A governança corporativa deixou de ser um diferencial competitivo para se consolidar como uma necessidade estratégica — especialmente para empresas familiares que buscam longevidade, profissionalização e crescimento sustentável. Ao longo de mais de 25 anos vivenciando e conduzindo um processo estruturado de implementação de governança em nossa família empresária, tornou-se evidente que essa jornada transforma não apenas a gestão, mas a própria cultura organizacional e a forma como família, patrimônio e negócio se relacionam.
O primeiro grande avanço proporcionado pela governança corporativa é a *clareza na definição de papéis*. Em empresas familiares, é comum que as fronteiras entre ser membro da família, ser acionista e ser executivo se confundam. Essa sobreposição gera ruídos, conflitos de interesse e decisões muitas vezes baseadas em expectativas pessoais, e não em critérios técnicos. Com a institucionalização de regras, estruturas e processos formais, tornou-se possível delimitar essas esferas de maneira transparente e justa, trazendo segurança e previsibilidade para todos os sócios e herdeiros.
A participação de *consultorias especializadas* conferiu neutralidade, método e profundidade ao processo. A formação continuada dos familiares permitiu que o grupo compreendesse não apenas os fundamentos da boa governança, mas seu papel como pilar de perenidade. Essa evolução marcou nossa transição de uma empresa familiar para uma *família empresária*, preparada para exercer seu papel estratégico com profissionalismo e visão de longo prazo.
Outro benefício determinante foi a capacidade de *separar e estruturar áreas que antes estavam absorvidas pela operação principal*, como gestão patrimonial imobiliária, gestão financeira e iniciativas de novos negócios. Ao tratar cada eixo com governança própria, abriu-se espaço para decisões mais assertivas, maior agilidade e expansão organizada.
A criação de *conselhos formais* consolidou essa transformação:
* O *Conselho de Família* tornou-se o guardião do legado, dos valores e da coesão familiar, além de responsável pela formação das próximas gerações e pela preservação dos princípios dos fundadores.
* O *Conselho de Sócios* passou a ser o fórum estratégico, com visão integrada de todos os negócios do grupo, responsável por orientar o Conselho de Administração com diretrizes claras e coerentes.
* O *Conselho de Administração*, com mandato definido e aderente às boas práticas, assumiu o papel de interlocutor qualificado entre sócios e executivos, garantindo disciplina estratégica, mitigação de riscos e foco na geração sustentável de valor.
Com a governança plenamente implementada, a empresa ganhou *profissionalização, transparência e estabilidade*, permitindo que os executivos se concentrassem integralmente na maximização dos resultados e no desenvolvimento sustentável dos negócios. Ao mesmo tempo, os valores, princípios e a visão dos fundadores foram preservados de forma institucionalizada — e não mais apenas pela tradição oral ou pela influência direta da família.
A experiência demonstrou, na prática, que governança corporativa não é um modelo teórico nem uma “camada adicional de burocracia”. Trata-se de um mecanismo poderoso de *proteção do patrimônio, **fortalecimento das relações familiares* e *perpetuação dos negócios*, garantindo que as próximas gerações encontrem uma estrutura sólida, coerente e capaz de atravessar ciclos econômicos e mudanças de liderança.
Mais do que ordenar processos, a governança corporativa cria condições reais para que uma empresa familiar se torne *uma família empresária preparada para construir o futuro*, honrando sua história sem comprometer sua evolução. É, em essência, um investimento estratégico na longevidade do legado — e nos negócios que ainda virão.
Marcelo Cereser é presidente do Conselho de Sócios da CRS Brands S.A.; CEO da Castelo Alimentos S.A.; diretor titular do CIESP Jundiaí; vice-chairman do V.I. Vinegar Institute (EUA); vice-presidente da ANAV – Associação Nacional dos Produtores de Vinagres; delegado do Sindicato do Vinho de Jundiaí; diretor plenário da FIESP; ex-secretário de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação da Prefeitura de Jundiaí.