Generais dos EUA dizem que recomendaram permanência de soldados no Afeganistão

Generais dos EUA dizem que recomendaram permanência de soldados no Afeganistão

Generais do mais alto escalão das Forças Armadas dos Estados Unidos disseram nesta terça-feira (28) que aconselharam a manutenção de tropas no Afeganistão para fortalecer o governo afegão e manifestaram preocupação pela possibilidade da continuidade do vínculo entre os talibãs e a organização jihadista Al-Qaeda.

O general Mark Milley, chefe do Estado-Maior Conjunto, e o general Kenneth McKenzie, que lidera o Comando Central dos Estados Unidos que abrange o Afeganistão, disseram que tinham recomendado pessoalmente a manutenção de aproximadamente 2.500 soldados americanos no país asiático.

O presidente Joe Biden ordenou em abril a retirada completa das forças americanas do Afeganistão antes de 11 de setembro, mantendo o estabelecido no acordo alcançado com os talibãs por seu antecessor na Casa Branca, Donald Trump.

Milley, McKenzie e o secretário de Defesa, Lloyd Austin, falaram nesta terça na Comissão das Forças Armadas do Senado sobre o fim da mobilização de tropas americanas no Afeganistão.

Ao ser questionado se a retirada dos militares e a evacuação caótica de civis em Cabul tinham prejudicado a imagem internacional dos Estados Unidos, Milley disse que aliados e adversários estavam revisando “intensamente” a credibilidade de Washington.

“Creio que ‘prejuízo’ é uma palavra que poderia ser utilizada”, afirmou o militar.

Milley ressaltou que os talibãs “eram e continuam sendo uma organização terrorista, e que ainda não romperam completamente os laços com a Al-Qaeda”, a rede que usou o Afeganistão como base para planejar os ataques de 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington.

“Resta saber se os talibãs conseguirão ou não consolidar o poder, ou se o país se fragmentará novamente em uma guerra civil”, disse Milley. “Contudo, devemos continuar protegendo o povo americano dos ataques terroristas que possam surgir do Afeganistão”, afirmou.

“Uma rede Al-Qaeda ou um grupo Estado Islâmico reconstituídos com aspirações de atacar os Estados Unidos é uma possibilidade muito real”, advertiu o general aos senadores, apesar de admitir que ainda “é muito cedo para determinar a sua capacidade”.

– ‘Pegou a todos nós de surpresa’ –

O secretário de Defesa, por sua vez, ressaltou que os Estados Unidos “não compreenderam completamente a profundidade da corrupção e da liderança débil” nas Forças Armadas afegãs.

“Ajudamos a construir um Estado, mas não conseguimos forjar uma nação”, disse Lloyd Austin.

“O fato de o Exército afegão, que foi treinado por nós e nossos aliados, simplesmente ter se desvanecido, em muitos casos sem um disparo sequer, pegou a todos nós de surpresa”, afirmou o chefe do Pentágono. “Seria desonesto dizer o contrário”, acrescentou.

O secretário de Defesa disse que os Estados Unidos proporcionaram ao Exército afegão “equipamentos e aviões, e treinamento para utilizá-los”, mas argumentou que, “ao final, não foi possível oferecer-lhes a vontade de ganhar”.

Milley também falou sobre os telefonemas que fez a seu equivalente chinês, o general Li Zuocheng, ao término do mandato de Trump, assegurando que tinham a intenção de “diminuir” as tensões e que o ex-presidente não tinha a intenção de atacar a China.

“Eu sei, e tenho certeza, que o presidente Trump não tinha a intenção de atacar os chineses”, afirmou.

– Reduzir a tensão com Pequim –

“Minha tarefa naquele momento era desescalar. Minha mensagem foi coerente: manter a calma e a estabilidade e desescalar. Não vamos atacá-los [os chineses]”, assinalou.

As conversas entre Milley e Li foram reveladas no livro “Peril” (“Perigo”, em tradução livre do inglês), dos jornalistas Bob Woodward e Robert Costa, do Washington Post.

O primeiro telefonema foi em 30 de outubro, quatro dias antes das eleições presidenciais nos Estados Unidos. O segundo foi em 8 de janeiro, dois dias depois da invasão do Capitólio pelos apoiadores mais fanáticos de Trump para evitar a confirmação da vitória de Biden, em uma sessão conjunta da Câmara e do Senado.

Nesse sentido, alguns legisladores republicanos acusaram Milley de extrapolar sua autoridade e pediram sua demissão. Hoje, Milley defendeu suas ações e disse que os telefonemas foram feitos em coordenação com os secretários de Defesa nos dois períodos distintos, Mark Esper e seu sucessor interino Christopher Miller.

Segundo o general, informações de Inteligência fizeram Washington pensar que Pequim temia um ataque dos Estados Unidos.

“Essas comunicações de militares para militares no mais alto escalão são fundamentais para a segurança dos Estados Unidos, com o objetivo de desconfigurar ações militares, gerenciar crises e prevenir guerras entre grandes potências que possuem um arsenal nuclear”, explicou Milley.

“Em nenhum momento tentei mudar ou influenciar o processo, usurpar a autoridade ou me inserir na cadeia de comando”, argumentou Milley.

“Acredito firmemente no controle civil das Forças Armadas como um princípio fundamental essencial para esta república e estou comprometido em garantir que as Forças Armadas fiquem longe da política interna”, acrescentou.

Após a publicação de trechos de “Peril” em 15 de setembro, o presidente Biden renovou sua confiança no general Milley.