O ministro Luiz Fux, que integra a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), advertiu nesta quarta-feira (10) contra um julgamento “político” de Jair Bolsonaro e votou pela absolvição do ex-presidente na trama golpista, o que deixa o placar em 2 a 1 para uma condenação.
Para o réu que seja absolvido ou condenado, é necessária uma maioria simples de três de cinco votos.
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é acusado, juntamente com outros sete ex-colaboradores, de ter conspirado para se manter no poder em 2022, após perder as eleições para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Aos 70 anos e atualmente em prisão domiciliar, Bolsonaro pode ser condenado a uma pena de mais de 40 anos de prisão.
Fux foi o terceiro dos cinco ministros da Primeira Turma a votar durante as audiências do Supremo, que estão previstas até a próxima sexta-feira e são transmitidas ao vivo para todo o país.
A leitura do voto do ministro durou mais de 13 horas.
Fux se pronunciou pela absolvição do ex-presidente e de outros cinco acusados.
Mas condenou o ex-candidato a vice de Bolsonaro, o general Walter Braga Netto, e o ex-ajudante de ordens do ex-presidente e delator no julgamento, o tenente-coronel Mauro Cid, por tentativa de abolição do Estado democrático de direito.
Com isso, já há maioria na Primeira Turma do STF para condenar os dois.
Fux mostrou claras divergências desde o princípio, quando assegurou que “não compete ao Supremo Tribunal Federal realizar um juízo político”.
O processo divide o país entre os que o consideram um exercício de defesa da democracia e os que alegam motivações partidárias.
– ‘Incompetência’ do tribunal –
Ao iniciar a exposição de seu voto, Fux defendeu a “incompetência absoluta” do STF para julgar um ex-presidente. Argumentou que o caso deveria ser examinado por uma instância judicial inferior.
Ele também assegurou que a Procuradoria-Geral da República (PGR) não provou que os acusados constituíram uma organização criminosa armada, já que não ficou demonstrado que alguma arma tivesse sido utilizada.
A trama golpista, disse, não passou da “seara preparatória”, e optou por absolver Bolsonaro das cinco acusações que lhe são atribuídas.
Com o voto de Fux, o campo bolsonarista vislumbrou um raio de esperança.
O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), filho mais velho do ex-presidente, pediu a “anulação total do processo” ao considerar que Fux colocou em evidência a “perseguição política” contra seu pai.
– ‘Ditadura’ –
Anteriormente, dois ministros votaram pela condenação, entre eles o relator do caso Alexandre de Moraes, alvo de um suposto plano de assassinato que, segundo a PGR, fazia parte da trama golpista.
Para Moraes, o ex-presidente teria chefiado uma organização criminosa para dar um golpe de Estado, que não se concretizou por falta de apoio da cúpula militar.
“O Brasil quase volta a uma ditadura”, disse o ministro.
Embora decisão se dê por maioria simples, o veredicto só será formalmente adotado quando todos os ministros tiverem se pronunciado.
Depois, votarão por uma eventual pena, que pode chegar a 43 anos de prisão.
A sentença cabe recurso.
– Denúncia por ameaças –
O julgamento tensionou a relação entre as autoridades brasileiras e Washington.
O presidente americano, Donald Trump, impôs tarifas punitivas de 50% a produtos brasileiros, sob o argumento de que existe uma “caça às bruxas” contra Bolsonaro, seu aliado.
Seu governo também aplicou sanções contra altos funcionários, incluindo Moraes.
“Alguém imagina que um cartão de crédito ou o Mickey [Mouse] vão mudar um julgamento no Supremo?”, ironizou o segundo ministro a votar, Flávio Dino, ex-ministro da Justiça e Segurança Pública de Lula, em alusão aos Estados Unidos.
Nesta quarta, Dino apresentou uma denúncia à Polícia Federal por “ameaças”.
“São milhares de postagens em redes sociais, incentivando ataques letais aos ministros e seus familiares”, disse a assessoria do ministro em uma nota.
– ‘A população está de parabéns’ –
A sociedade brasileira, polarizada, acompanha com atenção a fase final do julgamento.
“Tivemos a ditadura militar na qual esses abusos dos Estados não foram punidos, como deveriam ser, e se agora vem, a população está de parabéns por ter uma Justiça que diz não à violência contra o Estado de direito”, disse nesta quarta-feira à AFP em Brasília Nayra Souza, uma professora, de 56 anos.
Os apoiadores de Bolsonaro, em contrapartida, defendem a aprovação de um projeto de anistia no Congresso.
A direita pressiona pelo perdão para centenas de bolsonaristas condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, que poderia incluir o ex-presidente.
A PGR afirma que Bolsonaro incentivou estes atos como um último recurso para se manter no poder.
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