O governo colocou em marcha uma estratégia para reforçar o caixa do Tesouro Nacional e, assim, garantir os recursos para fazer frente ao vencimento recorde de títulos da dívida pública nos primeiros meses de 2021. Como mostrou o Estadão/Broadcast, uma fatura de R$ 643 bilhões vence entre janeiro e abril. O valor é mais que o dobro da média registrada nos últimos cinco anos e equivale a 15,4% de toda a dívida interna do Brasil.

Como parte dessa ação para formar um “colchão da dívida”, a equipe econômica já negocia com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a devolução antecipada de R$ 100 bilhões aos cofres do Tesouro.

O governo também está em negociação com a Caixa para ver quanto mais o banco pode devolver dos chamados Instrumentos Híbridos de Capital e Dívida (IHCD) – usados no passado para injetar recursos na instituição financeira -, mas neste caso o valor ainda não está definido. O pagamento de dividendos também está na mira dos técnicos.

Não está descartada ainda a possibilidade de o Tesouro pedir uma nova transferência do lucro obtido pelo Banco Central com os efeitos da valorização do dólar sobre o valor em reais das reservas internacionais, o chamado lucro cambial. Segundo apurou a reportagem, essa via já está sendo considerada por técnicos da área econômica, embora ainda não haja uma negociação aberta com o BC sobre o tema.

Após a última transferência para o Tesouro e com novos resultados positivos, o estoque de reservas do lucro cambial está em R$ 222,25 bilhões até 9 de outubro, segundo dados do próprio Banco Central.

O governo trabalha em várias frentes de ação para reforçar o “colchão da dívida” diante do cenário que aguarda o País no início de 2021. Para quitar os vencimentos, o governo precisaria emitir novos papéis, mas há desconfiança entre economistas sobre a capacidade de o País captar mais recursos diante da insegurança em relação à continuidade do ajuste nas contas públicas. O prêmio exigido pelos investidores para financiar o governo também pode impor um desafio a essa rolagem da dívida.

Segundo um integrante da equipe econômica, a intenção é “avançar o máximo possível” nas discussões nas próximas semanas para deixar todas as medidas engatilhadas ainda para o primeiro trimestre de 2021. As negociações já haviam entrado no radar do mercado diante do desafio fiscal.

BNDES

O valor da devolução do BNDES é o único que já está praticamente definido, de acordo com as fontes ouvidas pela reportagem. O montante será adicional à transferência de R$ 23 bilhões que o banco já precisaria fazer de acordo com o calendário regular de pagamentos ao Tesouro Nacional. Em 30 de junho de 2020, o saldo dos recursos aportados pelo governo no BNDES estava em R$ 197,7 bilhões.

No caso da Caixa, os técnicos ainda estão discutindo e analisando qual é a capacidade de o banco devolver novos recursos. No ano passado, a instituição já havia repassado ao Tesouro R$ 10,35 bilhões, cerca de 25% do valor total dos Instrumentos Híbridos de Capital e Dívida – que somavam R$ 40 bilhões.

A mesma avaliação está sendo realizada para o pagamento de dividendos pelos bancos públicos, caso da própria da Caixa e também do Banco do Brasil. As devoluções extraordinárias de recursos foram suspensas neste ano para preservar o capital dessas instituições, num momento de maior demanda por crédito por pessoas físicas e empresas devido à pandemia da covid-19. Agora, porém, a ideia é retomar as operações para reforçar o caixa do governo federal.

No fim de agosto, o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovou a transferência de R$ 325 bilhões do lucro cambial do BC, justamente para fortalecer as reservas do Tesouro. A medida dá mais conforto para o governo administrar os compromissos da dívida sem necessidade de pagar qualquer preço para emitir novos títulos e levantar os recursos necessários. Isso é importante porque grande parte da dívida pública brasileira (21,65%, ou R$ 955 bilhões) vence nos próximos 12 meses.

O valor repassado em agosto, no entanto, ficou abaixo dos R$ 445 bilhões pedidos pela equipe econômica. O BC resistiu a fazer uma transferência naquele montante, como revelou o Estadão/Broadcast à época. No primeiro semestre, o BC registrou um resultado positivo de R$ 503 bilhões, dos quais R$ 478,5 bilhões vieram das operações cambiais.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.