24/10/2023 - 11:31
Cientistas revelaram um vínculo entre o genoma dos primeiros “homo sapiens” que chegaram à Europa há 45.000 anos, dos quais se pensava não haver herança genética, e o das populações muito mais tardias de um período do Paleolítico, conhecido por suas estatuetas de Vênus.
A descoberta foi feita com base em fragmentos de crânios do sítio arqueológico de Buran Kaya III, na península da Crimeia, ao norte do Mar Negro, escavados há mais de dez anos.
São ossos de dois indivíduos entre 36.000 e 37.000 anos atrás, cujo genoma foi extraído recentemente, graças a novas técnicas, explica estudo publicado esta semana na “Nature Ecology & Evolution”.
Uma equipe internacional de pesquisadores comparou seus genomas com bases de dados de DNA e com o genoma do ser humano moderno mais antigo da Europa, sequenciado no crânio de uma mulher de cerca de 45.000 anos atrás, encontrado no território da República Tcheca.
Nesse período, os primeiros homo sapiens, procedentes da África, desembarcaram no continente euro-asiático, cuja população se formou em ondas sucessivas.
Uma parte desta população pioneira se estabeleceu na Ásia, deixando um legado genético mesmo entre as populações atuais.
A história foi mais caótica para o ramo europeu, do qual até agora não se encontrou uma impressão genética.
Isto levou à suposição de que tinha desaparecido, até ser “totalmente substituída” – vários milhares de anos depois – por uma nova onda de migração, da qual fazem parte os humanos de Buran Kaya III, geneticamente próximos do atual “homo sapiens”, explicou à AFP a diretora de pesquisa do órgão científico francês CNRS e coautora do estudo, Eva María Geigl.
O declínio se deu pelo esfriamento do clima e pela aridificação ocorridos entre 40.000 e 45.000 anos atrás, agravados por uma gigantesca erupção do vulcão Campos Fedenos (Itália) que cobriu parte da Europa com uma nuvem de cinzas.
Esta crise ecológica foi “suficientemente grave para causar o desaparecimento destes primeiros ‘sapiens’ e talvez também dos Neandertais”, outra espécie humana extinta no mesmo período, continua a geneticista.
Mas a descoberta de seu vestígio no genoma dos humanos do sítio da Crimeia sugere que uma parte deste assentamento pioneiro sobreviveu à catástrofe.
“Alguns indivíduos sobreviveram, já que deixaram parte de seus genes”, afirma o diretor de pesquisa do CNRS e coautor do estudo, Thierry Grange.
Seus descendentes “se misturaram com os recém-chegados depois que o clima esquentou e ficou mais úmido”, acrescenta Geigl.
Os dois humanos do sítio da Crimeia, que também foram comparados com genomas mais recentes, estão geneticamente ligados a populações da Europa Ocidental associadas à cultura Gravettien, localizada entre 31.000 e 23.000 anos atrás. Essa cultura é conhecida pela produção de estatuetas femininas chamadas Vênus, ou Dama de Brassempuy (figura de marfim representando uma cabeça humana).
As escavações de Buran Kaya III permitiram descobrir objetos bastante semelhantes (ferramentas de pedra e marfim de mamute), mas o vínculo com essa cultura no Ocidente era debatida entre os arqueólogos.
Ambas “estavam muito distantes geograficamente e havia mais de 5.000 anos de diferença”, enfatiza Grange.
Seus trabalhos fornecem a prova genética que nos permitem afirmar que a cultura gravetiana teve muitas origens no Leste. E, do mesmo modo, mostra que os antepassados da Europa Oriental migraram para o Oeste, “contribuindo para os genomas dos europeus atuais”, conclui Geigl.
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