A cerimônia de abertura dos Jogos Parapan-Americanos de Lima, no Peru, acontecerá nesta sexta-feira, às 21 horas (de Brasília), no estádio Nacional. O Brasil será representado com delegação recorde, de 337 atletas, cada um com uma trajetória particular de superação.

O Estado selecionou 10 histórias para mostrar como o acaso da vida pode interferir de maneira brutal no rumo de cada pessoa. Uma semente de mamona atingida no olho, a piscina com muito cloro, a mordida de um gato, a brincadeira com a arma do pai, a enfermeira descuidada, um dia comum em que num piscar de olhos tudo se transforma.

Há também o outro lado, de a vida ser mais forte em meio a uma tragédia quase fatal, como sobreviver após levar choque de 13.900 volts, aguentar duas placas de mármore de mais de 700kg cair sobre a cabeça, capotar com o exército durante uma guerra na Guiana Francesa e uma criança sobreviver após perder o braço na máquina de moer capim.

Antônio Tenório, de 49 anos (judô – até 100kg) – Aos 13 anos, ele brincava com os amigos de estilingue, quando foi atingido por uma semente de mamona no olho esquerdo e perdeu a visão. Seis anos depois teve descolamento de retina no olho direito e ficou totalmente cego. “Pratico judô desde os sete anos de idade por indicação do meu pai. Quando tive o segundo problema, o descolamento, fiquei um ano e meio parado. Voltei depois que o médico confirmou que não tinha mais solução”, disse. Tenório é uma das referências na delegação brasileira no Parapan de Lima. São seis medalhas paralímpicas – quatro ouros (Atlanta-1996, Sydney 2000, Atenas-2004 e Pequim-2008), uma prata (Rio 2016) e um bronze (Londres 2012). E três em Parapans – ouro (Rio-2007), prata em Guadalajara-2011 e bronze (Toronto-2015).

Daniel Mendes do Nascimento, de 40 anos (atletismo classe T11 – cegos) – Em 2002, ele trabalhava em uma marmoraria quando duas placas de mais de 700kg se desprenderam e caíram em sua cabeça. Ele teve afundamento do crânio e ficou cego. Passou a competir em 2005. De lá para cá, conquistou três medalhas paralímpicas – ouro no revezamento 4×100 metros e bronze nos 200 metros (Rio-2016) e prata nos 200 metros (Londres-2012). No Parapan foi bronze nos 200 metros (Toronto-2015) e ouro nos 400 metros (Guadalajara-2011).

Gabriela Ferreira, de 21 anos (atletismo T12 – deficiência visual total) – A mãe de Gabriela foi mordida na barriga por um gato com toxoplasmose quando estava grávida. A mordida afetou a visão e a audição da atleta, que teve coriorretinite (inflamação da retina) bilateral e otite crônica. Em 2009, ela descobriu o esporte paralímpico por meio de um projeto escolar e hoje é uma das promessas do Parapan, após experiência vitoriosa no Mundial de Jovens.

Yagonny de Sousa, de 27 anos (atletismo classe T46 – amputados membros superiores) – Yagonny sofreu um acidente com fio de alta tensão durante a instalação de um letreiro e levou uma descarga elétrica de 13.900 volts, que acarretou na amputação dos dois braços abaixo dos cotovelos. “Foi no dia 15 de abril de 2010. Fui para mais um dia de trabalho. Instalava toldo e letreiro. Enquanto suspendia a armação de ferro, ela se aproximou da rede de alta tensão. Recebi uma descarga de 13.900 volts. Ficamos dez dias no hospital tentando salvar as mãos. Foi quando fui informado que teria de amputar primeiro a mão direita porque havia muita necrose. A queimadura por choque queima de dentro para fora. A mão direita também necrosou, estava preta, atrofiada e só conseguia fazer o movimento de pinça. Então optei por amputar ela também”, disse ao Estado. Descobriu o esporte como meio de tratamento. Tem como principal conquista ouro nos 800m no Mundial Júnior 2013 em Porto Rico e é dono do recorde brasileiro nos 800 metros.

Marcia Oliveira, de 23 anos (atletismo F11 – deficiência visual) – Marcia, aos 13 anos, durante as férias, ficou com os olhos irritados depois de passar um dia brincando na piscina. Foi ao médico e descobriu que estava com conjuntivite e que a secreção da doença acumulou em seus olhos. Fez três cirurgias e sua visão foi piorando até ficar cega. Ela começou no esporte paralímpico em 2012 por meio de um convênio pedagógico de sua cidade.

Petrúcio dos Santos, de 23 anos (atletismo T47 – amputados membros superiores) – Ele sofreu acidente com uma máquina de moer capim quando tinha dois anos e perdeu parte do braço esquerdo, abaixo do cotovelo. O paraibano gostava de jogar futsal e sempre foi muito rápido. Foi convidado por um treinador para competir também no atletismo. Rapidamente, se tornou um dos principais atletas paralímpicos do Brasil. Foi ouro nos 100 metros e 200 metros no Mundial de Atletismo 2017 de Londres; ouro nos 100 metros, prata nos 400 metros e prata no revezamento 4×100 metros nos Jogos Paralímpicos Rio-2016; e ouro nos 100 metros e nos 200 metros nos Jogos Parapan-Americanos de Toronto 2015. Também é o atual recordista mundial nos 100 metros e nos 200 metros.

Vileide Brito de Almeida, de 27 anos (basquete em cadeira de rodas) – Ela foi picada por uma cobra aos 11 anos de idade. Como sequela do ferimento e do veneno do animal, a perna ficou atrofiada. Descobriu o basquete em cadeira de rodas com 15 anos por meio de um amigo que já praticava o esporte. No Parapan de Toronto-2015 e no de Guadalajara-2011 terminou com a medalha de bronze.

Ricardo da Costa, de 53 anos (tiro esportivo classe SH1 – amputados membros superiores) – Sofreu acidente em 1989 durante missão de reconhecimento pelo exército, na Amazônia, na fronteira com a Guiana Francesa. “O caminhão que estava tombou, abriu a porta e me expeliu. Ia perder metade do corpo porque o caminhão vinha capotando na minha direção. Tentei me livrar, mas pegou meu braço. Amputou na hora, mas não percebi. Pela dormência, achei que tivesse quebrado. Até que olhei e vi que tinha perdido na altura do cotovelo. Voltei para o acampamento no meio da floresta amazônica e de lá fui para o hospital”, contou. A recuperação foi rápida, segundo ele. Com a perda do braço, se aposentou do exército e em 2006 passou a praticar tiro esportivo pelo Fluminense. Está na seleção brasileira desde 2009.

Paulo Cesar dos Santos, de 48 anos (basquete em cadeira de rodas) – Ele foi baleado por um primo aos 10 anos quando pegaram uma arma para brincar. Paulo sofreu uma lesão medular e perdeu os movimentos das pernas. Começou no basquete em 1989 e foi convocado pela primeira vez em 1992. Ajudou o Brasil na conquista do bronze no Parapan do Rio.

Eduardo de Oliveira, de 40 anos (parabadminton) – A enfermeira carregava dois recém-nascidos quando o tentou pegar no colo. Eduardo escorregou. Para impedir que caísse, ela o segurou pelo braço direito, o que provocou a perda parcial dos movimentos desse membro. Em 2008, conheceu o parabadminton por um amigo. Foi convocado pela primeira vez para a seleção em 2013.