Como acontece com todos os governos, há um esforço do presidente para criar uma agenda positiva no início da gestão. Lula já cobrou isso na primeira reunião ministerial e voltou depois a insistir com os subordinados. A ideia é criar uma dinâmica virtuosa que atraia a simpatia da população, facilite as negociações com o Congresso e crie as bases para uma administração bem-sucedida.

Como isso muda com os ataques de 8 de janeiro? O bolsonarismo foi encurralado depois de expor sua essência criminosa, o que levou o petista a ganhar o apoio silencioso da imensa maioria da população. A última pesquisa Ipec comprova esse efeito. Mas isso não significa apoio tácito ao governo que se inicia. Ao contrário, o golpe fracassado aumentou o desafio de Lula para convencer metade da população que não votou nele de que tem um plano coerente para recolocar o País nos trilhos.

Lula ganhou mais apoio depois do frustrado golpe bolsonarista, mas mostra dificuldades em criar uma agenda positiva

Por enquanto, a tal “agenda positiva” ainda está nebulosa. As propostas retrógradas de ministros já provocaram um “freio de arrumação”, e as notícias que vieram depois revelaram uma sucessão de tropeços. O levante dos sigilos de 100 anos, prometido para logo depois da posse, está em um lento processo de análise e pode nem abarcar o cartão de vacinação do capitão. A liberação da agenda da ex-primeira-dama foi um flop ao mostrar visitas de manicure. O uso do cartão presidencial por Bolsonaro revelou abusos previsíveis, mas nada que mude a percepção de que essa ferramenta de gastança indiscriminada precisa deixar de ser secreta – o que a atual gestão não cogita.

Quanto às medidas propriamente ditas, até agora as boas novas são apenas a reversão a conta-gotas das portarias bárbaras de Bolsonaro para destruir a Educação, a Ciência e a Saúde. Beleza, mas não há ainda grandes projetos além da retomada das velhas bandeiras do PT, como o Bolsa Família e o Minha Casa, Minha Vida.

A área mais sensível continua sendo a Economia. Fernando Haddad procura trazer tranquilidade ao pregar a diminuição do déficit público, mas seus pacotes até agora são apenas um conjunto de intenções parcialmente irrealizáveis, ambiciosas na arrecadação e tímidas em contenção de gastos. Como Lula já advertiu, não é possível se fiar na estratégia de usar a “herança maldita” de Bolsonaro como escudo. É preciso mostrar serviço. E rapidamente.