15/06/2019 - 10:33
O diretor italiano Franco Zeffirelli, que faleceu neste sábado (15) aos 96 anos, foi o ícone de um cinema estético estudado com seu mestre Luchino Visconti e inspirado em obras-primas da literatura inglesa e de grandes óperas.
Seu mais conhecido filme, “Romeu e Julieta” (1968), é uma adaptação de Shakespeare, assim como “Hamlet” (1992, estrelado por Mel Gibson e Glenn Close) e “A Megera Domada” (1967, com Elizabeth Taylor e Richard Burton), uma lealdade que lhe valeu em 2004 o título de “Sir” na Inglaterra.
Ele também dirigiu mais de trinta peças e óperas até 2012.
Este gosto pelo teatro e pela ópera pode ser devido a uma infância incomum.
Ele nasceu em Florença em 12 de fevereiro de 1923, de um caso adúltero entre uma estilista e um comerciante de seda e lã.
Rejeitado por ambas as famílias, herdou o nome de uma ópera de Mozart e imaginado por uma prima de seu pai, que assumiu seus cuidados após a morte de sua mãe quando ainda era criança.
Muito jovem, Franco Zeffirelli conheceu o teatro durante férias de verão e aos nove anos foi seduzido pela ópera ao assistir “Valquíria” de Wagner em Florença.
Aos 13 anos, começou a montar espetáculos em paróquia, e foi fazendo aulas com Mary O’Neill, secretária particular de seu pai, que passou a apreciar os clássicos da literatura inglesa.
Graduado em arquitetura, começou como um decorador de teatro e cinema, para então se tornar ator. Seu encontro com o diretor Luchino Visconti selou o seu destino: tornou-se seu protegido e depois seu amante. Ao seu lado, trabalhou na realização de “La Terra Trema” (1948), “Bellissima” (1951) e “Senso” (1954).
Sua relação com Visconti era explosiva e terminou de forma brutal, que Zeffirelli descreveu como muito dolorosa, mas que lançou definitivamente sua carreira artística.
– Católico, homossexual e senador –
“Luchino revelou-me o campo da criação, no palco e na tela. E ele me mostrou como conceber um projeto e dar-lhe uma estrutura para o ambiente cultural correspondente”, revelou.
No final dos anos 50, Zeffirelli começou sua carreira como diretor de ópera no Scala de Milão e no Metropolitan de Nova York. Dirigiu Maria Callas em “La Traviata” em Dallas em 1959 e “Tosca” em Londres em 1964.
No cinema, adaptou “La Traviata” (1982) e “Otello” (1986) de Verdi.
Realizou seu primeiro longa-metragem, “Camping”, em 1958 e o seu maior sucesso 10 anos depois com “Romeu e Julieta”, que recebeu quatro indicações ao Oscar, incluindo de Melhor Diretor e Melhor Filme.
No palco, como na tela, Franco Zeffirelli presta especial atenção aos figurinos e cenários, o que fez o crítico Henry Chapier dizer que ele era o único “capaz de criar no cinema o equivalente aos afrescos da Renascença”.
Na década de 1970, este católico convicto dirigiu dois filmes de inspiração religiosa: “Francisco e o Caminho do Sol”, sobre São Francisco de Assis, e a minissérie “Jesus de Nazaré”.
Suas convicções religiosas o levaram a lançar uma campanha contra “A Última Tentação de Cristo”, de Martin Scorsese, apresentada em Veneza ao mesmo tempo que seu “Toscanini” em 1988, antes de voltar atrás.
Ele também se destacou ao se opor a projetos de reconhecimento dos casais homossexuais e ser um dos poucos artistas italianos a apoiar Silvio Berlusconi quando o bilionário entrou para a política no início dos anos 1990.
Foi senador na lista do magnata dos meios de comunicação de 1994 a 2001.
Depois de vários anos, retornou aos sets com “Jane Eyre – Encontro com o Amor”, adaptado do romance de Jane Austen (1996, com Charlotte Gainsbourg), “Chá com Mussolini” (2001), antes de casar suas paixões pelo cinema e pela ópera em “Callas Forever”, onde Fanny Ardant interpretou a cantora icônica.
Perto de completar 100 anos, o diretor italiano reconheceu em março de 2019, em entrevista ao Corriere della Sera, o peso dos anos. “A velhice é um fardo enorme, mas ainda estou procurando ideias a realizar (…) e isso me mantém ocupado”.
Ele também confessou ter dois arrependimentos em sua vida como cineasta: “um filme sobre o Inferno de Dante”, impossível de produzir por causa do custo de efeitos especiais, e “um grande afresco sobre a vida e obra dos Medici, sobre a beleza precisamente”.