“E daí? Querem que eu faça o quê? Não sou coveiro.” Essas declarações infames do presidente Jair Bolsonaro foram feitas diante da escalada de mortes de brasileiros ao longo da pandemia, mas poderiam ser aplicadas ao modo como ele trata os cidadãos do País a todo momento, desde que tomou posse. Poderia ser usada na Bahia, quando o estado era assolado por chuvas e o presidente passava as férias no Sul, dançando funk e andando de jet-ski, ou estendida à maneira criminosa como ele age em relação à devastação da Amazônia. O descaso mais recente, no entanto, diz respeito à forma como o governo vem tratando os brasileiros que vivem na Ucrânia.

Não é preciso lembrar que Putin já estava prestes a invadir o país vizinho quando Bolsonaro o visitou e saiu de lá exaltando sua solidariedade. “Putin busca a paz”, teria dito, uma expressão que pode ser interpretada de duas formas: ou o presidente do Brasil é cúmplice do autocrata russo ou apenas um paspalho que acreditou em suas mentiras. Ambas as opções demonstram o quão inepto ele é para se manter no cargo que ocupa.

Sabendo que a Rússia enviava tropas para a fronteira ucraniana, qualquer pessoa com um conhecimento mínimo de geopolítica ou mesmo humanidade teria planejado uma ação para retirar os cidadãos de seu país em caso de guerra. Seria obrigatório, em um Brasil normal, que o presidente pedisse ao seu chanceler ou ao ministro da Defesa, que esboçasse um plano para evacuar os brasileiros ou pelo menos um esboço de uma operação de resgate. Isso seria o mais básico padrão internacional. Bolsonaro se gaba de ter sido militar e de ter o general Braga Netto como assessor, mas ambos demonstraram suas nulidades gerenciais em não planejar nem uma coisa, nem outra. Que tipo de ministro da Defesa vê tropas se movimentando na fronteira de um país e fica quieto? Para uma posição tão apática não basta ser desqualificado: é preciso ser muito, muito incompetente.

O que mais incomoda é a falta de respeito com os brasileiros que estão lá. Na live que apresenta toda quinta-feira – programa que seria apenas um bizarro humorístico, se eu não fosse brasileiro –, o presidente Jair Bolsonaro provou mais uma vez o nível de sua tosquice: rabiscou um telefone com caneta Bic em um pedaço de papel e falou que os brasileiros na Ucrânia deviam ligar para o tal número. Não era um comunicado oficial, uma campanha institucional ou mesmo um comercial de TV: ele rabiscou um número de telefone com uma caneta Bic uma folha de papel sulfite. Será que existe em algum lugar do mundo uma estratégia mais improvisada que essa? Um presidente mais “nas coxas” que o nosso?

Se ele soubesse ler notícias, talvez compreendesse que a Ucrânia está sem internet e com as linhas telefônicas prejudicadas pelos ciberataques russos. Dá para imaginar um brasileiro em um bunker na Ucrânia vendo a live do presidente e pensando: “ah, agora sim estou salvo, o Bolsonaro me mandou ligar para a embaixada em Brasília. Como não pensei nisso antes?” É simplesmente patético sob qualquer ponto de vista.

No dia em que a Rússia iniciou os ataques contra a Ucrânia, Bolsonaro postou no Twitter – o único ambiente onde ele é, realmente, presidente do Brasil – que estava empenhado em proteger os brasileiros na Ucrânia. Era mentira: o jornal O Estado de S. Paulo revelou que os brasileiros que entraram em contato com a embaixada ouviram a seguinte mensagem: “se virem”.

Se virar. É o máximo que podemos fazer até outubro, quando nos livraremos do inepto que ocupa o Palácio do Planalto.