na antiga Lei Rouanet, que teve teto de repasses para produções culturais reduzido de R$ 60 milhões para R$ 1 milhão – quantias que ele nunca recebeu, antecipa. “Essa mudança nunca vai chegar ao artista que mais precisa”, aponta. “Qual o futuro de um jovem que nasceu em Manaus e sonha ser roteirista de cinema?”, questiona. “Precisamos entender que o artista não deveria precisar do governo e sim do público. O que eles estão fazendo é colocar artista e público como inimigos. E nós não somos amigos do rei. Nunca fomos.”

É com essa mesma seriedade que Sterblitch muda de assunto e começa a falar sobre saúde e depressão – sem sacrificar a piada. “Era mais legal quando nem todo mundo tinha. Agora não quero mais!” Ele explica que está mais próximo de quadros de ansiedade, quando a preocupação com o passado e o futuro tenta soterrar o prazer do presente. “Já entendi que preciso focar no agora e meu trabalho ajuda nisso. A tristeza nos deixa em alerta enquanto a felicidade distrai.”

A expressão melancólica que constitui seus personagens, desde Pânico na TV, não dá as caras durante a entrevista. “Cheguei a imaginar que não tinha talento ou que meu trabalho poderia não evoluir. Acho que meu eu adulto agora compreende isso.”

Para alguém que experimentou o teatro já aos 3 anos – num curso, matriculado pela mãe – ele intui que a arte é como uma magia que precisa ser invocada, às vezes, pelos cliques da máquina de um fotógrafo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.