Não está havendo trégua – e nem deveria existir – na investigação, julgamento e busca de punição dos envolvidos nos atos golpistas do 8 de janeiro. Passados dois meses dos episódios, ao menos 900 dos identificados seguem presos e vêm mais por aí. Muito mais. Conforme reportagem exclusiva de ISTOÉ na sua edição de número 2768, há duas semanas, os militares estarão entre os próximos alvos. O ministro Alexandre de Moraes decidiu na última segundafeira, 27, que o STF será o responsável por tal julgamento; que a Corte possui a competência necessária para a tarefa de deliberar sobre o envolvimento e culpa das Forças Armadas, especialmente daqueles oficiais lotados no GSI (comandado pelo general Augusto Heleno), que de alguma forma possam ter colaborado para o ocorrido. Moraes também autorizou a instauração imediata dos procedimentos investigatórios no caso, tirando da tutela da Justiça Militar a atribuição. É uma virada e tanto nos procedimentos nessas situações. Na prática, Moraes concentrou na esfera do Supremo os inquéritos sobre os crimes ali verificados. Autoria, materialidade e eventuais colaborações da caserna serão tratadas sem distinções às dos envolvidos civis. Isonomia, não importando a patente ou mesmo o nível de autoridade de alguns dos suspeitos, parece ser a tônica. Note o caso do ex-ministro da Justiça Anderson Torres que segue atrás das grades até hoje. A minuta golpista encontrada em sua casa (ficou-se sabendo há alguns dias) estava em uma pasta do governo federal, deixando evidente – e rebatendo o argumento da defesa de que seria um papel sem valor a ser descartado – que se tratava de um documento relevante, “muito bem guardado”, segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR). Torres parece mesmo envolvido nos acontecimentos até o último fio de cabelo. Articulou e planejou inúmeros dos passos. Na condição de secretário de Segurança do Distrito Federal durante o fato, resolveu tirar férias estratégicas e desmobilizou as forças- tarefas policiais para não haver resistência efetiva à baderna. O processo que corre contra ele e o governador afastado, Ibaneis Rocha, por suposta omissão foi prorrogado por mais 60 dias e o MPF entende que Torres oferece, sim, claros riscos à colheita de provas e deve seguir encarcerado. Em meio às movimentações no plano legal, deve coroar e colocar ainda mais holofotes sobre o episódio a instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos atos golpistas, que já reuniu as assinaturas necessárias e promete galvanizar as atenções do Congresso – e, por tabela, do País – com a revelação dos detalhes que levaram àquele desfecho. O ministro Gilmar Mendes já abriu prazo para que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, se manifeste a respeito. Ele quer que no período de até dez dias (a terminar nesta semana), o parlamentar se manifeste acerca dos elementos disponibilizados para a abertura da CPI. Os magistrados da Suprema Corte, que foram diretamente atingidos, inclusive com a destruição quase total de suas instalações, demonstram que não irão mesmo descansar enquanto tudo não estiver esclarecido e os culpados devidamente penalizados. O decano Mendes é o relator de um mandado de segurança apresentado pela senadora Soraya Thronicke, ex-candidata à presidência, apontando uma “postergação injustificada” na análise do pedido de instalação da comissão. Definitivamente, não será por meio de gambiarras políticas e acordos mal velados que o tema irá parar nas gavetas e permanecerá esquecido. O atual governo Lula não parece interessado no prosseguimento da CPI, mesmo sendo ele o principal atingido e ameaçado pelos atentados. O temor no caso é que sobrem faíscas para cima do ministro Flávio Dino, atual titular da Justiça, que teria sido alertado das ameaças e não tomou as providências cabíveis. De uma forma ou de outra, pela natureza dos interesses partidários, boa parte dos políticos teme qualquer sinal de CPI porque, como dizem, a maioria sabe como elas se iniciam, mas não como acabam. Não há controle em relação aos desdobramentos de discussões assim nas comissões e a tropa de Lula, que tenta dar andamento a projetos candentes para a retomada, receia que uma CPI nesse momento possa prejudicar o início dos seus trabalhos. O Brasil, é fato, quer respostas e travas para que nunca mais algo sequer semelhante volte a acontecer. Foram deploráveis os ataques à democracia naquele infame 8 de janeiro e o juízo final sobre os acusados, inevitavelmente, está prestes a ocorrer.