O Brasil tornou-se palco para a maior disputa geopolítica mundial do momento, com dois gigantes poderosos, Estados Unidos e China, se digladiando pela liderança do projeto do 5G. A última jogada foi feita pelos americanos. Faltando apenas duas semanas para a eleição presidencial, Donald Trump enviou na última terça-feira uma delegação a Brasília para convencer Bolsonaro a desprezar os chineses. Mas, no final, o que era para ser a assinatura de um acordo comercial entre os dois países, acabou se tornando mais uma ofensiva norte-americana contra os chineses. Na tentativa de bloquear a presença da Huawei no leilão do 5G, esperado para 2021, os membros da comitiva tentaram convencer os líderes brasileiros de que há alternativas aos fornecedores chineses. E foram além.

VISITA Uma comitiva liderada pelo conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Robert O´Brien, foi a Brasília para assinar acordo comercial (Crédito:Divulgação)

A comitiva liderada pelo conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, Robert O´Brien, disse que os americanos estão dispostos a financiar as operadoras locais para compra de equipamentos da nova geração da telefonia móvel, oferecendo recursos que podem chegar a US$ 1 bilhão, que viriam por meio do Banco de Exportação-Importação (Exim Bank).

A guerra de titãs, no entanto, pode atrasar ainda mais a implantação do 5G no Brasil, que já vem se arrastando desde 2019. Se forem proibidas de contratar a Huawei e precisarem buscar novos fornecedores, as operadoras terão de gastar mais de R$ 10 bilhões para substituir equipamentos que já estão instalados atualmente e são compatíveis com o 5G, sendo necessária apenas atualização de software, segundo fontes do mercado. Antes, a estimativa de investimento das operadoras era de R$ 8 bilhões. Além disso, cria uma saia justa fenomenal para o Brasil.

Se discriminar a Huawei sem justificativa, pode afetar outros negócios com seu maior parceiro comercial. Só para se ter uma ideia do tamanho da encrenca, de janeiro a setembro deste ano, 68% do superávit da balança brasileira se deve aos negócios com a China, como mostra o boletim Indicador de Comércio Exterior (Icomex) do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Ou seja, o efeito China no superávit brasileiro subiu de 39% para 68% em 10 anos, valores nada desprezíveis e que exigem ponderação por parte do governo brasileiro.

 

China contra-ataca

E a reação chinesa não demorou. Em nota, a Embaixada da China no Brasil afirmou que os norte-americanos “espalham mentiras políticas sobre os asiáticos, com uma mentalidade de guerra fria”. E ainda faz um alerta para a malevolência dos EUA, que sacrifica o desenvolvimento dos outros países para buscar a superioridade dos seus próprios interesses. Os americanos alegam que os equipamentos chineses não são seguros em relação a dados e que isso será crucial na tecnologia 5G, porque cidades inteiras, indústria, transporte e outras missões críticas estarão conectadas. Mas a Huawei nega que exista qualquer risco de espionagem por parte do governo chinês através de seus equipamentos ou que ceda dados de usuários, como acusa Trump.

O embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, declarou que a visita não teve outras intenções, mas sim é resultado de sete meses de negociações e reuniões para a facilitação de comércio entre dois países. “No caso do 5G, estamos oferecendo financiamento para o Brasil comprar equipamentos de fornecedores que garantam a proteção de dados, diferente da China”, diz o diplomata.

Para analistas do setor, a briga entre americanos e chineses, no entanto, fica só no plano geopolítico, porque, na prática, quem está na liderança da disputa pelo mercado brasileiro de infraestrutura de telecomunicação não são nem americanos nem chineses, mas sim europeus, como a sueca Ericsson e a finlandesa Nokia, além da coreana Samsung e da japonesa NEC, que correm por fora.