A China vai disputar na França a partir de junho sua sétima Copa do Mundo feminina de futebol (de oito edições), um sucesso que pode provocar inveja na seleção masculina, mas apesar de ser o país mais populoso do mundo, o futebol feminino não decolou no gigante asiático.

“A China tem muita gente, mas não são muitos que jogam futebol”, lamenta Qian Hui, considerada a grande promotora deste esporte entre as meninas em Xangai.

“As pessoas que selecionamos para a equipe não são necessariamente as melhores, porque as melhores muitas vezes não querem ser selecionadas. Isso nos cria problemas”, garante Qian enquanto supervisiona o treino na Jinshajiang Road Elementary School, centro especializado no futebol feminino.

Entre as cerca de cem meninas que treinam ali, com idades que vão dos 7 aos 18 anos, está Liu Chang, uma habilidosa ponta-esquerda de 11 anos e que é levada escondida por seu pai quando sua avó, que desaprova que a menina jogue futebol, não está por perto.

Elas treinam cinco vezes por semana e as partidas são disputadas aos sábados.

Hui explica que a jovem Liu começou a jogar por desejo de seu pai, um fanático por futebol que sonhava ser jogador, algo que nunca conseguiu.

Sem filho homem, a responsabilidade caiu sobre Liu.

“No início eu não queria jogar, mas meu pai me mandou aqui”, diz ela. “Minha avó costuma dizer que as meninas não devem jogar futebol, mas fazer dança ou tocar piano”. acrescenta.

– Atividade menosprezada –

O presidente chinês Xi Jinping, notório fã de futebol, depositou muitas esperanças no futebol chinês e tem até a ambição de ganhar a Copa do Mundo.

Atual 16ª colocada no ranking da Fifa, a seleção feminina tem mais chances de conquistar o troféu do que a masculina, que ocupa apenas a 74ª posição do ranking e que só jogou o Mundial uma vez, em 2002, quando foi eliminada na primeira fase sem conseguir nenhuma vitória e nem sequer marcar um único gol.

Mas o futebol feminino recebe pouca atenção no gigante asiático.

Em contraste com as grandes multidões e os fanáticos que acompanham os clubes da Super Liga Chinesa, o campeonato de mulheres recebe publicidade escassa e pouca gente comparece aos estádios para assistir às partidas.

Qian pinta um panorama sombrio do desempenho do futebol feminino, garantindo que muitas vezes os pais temem que a atividade esportiva prejudique os estudos de suas filhas.

Muitas outras pessoas, como a avó de Liu, consideram simplesmente que o futebol não é um esporte para meninas ou, pior ainda, que o jogo ao ar livre pode escurecer a pele, algo que normalmente está relacionado a atividades pouco estimadas socialmente, como a agricultura e os trabalhos manuais.

“O menosprezo contrasta com os bons resultados do futebol feminino”, diz Qian, de 50 anos e uma segunda mãe para as jogadoras.

Apesar dos melhores resultados da seleção feminina, que incluem oito Copas da Ásia (um torneio que a equipe masculina nunca ganhou), o dinheiro que move o futebol feminino não tem nada a ver com o dos homens.

“Elas dormiram no chão e pegaram trens noturnos para ir jogar”, denuncia Qian, que entre suas ‘alunas’ estão as jogadoras da seleção chinesa Zhao Lina e Yang Lina.

“É impensável que a equipe masculina tenha um tratamento igual”, acrescenta Qian.

“Talvez se ganharmos o Mundial feminino prestem mais atenção”, diz ela.

– Redes furadas –

A jovem Liu e suas companheiras chutam e marcam gols em redes furadas, e com isso as jogadoras costumam ir buscar as bolas em arbustos.

Mas tudo é muito melhor do que em 1999, o ano em que a China perdeu nos pênaltis a final da Copa do Mundo disputada contra os Estados Unidos, quando os atuais campos de grama sintética eram terrenos de terra.

Qian tenta de tudo para que as meninas e seus pais se mostrem mais interessadas no futebol, e que permitam a elas que durmam na escola para assim poderem estudar durante o tempo livre.

A responsável considera que exigir perfeição das jovens, como se costuma fazer no esporte chinês, não faz sentido, porque assim elas não se divertem e não conseguem tomar decisões por si mesmas no campo.

Quartas colocadas no Mundial de 1995 e vice-campeãs em 1999, as chinesas perderam terreno nos últimos anos em relação a outros países como Estados Unidos, Alemanha, Inglaterra e França, organizadora da Copa de 2019.

Mas Qian considera que a nova norma da Fifa que obriga as equipes profissionais masculinas a ter um time feminino “pode ajudar muito”.

No entanto, ela adverte: “Temos que aprender” com os países de ponta. “Não estamos só um ano ou dois atrás deles. E por isso não vamos conseguir alcançá-los em apenas um ou dois anos”.

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