Três semanas depois de sua detenção em Tóquio, Carlos Ghosn foi acusado formalmente, nesta segunda-feira (10), por ocultar parte de sua renda durante cinco anos, e continuará em prisão provisória.

A Promotoria decidiu acusar o presidente da aliança Renault-Nissan-Mitsubishi Motors por não ter declarado às autoridades da Bolsa quase 5 bilhões de ienes (38 milhões de euros) de seus rendimentos durante um período de cinco anos, entre 2010 e 2015.

Seu braço direito, Greg Kelly, detido no mesmo dia que o executivo, também foi acusado.

A montadora Nissan também foi acusada formalmente de ter fornecido as declarações de rendimentos às autoridades.

Ghosn seguirá detido. A prisão provisória foi prorrogada para permitir a investigação de outra suposta ocultação de renda, neste caso entre 2015 e 2018, por um total de 4 bilhões de ienes. O período sob custódia pode chegar a 22 dias a partir desta segunda-feira.

A Nissan também foi indiciada por ter entregue relatórios às autoridades financeiras.

Em comunicado, a companhia expressou “seu mais sincero pesar”, e reconheceu que o caso “prejudicava sua comunicação com os mercados”.

“A Nissan continuará se esforçando para reforçar sua direção”, acrescentou o grupo, igualmente visado por um escândalo de inspeção de seus veículos.

Carlos Ghosn, 64 anos, chegou ao Japão em 19 de novembro em um jato particular. No desembarque, foi detido pelos investigadores da Promotoria por suposta sonegação fiscal e foi levado para um centro de detenção da zona norte do Tóquio.

Poucos dias depois foi destituído da presidência dos conselhos de administração da Nissan e da Mitsubishi Motors.

A Promotoria também investiga o executivo pelo uso ilícito de residências de luxo pagas pela empresa.

A Nissan anunciou que apelará contra uma decisão de um tribunal do Brasil que autorizou representantes de Ghosn a entrar em um apartamento no Rio de Janeiro. A empresa alega que deseja “evitar a destruição de possíveis provas”.

O caso está cercado de incógnitas porque os promotores divulgam poucas informações, e a defesa de Ghosn, liderada por Motonari Ohtsuru, ainda não falou em público.

De acordo com a imprensa japonesa, Ghosn nega as acusações. “Tem uma mentalidade forte e combativa”, afirmaram fontes na sede da montadora francesa Renault.

O executivo franco-brasileiro de origem libanesa afirma que é bem tratado, recebe visitas dos embaixadores da França e do Líbano, assim como do cônsul do Brasil, e passa o tempo lendo livros e revistas entre os interrogatórios.

O jornal Asahi Shimbun afirma que, durante os interrogatórios, que acontecem em inglês e são gravados, Ghosn admitiu ter assinado documentos que mencionam os pagamentos que teria recebido, mas garante que os valores não eram definitivos e por isso não constavam nos documentos públicos da Nissan.

Uma fonte ligada às investigações afirmou que o sistema de suposta fraude teria começado após a entrada em vigor de uma lei que obriga os executivos mais bem pagos de uma empresa a tornar públicas suas remunerações.

O objetivo de Ghosn teria sido evitar as críticas dos acionistas e dos funcionários.

Independentemente do resultado judicial, o caso afetará a aliança Renault-Nissan, nascida em 1999, e que, em 2016, com a entrada da Mitsubishi Motors, tornou-se o maio grupo mundial do setor automobilístico.

Na Nissan, a demissão de Ghosn provocou reações intensas.

“O senhor Ghosn e o Estado francês (acionista da Renault) são o diabo”, afirmou o analista Takaki Nakanishi, para quem a crise é uma oportunidade para reforçar a parte japonesa da empresa.

Na Renault, que tem 43% da Nissan e da qual Ghosn permanece como conselheiro delegado, há “estupor”, e o executivo recebe mensagens de apoio. A montadora francesa lamenta não ter recebido todos os documentos do caso por parte da Nissan.

Contactado pela AFP, a Renault, assim como seu primeiro acionista, o Estado francês, não quis comentar o anúncio da acusação. De acordo com uma fonte próxima à empresa, um conselho de administração está agendado para quinta-feira, uma reunião ordinária programada antes do início do escândalo, durante o qual nenhuma decisão importante é esperada.

No Líbano, a detenção do empresário, símbolo do sucesso da diáspora libanesa, também despertou comentários a favor do executivo.

“A fênix libanesa não será queimada pelo sol japonês”, disse o ministro do Interior, Nohad Machnouk.