Governo vai analisar posição dos EUA sobre quebra de patentes, mas defende terceira via

Governo vai analisar posição dos EUA sobre quebra de patentes, mas defende terceira via

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) – O governo brasileiro mantém, em princípio, a posição de apoio a uma terceira via em relação à quebra de patentes de vacinas contra a Covid-19, mesmo com a mudança de postura dos Estados Unidos, disse nesta quinta-feira o ministro das Relações Exteriores, Carlos Alberto França, ressaltando que o país ainda vai analisar a nova posição norte-americana de apoio à quebra.

Em apresentação na Comissão de Relações Exteriores do Senado, França afirmou que terá uma videoconferência com a representante comercial dos Estados Unidos (USTR, na sigla em inglês), Katherine Tai, na sexta-feira, quando deve discutir mais detalhes da mudança de posição dos EUA anunciada na véspera.

“Ainda estamos analisando a posição norte-americana. Entendemos que é uma proposta mais focada em uma negociação que levará tempo e não me parece claro ainda se esse processo vai lograr consenso e que países terão capacidade para produzir mais”, disse o ministro.

“Nossa impressão é que a maioria dos países continuará dependendo da cooperação das farmacêuticas, e eu penso que o Brasil não pode se afastar de investidores e produtores de vacina e nem afetar negociações que temos aqui como por exemplo com AstraZeneca e outros produtores.”

A discussão da quebra de patentes de vacinas contra a Covid-19 vêm ocorrendo desde o ano passado na Organização Mundial do Comércio (OMC) a partir de uma proposta apresentada pela Índia e pela África do Sul, e endossada por grande parte dos países em desenvolvimento, pela quebra ampla de patentes de vacinas e medicamentos contra a Covid-19 até que a maior parte da população global esteja vacinada.

Apesar de ter aplicado a quebra de patentes em medicamentos contra a Aids ainda na década de 1990, o governo brasileiro dessa vez foi contrário e se alinhou aos países ricos, encabeçados pelos Estados Unidos –na época comandados por Donald Trump– e foram contrários a qualquer tipo de compromisso nessa questão.

De lá para cá, o Brasil se alinhou a uma terceira proposta, desenvolvida por Canadá e Chile, baseado no acordo TRIPS, o tratado internacional de direitos de propriedade intelectual, que prevê exceções limitadas para o direito de patentes. Essa proposta está sendo chamada de terceira via.

O acordo prevê, entre outros pontos, o levantamento dos direitos de patentes em casos excepcionais desde que não prejudique de maneira “não razoável” o detentor da patente e para uso do produto apenas de forma não comercial, com alcance e duração restrita.

No entanto, com a mudança de posição dos EUA, que passou a defender a quebra das patentes dos imunizantes, outros países desenvolvidos também passaram a aceitar essa possibilidade. França e Espanha já se declararam favoráveis, enquanto a União Europeia como um todo informou que aceita discutir.

No entanto, o governo brasileiro ainda mantém sua defesa da terceira via.

França argumentou que os maiores gargalos hoje para a vacinação seriam a capacidade internacional de produção e a falta de suprimentos, e que a quebra de patentes não resolveria isso.

“A quebra de patentes em um primeiro momento só favoreceria os países detentores de tecnologia, que poderiam imediatamente agir no sentido de suspender a patente”, disse o chanceler, ressaltando que países mais pobres não teriam condições de produzir, o que não resolveria o problema.

O governo brasileiro vem trabalhando com a OMC para tentar viabilizar essa terceira via e tentar ampliar a quantidade de locais no mundo onde as vacinas pudessem ser produzidas.

Ao mesmo tempo, o Congresso analisa projeto para quebra a patente das vacinas no Brasil, apesar da posição contrária do governo, que teme o impacto disso nas vendas de vacinas já acertadas com grandes farmacêuticas.

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