O governo quer “limpar” o estoque de concessões problemáticas leiloadas na gestão de Dilma Rousseff. Mas deverá enfrentar a resistência das empresas que, mesmo com dificuldades em cumprir seus contratos, não estão dispostas a utilizar a “saída amigável” dos empreendimentos proposta pelo governo. Os dois lados falam em diálogo, mas admitem que é elevado o risco de que o governo tenha de enfrentar ações na Justiça.

Em sua maior parte, os empreendimentos leiloados no governo Dilma avançaram. Rodovias e aeroportos realizaram um bom conjunto de investimentos – uma grande parte com financiamentos de caráter emergencial liberados pelo BNDES, os empréstimos-ponte. Mas esse dinheiro acabou. Pior: as concessionárias agora precisam pagar ao banco. Há um estoque estimado de R$ 4 bilhões em financiamentos desse tipo a receber.

Isso não seria problema, dizem as concessionárias, se o BNDES tivesse liberado o financiamento de longo prazo prometido à época dos leilões. Mas, em boa parte dos projetos, esse dinheiro não saiu. Seja porque as concessionárias são as construtoras que viraram alvo de investigação da Lava Jato, seja porque os cálculos que fizeram para dar suas ofertas no leilão não consideraram a recessão que se abateu sobre o País. Sem dinheiro, as concessionárias não poderão investir o que prometeram.

“Há um conjunto de fatores que leva à inexequibilidade do contrato”, disse o secretário de Coordenação de Projetos do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Tarcísio Freitas, citando a Lava Jato, a crise e os lances “irresponsáveis” de algumas concessionárias nos leilões. “Isso acaba caminhando para a caducidade.” Ou seja, à rescisão do contrato, mas não sem antes uma batalha judicial.

Para evitar esse caminho, o governo tentará que concessionários que não estão bem deixem amigavelmente seus negócios, devidamente indenizados. E estes seriam novamente leiloados. Mas as concessionárias não estão inclinadas a abrir mão e apostam em negociações para reequilibrá-los. Essa possibilidade existe na lei. Porém, para o governo, não é suficiente para torná-las viáveis.

Candidatas

A concessão da rodovia BR 153, que liga Anápolis (GO) a Aliança do Tocantins (TO), é apontada como “candidatíssima” a ser devolvida ao governo, segundo se avalia no mercado. Arrematada em maio de 2014 pelo grupo Galvão, ela evoluiu pouco, porque não obteve sequer o empréstimo-ponte do BNDES. Relatório da Agência Nacional de Transportes Terrestres de junho atesta que, com exceção de uma operação tapa-buraco, as obras estavam paralisadas. Procurado, o grupo Galvão não se manifestou.

Em outros casos, as dificuldades não são tão evidentes. Freitas já afirmou publicamente que, na sua opinião, o Rio Galeão seria um exemplo típico de concessão que deve passar por nova licitação, pela impossibilidade de as contas fecharem.

A outorga do Galeão, cuja concessão foi arrematada por um consórcio formado por Odebrecht, Changi (de Cingapura) e Infraero, foi de R$ 19 bilhões. A cifra, disse Freitas, é próxima daquela paga pelo concessionário do aeroporto de Guarulhos. “Mas o movimento em Guarulhos é quase o dobro”, frisou.

A empresa, porém, não tem intenção de sair do negócio. Ela informou que entrará com pedido de reequilíbrio econômico-financeiro do contrato, no qual se compromete a pagar os R$ 19 bilhões, mas de outra forma. Em vez de recolher parcelas de R$ 900 milhões ao ano, como previsto, propõe pagar menos nos primeiros anos, quando há mais investimentos, e mais nos anos seguintes.

A empresa alega que seu fluxo de caixa foi afetado pela retração econômica e pela falta de liberação do financiamento de longo prazo do BNDES. Porém, a empresa informou por nota que está “confiante que será possível chegar a um entendimento para dar o necessário reequilíbrio ao contrato, a fim de garantir sua continuidade de forma sustentável permitindo, assim, a constante melhoria e crescimento do aeroporto.”