O caso de Jacob Blake, um cidadão negro alvejado por sete tiros à queima-roupa por um policial branco, reacendeu a fúria contra o racismo nos Estados Unidos, com novos protestos na noite de quarta-feira (26) e um boicote dos jogadores da NBA.

Uma calmaria precária reinou na manhã desta quinta-feira (27) em Kenosha, Wisconsin, norte do país, onde são esperados reforços federais de policiais e soldados da Guarda Nacional, depois que confrontos entre manifestantes e grupos de autodefesa deixaram dois mortos e um gravemente ferido na noite de terça-feira.

Um adolescente de 17 anos, que publicava várias mensagens de apoio à polícia nas redes sociais e exibia sua adoração às armas, foi preso na quarta-feira e acusado pelos assassinatos. Ele é suspeito de abrir fogo contra manifestantes com um rifle de assalto.

A cidade de Kenosha tem sido palco de manifestações com confrontos desde domingo, quando um policial branco disparou sete vezes nas costas de um homem negro de 29 anos, Jacob Blake, diante dos olhos de seus três filhos. Segundo seu advogado, Blake sobreviveu mas corre o risco de ficar paralítico.

Na quarta-feira à noite, centenas de pessoas voltaram a desafiar o toque de recolher imposto pelas autoridades para prestar homenagem às duas vítimas de terça-feira, mas contiveram sua raiva.

“Todo mundo está esperando que saíamos furiosos, que enlouqueceremos pela quarta noite, mas estamos fazendo um protesto pacífico como supõe-se que devemos fazer”, disse à AFP Big Homie Trail, um músico que participou do protesto.

A noite foi mais caótica em Oakland, Califórnia, onde um tribunal foi atacado; e em Minneapolis, Minnesota, onde cerca de 20 comércios foram saqueados e vandalizados em meio a um rumor infundado de um novo ato de violência policial.

Essa cidade está à flor da pele desde 25 de maio, quando George Floyd, um afroamericano de 46 anos, morreu asfixiado por um policial branco durante sua prisão. Essa morte violenta desencadeou uma onda de protestos a favor dos direitos civis sem precedentes em décadas.

– Boicotes no mundo do esporte –

O movimento havia diminuído nas últimas semanas, mas o caso de Jacob Blake reabriu as feridas.

O Departamento de Justiça anunciou, na quarta-feira à noite, que vai abrir uma investigação por possível violação dos direitos civis contra o agente Rusten Sheskey, que atirou em Blake.

Até o momento, Sheskey está demitido mas não foi preso, muito menos acusado.

As imagens dos disparos contra Blake provocaram uma mobilização inédita no mundo do esporte, iniciada pela equipe de basquete Milwaukee Bucks. Seus jogadores boicotearam uma partida e obrigaram a NBA a adiar vários outros jogos na quarta-feira.

A iniciativa se espalhou pelo campeonato.

“Exigimos uma mudança. Estamos fartos disso”, escreveu no Twitter a estrela dos Los Angeles Lakers, LeBron James, pouco depois da decisão dos Bucks.

Segundo vários meios, Lakers e Los Angeles Clippers votaram a favor de abandonar a temporada da NBA.

Do outro lado, a tenista japonesa Naomi Osaka anunciou na quarta-feira que não jogaria a semifinal do torneio de Cincinnati, prevista para esta quinta.

“Antes de ser atleta, sou uma mulher negra. E como mulher negra, sinto que há assuntos muito mais importantes que precisam de atenção imediata, antes de me assistir jogar tênis”, afirmou Osaka, de 22 anos.

Após a decisão da jogadora, o torneio decidiu adiar as semifinais para sexta-feira. Osaka anunciou que jogará nesse dia.

No mesmo caminho, várias partidas de beisebol e futebol também foram adiadas.

– “Lei e ordem” –

O governo de Donald Trump preferiu centrar seu discurso na violência cometida à margem das manifestações.

No terceiro dia da convenção republicana, o vice-presidente Mike Pence pintou um panorama sombrio de uma eleição na qual “a lei e a ordem estão em jogo”.

Donald Trump confia neste slogan para ganhar um segundo mandato em 3 de novembro. “Não vamos tolerar saques, incêndios, violência e anarquia nas ruas dos EUA”, tuitou ele na quarta-feira, sem dizer uma palavra sobre Jacob Blake ou as vítimas da violência no protesto.

O presidente está previsto para fazer o discurso de aceitação de sua candidatura pelo Partido Republicano hoje à noite na Casa Branca.

Também estão previstos protestos em Washington, onde se espera igualmente que dezenas de milhares de pessoas participem na sexta-feira em uma manifestação pela igualdade no 57o aniversário do discurso histórico do líder dos direitos civis, Martin Luther King Jr.

A campanha de Trump classifica os protestos contra a brutalidade policial que abalam o país desde a morte de Floyd como uma ameaça da extrema esquerda. Na quarta-feira, seu rival democrata, Joe Biden, pediu pelo fim da violência.