Ministro Luiz Fux é o terceiro a votar. Alexandre de Moraes e Flavio Dino votaram pela condenação de todos os réus.A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou nesta quarta-feira (10/09) o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus do núcleo principal no processo sobre tentativa de golpe de Estado em 2022.
Fux vota para absolver réus do crime de organização criminosa
Após analisar as questões preliminares do processo – como se o STF seria competente para julgar essa ação penal e se houve violação ao direito à ampla defesa dos réus (detalhes abaixo) – Fux passou à análise dos crimes atribuídos a Bolsonaro e aos demais réus.
Ele começou essa parte do voto pelo crime de organização criminosa atribuído aos réus. Fux destacou que "a imputação do crime de organização criminosa exige mais do que a reunião de vários agentes para a prática de delitos, a pluralidade de agentes" e acrescentou que "a existência de um plano criminoso não basta para a caracterização do crime de organização criminosa."
Ele lembrou que, no julgamento do processo do Mensalão, em 2012, o plenário absolveu oito dos 25 condenados do crime de formação de quadrilha. Entre os absolvidos, estavam o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e o ex-presidente do PT José Genoíno, sob o argumento de que não teria havido a intenção da "prática indeterminada de uma série de crimes" – que segundo Fux seria uma das premissas para o crime de organização criminosa.
"Sempre que presente imputação de crimes a uma pluralidade de agentes e não esteja narrada a finalidade de praticar delitos indeterminados, bem como se não houver plano de praticar, de modo estável e permanente, crimes punidos com essa sanção, afasta a incidência do crime associativo autônomo".
Ele acrescentou que seria tampouco possível considerar que os réus incorreram no agravante de crime de organização criminosa com emprego de arma, argumentando que a denúncia não demonstrava o emprego efetivo de arma de fogo durante as atividades dos réus.
Fux diz que houve violação da ampla defesa
O ministro Luiz Fux acolheu também o argumento das defesas dos réus de que houve violação à garantia da ampla defesa no processo, considerando o volume de material apreendido e usado no processo e o tempo disponível para a sua análise pelos advogados.
Esse ponto foi ressaltado, por exemplo, pelo advogado de Bolsonaro, Celso Vilardi, durante sua sustentação oral, quando ele afirmou: "Com 34 anos, é a primeira vez que venho à tribuna, com toda humildade, para dizer o seguinte: não conheço a íntegra desse processo. O conjunto da prova? Eu não conheço. São bilhões de documentos. Numa instrução de menos de 15 dias, seguida de interrogatório. A instrução começou em maio, nós estamos em setembro. Quinze dias de prazo para a defesa".
Fux também disse ter tido "dificuldade para elaborar o voto" diante da amplitude do material. "Eu não sou um expert nesse assunto, mas a quantidade chega a 70 terabytes. Nem acreditei. São bilhões de páginas", afirmou Fux. "Foi nesse contexto que as defesas alegaram cerceamento de defesa, em razão dessa disponibilidade tardia que apelidei de um 'tsunami de dados'".
Ao final, ele acolheu a preliminar de violação à garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa, o que ensejaria a anulação do processo.
Fux vota por anular processo contra Bolsonaro no STF
O ministro Luiz Fux argumentou em seu voto que não cabe ao STF julgar Bolsonaro e os outros réus, pois eles já haviam perdido o foro privilegiado quando a ação penal foi iniciada.
"Compete ao STF principalmente a guarda da Constituição, cabendo-lhe processar e julgar originariamente nas infrações penais comuns o presidente da República, o vice-presidente da República, os membros do Congresso Nacional, seus próprios ministros e o PGR. O primeiro pressuposto que o ministro deve analisar antes de ingressar na denúncia ou petição inicial é verificar se ele é competente", afirmou Fux.
Em seguida, ele votou pela "incompetência absoluta" do STF para julgar o caso e pela declaração de nulidade de todos os atos praticados no processo.
A incompetência do Supremo para julgar o processo foi um dos argumentos levantados pelos advogados dos réus.
Fux afirma que não cabe ao STF "realizar juízo político"
O ministro Luiz Fux abriu seu voto fazendo uma defesa do distanciamento e da imparcialidade dos magistrados e afirmou que não compete à corte "realizar um juízo político".
"O juiz deve acompanhar a ação penal com distanciamento, não apenas por não dispor de competência investigativa ou acusatória, como também o seu necessário dever de imparcialidade", afirmou. "Aqui reside a maior responsabilidade da magistratura: condenar quando há certeza e, o mais importante, humildade para absolver quando houver dúvida."
"Não compete ao STF realizar um juízo político, conveniente ou inconveniente, apropriado ou inapropriado. A revés, compete a este tribunal afirmar o que é constitucional ou inconstitucional, legal ou ilegal", disse.
Ele pontuou também que o julgamento de ações penais pelo STF é reservado a hipóteses excepcionais.
"A Constituição da República, ao mesmo tempo que confere a este Supremo Tribunal Federal a posição de guardião da ordem constitucional, delimita de forma precisa e restrita as hipóteses que nos cabe atuar originariamente no processo penal", afirmou.
STF retoma julgamento de Bolsonaro com voto de Fux
A Primeira Turma do STF retomou o julgamento de Bolsonaro e de outros sete réus do núcleo crucial da trama golpista por tentativa de golpe e demais crimes denunciados.
Na sessão de terça-feira, votaram os ministros Alexandre de Moraes, relator do processo, e Flávio Dino. Ambos votaram por condenar todos os réus.
O primeiro a votar nesta quarta-feira é o ministro Luiz Fux, que indicou que deve abrir uma divergência.
[Coluna] Tarcísio e o Brasil condenado a andar em círculos
Em todos os países atualmente governados de forma autocrática ou ditatorial, a destruição da democracia começou com ataques ao Judiciário. Foi assim na Hungria, bem como na Turquia e na Venezuela. Hoje se assiste, praticamente ao vivo, nos Estados Unidos.
A tomada de poder por homens como Viktor Orbán, Recep Tayyip Erdogan, Nicolás Maduro e Donald Trump só foi possível porque atacaram juízes, ignoraram sentenças e, por fim, lotaram os tribunais com aliados. O Judiciário (assim como todo o aparato estatal) foi esvaziado e alinhado, e a separação de poderes – base fundamental da democracia – praticamente extinta.
Caso o governo do Brasil volte às mãos da extrema direita – seja sob Tarcísio de Freitas ou um membro do clã Bolsonaro –, o país corre o mesmo risco. O presságio ficou evidente após as manifestações bolsonaristas do último domingo. Leia mais
Dino vota pela condenação de Bolsonaro e demais réus, mas diverge sobre penas
O ministro Flávio Dino votou pela condenação de Jair Bolsonaro (PL) e os demais réus do núcleo crucial da trama golpista por tentativa de golpe e demais crimes denunciados.
Entretanto, ele defendeu que sejam aplicadas penas distintas para cada um dos réus.
Dino afirmou que as penas não podem ser iguais para todos os acusados, ressaltando que as responsabilidades dentro da organização criminosa foram diferentes.
O ministro defendeu que as penas para o general Heleno, Alexandre Ramagem e Paulo Sérgio Nogueira sejam menores porque, na avaliação dele, eles tiveram participação menor nos crimes.
Após Moraes, Dino inicia seu voto e rejeita possibilidade de anistia
Depois de uma curta pausa, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento de Bolsonaro e outros sete réus do núcleo principal no processo sobre tentativa de golpe de Estado.
Depois de o ministro Alexandre de Moraes pedir a condenação de todos réus, o ministro Flávio Dino, o segundo a votar, iniciou a leitura de seu voto.
Ele afirma que "esse julgamento não é um julgamento das Forças Armadas e disse que "não é normal que a cada 20 anos nós tenhamos eventos de tentativa ou de ruptura do tecido constitucional".
O ministro defendeu também que todas as instituições do Estado se mantenham "isentas e apartidárias".
Dino ressaltou, ainda, que crimes julgados são "insuscetíveis de anistia, de modo inequívoco".
"Esses crimes já foram declarados pelo plenário do Supremo Tribunal Federal como insuscetíveis de indulto, anistia, portanto, dessas condutas políticas de afastamento ou de extinção da punibilidade", afirmou Dino
Moraes vota por condenar Bolsonaro e outros sete réus por tentativa de golpe de Estado
O ministro Alexandre de Moraes votou na tarde desta terça-feira (09/09) para condenar o ex-presidenteJair Bolsonaro e outros sete réus por tentativa de golpe de Estado.
Relator do processo penal contra o principal núcleo crucial da trama golpista, Moraes foi o primeiro a votar no julgamento. Ainda faltam os votos de quatro outros ministros da turma – Flávio Dino, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin. O próximo a votar é Dino.
Na leitura do seu voto, Moraes concluiu que réus "praticaram todas as infrações penais imputadas pela Procuradoria-Geral da República".
Segundo ele, as investigações apontaram "não haver nenhuma dúvida de que houve tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito" liderada por Bolsonaro.
"Jair Bolsonaro exerceu o papel de líder da organização criminosa, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para implementação do projeto autoritário de poder", declarou Moraes.
A expectativa é de que o julgamento seja concluído até a próxima sexta-feira.
"Jair Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa"
"Jair Messias Bolsonaro exerceu a função de líder da estrutura criminosa e recebeu ampla contribuição de integrantes do governo federal e das Forças Armadas, utilizando-se da estrutura do Estado brasileiro para a implementação de seu projeto autoritário de poder, conforme fartamente demonstrado nos aulas", disse Moraes em seu voto.
"O que ocorreu em 8 de Janeiro foi a conclusão de um procedimento de tomada, de manutenção do poder, a qualquer custo, por um grupo político que, lamentavelmente, se transformou numa organização criminosa, disse Alexandre de Moraes em seu voto
Ainda segundo Moraes, a organização criminosa liderada por Bolsonaro permaneceu ativa de julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023. "A organização criminosa narrada na denúncia pela PGR realmente iniciou a prática das condutas criminosas, com atos executórios concretos e narrados anteriormente, desde meados de julho de 2021, e permaneceu atuante até 8 de janeiro de 2023."
Moraes: Não á crível achar que plano para matar Lula não foi discutido com Bolsonaro
O ministro Alexandre de Moraes citou no seu voto o chamado Plano Punhal Verde e Amarelo, que previa o assassinato de Lula, do seu vice Geraldo Alckmin e dele próprio, e disse que não achava razoável acreditar que ele não teria sido discutido com Bolsonaro.
Segundo a Polícia Federal, esse plano teria sido elaborado por alguns militares das Forças Especiais do Exército, conhecidos como kids pretos, para evitar a posse de Lula e Alckmin.
"A unidade de desígnios, a divisão de tarefas da organização criminosa hierarquizada perante a liderança de Jair Bolsonaro, resta fartamente comprovada nos autos. E mais, o general Mário Fernandes, que era o segundo do general [Luiz Eduardo] Ramos na secretaria de governo do Palácio do Planalto, imprime dia 9 de novembro o documento do Punhal Verde e Amarelo. Na mesma data, se dirige ao Palácio do Alvorada, para conversar com Jair Messias Bolsonaro", afirmou Moraes.
"Não é crível, não é razoável, achar que Mário Fernandes imprimiu no Palácio do Planalto, se dirigiu ao Palácio do Alvorada, onde lá estava o presidente, ficou uma hora e seis minutos e fez barquinho de papel, com a impressão do Punhal Verde e Amarelo. É ridicularizar a inteligência do tribunal", disse o ministro.
Moraes afirma que Brasil "quase" voltou a ter uma ditadura
O voto do ministro Alexandre de Moraes fez algumas referências ao risco de que um eventual golpe de Estado em 2022 poderia ter revivido experiências que o país teve durante a ditadura militar, que durou de 1964 a 1985.
"Não é possível normalizar. O Brasil demorou a atingir a sua democracia. Tivemos 20 anos de ditadura, de torturas, as pessoas sumiam, eram mortas. Não é possível banalizar esse retorno a esses momentos obscuros da história que já tivemos. E a prova é farta", afirmou.
Ele disse que o Brasil "quase" voltou a ter uma ditadura porque "uma organização criminosa, constituída por um grupo político, não sabe perder eleições. Porque uma organização criminosa, liderada por Jair Bolsonaro, não sabe que é um princípio democrático e republicano a alternância de poder".
Moraes em seguida frisou que, em uma democracia, quem perde vira oposição e disputa as próximas eleições. E quem ganha assume e tenta se manter nas eleições pelo voto popular. "Não tenta se manter utilizando órgãos do Estado. Não tenta se manter coagindo, ameaçando gravemente, deslegitimando o poder judiciário do seu país e a Justiça Eleitoral", disse. "Isso não é democracia, isso não é Estado Democrático de Direito."
Moraes cita método de Bolsonaro e aliados para difundir mentiras sobre as urnas
Durante a leitura do voto, Moraes fez diversas referências a tentativas de Bolsonaro e de seu entorno de questionar as urnas eletrônicas e de inflamar versões não comprovadas de que elas seriam suscetíveis a fraudes.
Ele lembrou, por exemplo, uma live realizada por Bolsonaro em 29 de julho de 2021, no início de seu mandato, "com graves ameaças e grande divulgação de desinformação sobre a Justiça Eleitoral".
Os argumentos do presidente, segundo o ministro, eram depois amplificados por uma rede organizada de divulgação. "Todas essas mentiras, criminosas, eram imediatamente massivamente disseminadas pelas milícias digitais", afirmou.
"Todos acompanharam o procedimento executório de deslegitimação de algo que sempre foi considerado um patrimônio nacional, um grande orgulho do Brasil, que são as urnas eletrônicas, a Justiça Eleitoral, as eleições livres e periódicas desde a redemocratização", disse Moraes.
Ele lembrou ainda como a Polícia Rodoviária Federal, no dia das eleições de 2022, fez bloqueios seletivos para fiscalizar veículos de passeio e ônibus especialmente na região Nordeste – onde o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva teve seu maior percentual de votos.
"Eu determinei que a PRF não estava autorizada a realizar essa operação específica que claramente já demonstrava o seu viés ilícito. (…) Mas, no dia, fez uma suposta operação para verificar a condição dos veículos. Nos acessos aos municípios onde um dos candidatos tinha tido mais votação, os veículos eram parados para verificar o pneu, o chassi, o banco", disse Moraes.
Moraes: Bolsonaro liderou organização para tentar golpe de Estado
O ministro Alexandre de Moraes apresentou na leitura de seu voto um organograma no qual aponta o ex-presidente Jair Bolsonaro como "líder" de uma organização criminosa para tentar dar um golpe de Estado em 2022.
"Sobre a liderança de Jair Messias Bolsonaro, é de se verificar que, durante o período de julho de 2021 até 8 de janeiro de 2023, essa organização criminosa, com divisão de tarefas de forma permanente e hierarquizada, o que caracteriza o crime de organização criminosa, praticou vários atos executórios", afirmou.
Moraes relembra ataques de Bolsonaro nos atos de 7 de Setembro de 2021
Em seu voto, Moraes fez diversas referências à participação de Bolsonaro em atos de 7 de Setembro de 2021.
Na ocasião, durante a pandemia de covid-19, o então presidente fez referências em tom de ameaça ao Supremo Tribunal Federal e disse que iria descumprir ordens judiciais.
Bolsonaro afirmou naquele dia: "Dizer a vocês, que qualquer decisão do senhor Alexandre de Moraes, esse presidente não mais cumprirá. A paciência do nosso povo já se esgotou, ele tem tempo ainda de pedir o seu boné e ir cuidar da sua vida. Ele, para nós, não existe mais."
"Ou esse ministro [Moraes] se enquadra ou ele pede para sair", disse. "Sai, Alexandre de Moraes. Deixa de ser canalha. Deixa de oprimir o povo brasileiro, deixe de censurar o seu povo."
Para Moraes, essas declarações provocaram uma "grande crise institucional" e instigaram "milhares de pessoas presentes contra o poder judiciário, contra o Supremo Tribunal Federal, contra os seus ministros".