A guerra na Ucrânia começou oficialmente na madrugada da quinta-feira 24, mas a decisão do líder russo Vladimir Putin de invadir o país foi tomada muito tempo atrás. No discurso em que confirmou o envio de “tropas de paz” para Donestk e Luhansk, na região do Donbass, viu-se claramente seu desprezo pela própria existência de uma Ucrânia independente da Rússia, o que revela que a guerra sempre esteve presente em sua estratégia de expansão geopolítica. Na minha opinião, no entanto, a sentença foi dada em meados de 2013 e 2014, quando eclodiu na capital ucraniana, Kiev, um forte movimento pela democracia liderado por estudantes pró-Europa.

Mais de 200 mil pessoas foram às ruas depois que o então presidente Viktor Yanukovych recusou-se a assinar um acordo de cooperação com a União Europeia – o que seria um passo para seu país entrar na OTAN, a Organização do Atlântico Norte, aliança militar liderada pelos EUA. O protesto logo ficou conhecido como “EuroMaidan”, junção das palavras “Europa” e “Maidan”, que significa “Independência” em ucraniano, nome da praça no centro de Kiev onde os manifestantes se reuniam.

É bom ressaltar que a escolha política de se aproximar da Europa e se afastar da Rússia não era unanimidade, longe disso: as pesquisas da época revelam que o país estava dividido – metade da Ucrânia desejava, sim, permanecer sob influência russa.
Depois de 93 dias em que o governo tentou reprimir a revolução com violência – matando pelo menos cem pessoas e ferindo milhares –, a pressão popular depôs o presidente Yanukovych. Uma junta pluripartidária tomou o poder, até que a nova eleição levou à Presidência o pró-ocidente Petro Poroshenko. Humilhado em seu próprio quintal, Putin iniciou seu plano ao anexar quase imediatamente a região da Criméia, sob o pretexto de que “ela era parte da Rússia”. Apenas para lembrar: ele já havia feito isso com a Geórgia em 2008, quando a ex-república soviética havia ameaçado se aproximar da Europa.

A anexação da Criméia provocou grande reação internacional, mas Putin, garantido pelos bilhões de rublos de suas reservas de petróleo e gás, avaliou que seria possível aguentar a pressão. Desde então ele vinha exigindo que a OTAN assinasse um documento garantindo que a Ucrânia nunca entraria para a aliança ocidental, mas os EUA e Europa sempre se recusaram a pressionar o país alegando que entrar ou não na OTAN “era uma decisão soberana” da Ucrânia. A resposta de Putin veio na madrugada de quinta-feira – e as consequências de sua agressão unilateral serão sentidas por muitas e muitas décadas.