Diante do bloqueio dos deputados de esquerda, o governo francês decidiu nesta terça-feira adotar, sem a votação do Parlamento, sua polêmica reforma da lei trabalhista, contra a qual as manifestações se multiplicam há dois meses.

O presidente François Hollande convocou para o início da tarde um Conselho de ministros que autorizou o recurso do governo ao artigo 49-3 da Constituição, que permite evitar o voto do Parlamento ao invocar a responsabilidade do governo.

Agora, se nenhuma moção de censura for aprovada, o texto será adotado sem qualquer outra formalidade.

O primeiro-ministro Manuel Valls anunciou pouco depois na Assembleia Nacional o recurso a este artigo, argumentando que “a reforma precisa ser feita” e que “o país deve avançar”.

A reforma trabalhista, apresentada como último grande projeto do mandato do presidente Hollande, provocou uma série de protestos em todo o país.

Desde 9 de março, sindicatos e estudantes organizaram meia dúzia de manifestações nacionais, muitas das quais foram marcadas por violência, embora os protestos tenham gradualmente diminuído em número ao longo do tempo.

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Partilhando as preocupações dos manifestantes, vários deputados de esquerda indicaram que não votariam o projeto de lei.

Sem maioria sobre este texto, o governo decidiu usar a arma constitucional 49-3, já utilizada em 2015 para passar uma reforma econômica impulsionada pelo ministro da Economia Emmanuel Macron.

A oposição de direita, minoritária na Assembleia Nacional, já anunciou a sua pretensão de apresentar uma moção de censura.

Os deputados socialistas, chamados de “rebeldes” por serem contrários à guinada liberal da política de Hollande, devem se reunir para decidir “coletivamente” sua posição, segundo indicou um deles, Christian Paul.

A reforma visa, segundo o governo, dar mais flexibilidade às empresas para lutar contra um desemprego de massa (mais de 10%), mas tem sido considerada muito liberal pelos seus detratores.

O texto confere maiores poderes às empresas em termos de organização do tempo de trabalho e de dispensa.

Os críticos argumentam que ela aumentará a precariedade trabalhista.

Há dois meses, sindicatos de trabalhadores e estudantes se manifestam contra o projeto. Como parte dessa mobilização, nasceu o movimento cidadão “Nuit debout”, que ocupa a emblemática Place de la Republique, em Paris, e outros lugares em várias cidades.

Logo após o anúncio da decisão do governo, o “Nuit debout” afirmou em um comunicado que a aprovação da lei trabalhista sem o voto do Parlamento é “um insulto ao povo”.

“Esta negação da democracia depois de um movimento social que reuniu centenas de milhares de pessoas nas ruas, nas empresas, nas universidades, nas escolas secundárias e nas praças da França, é um insulto para o povo”, indicou o movimento.

Com a decisão tomada nesta terça-feira de impor a lei contornando o debate parlamentar, o governo francês, já impopular, corre o risco de aumentar o já crescente descontentamento dos seus próprios eleitores.


E compromete ainda mais as chances da esquerda na eleição presidencial de 2017.

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