Sempre que a Igreja Católica precisa colocar ordem na casa, acertar as finanças, punir abusos e conquistar mais fiéis, ela chama um jesuíta para administrá-la – e isso se dá desde a formação da Companhia de Jesus na metade do século XVI. Não foi diferente em 2013, quando o cardeal Jorge Mario Bergoglio tornou-se o pontífice Francisco. Ele acabou com a roubalheira no Banco do Vaticano, expulsou religiosos pedófilos e fez crescer o número de seguidores do catolicismo. Será que Francisco considera encerrada a sua missão jesuítica? Diante de um quadro de saúde que visivelmente deixa-o combalido aos 85 anos de idade, com alto comprometimento das funções motoras, é inevitável que ganhem corpo, na intimidade do Vaticano, sussurros sobre uma eventual renúncia de sua parte. Há quem diga que a hipótese não deve ser descartada, há quem defenda o contrário. “Roma é uma fonte permanente de boatos”, diz Marcelo Perine, filósofo da PUC-São Paulo. “Foi na capital italiana que essa história começou”. E o próprio Francisco, com seu saudável humor, ironiza: “se eu estivesse doente, deveria ser o primeiro a estar informado, mas os médicos não me disseram nada”.

Existe outra origem para a teoria da renúncia, essa se desenrolando, sobretudo, no campo da tradição papal. Retroceda-se no tempo, e tem-se que, em 1294, o Papa Celestino V visitou a pequena cidade de L’Aquila, lá meditou e renunciou. O tempo passa, papas se sucedem, o lugarejo medieval L’Aquila permanece inabalável. Em 2009, o então Papa Bento XVI, em meio à crise de desorganização da Igreja, também vai a L’Aquila. Justo ele, que fora tão temido em seu conservadorismo enquanto cardeal Joseph Ratzinger, vê agora em seu papado as coisas lhe saírem do controle. Em L’Aquila, ele ora, E L’Aquila, ele medita – e renuncia. O que tem tudo isso a ver com Francisco?

Recentemente Francisco nomeou novos vinte e um cardeais (entre eles, dois são brasileiros) e agendou para o mês que vem o Consistório Cardinalício que oficialmente os elegerá. O mistério apenas aumentou. Justamente durante a posse dos novos cardeais, Francisco viajará, como o fizera Celestino V e Bento XVI, para a mesma L’Aquila. E vai com igual desejo de oração e meditação.

Moacyr Lopes Junior

O legado de dom Cláudio

O cardeal Cláudio Hummes, arcebispo emérito de São Paulo, falecido na segunda-feira 4, deixa um legado de defesa dos Direitos Humanos e de intransigente defesa da Amazônia e dos territórios indígenas. Na década de 1970, quando era bispo, desafiou a ditadura militar e abriu as portas da diocese de Santo André a operários grevistas que eram perseguidos pelo regime. Não foi presidente da Conferência Eclesial da Amazônia devido à saúde debilitada. Dom Claudio também se destacou no Vaticano como prefeito da Congregação para o Clero. Sua presença foi decisiva tanto para Jorge Bergoglio se tornar papa quanto na forma como ele conduz a igreja e, ainda, na escolha do nome Francisco.