As manifestações de 2013 são um marco na política brasileira. Inicialmente voltadas à manutenção das tarifas do transporte público, revelaram-se um caldeirão de protestos e pretensões sociais das mais distintas naturezas e formas. Passaram pela Copa do Mundo no Brasil, pelas Olimpíadas no Rio de Janeiro e chegaram até o impeachment da ex-presidente Dilma. Havia muita energia. No entanto, nem sempre era possível notar objetividade. Pautas diversas se misturavam num mesmo protesto, dificultando a compreensão do real significado de tudo aquilo. Na ausência de líderes políticos, heróis foram buscados. O combate à corrupção foi palco para a mitificação de servidores públicos, assim como, no extremo oposto, de corruptos que se tornaram vítimas numa narrativa de conspiração e injustiça.

Gostem ou não, a divisão da sociedade em “nós x eles” iniciada pelo populismo demagógico que negava a corrupção e sustentava o golpe, aprofundou-se através da dualidade “bandidos e mocinhos”, sendo estes últimos os representantes do Estado que, também atuando com os olhos voltados ao palco político, prendiam, denunciavam e condenavam velhos conhecidos da política e do empresariado. Nessa lógica simplista, cumprir a lei podia ser ilegal, assim como ir além da lei era justificável pelo fim buscado. A pauta foi tomada pelos sentimentos de injustiça e vingança. Não mais importava o que era dito, mas sim quem dizia.

Grande parcela da população deixou o fígado de lado para votar de forma mais racional. E, assim, os extremos foram derrotados

A eleição presidencial de 2018 foi fruto dessa dualidade. Os que eram capazes de construir consensos, podendo se unir numa candidatura responsável e moderada preferiram candidatos próprios. O lucro dessa estratégia ficou para os extremos no conhecido duelo Bolsonaro x Haddad. Nada mais representativo do “nós x eles”. Um embate que não abria espaço a qualquer identidade. Era dissenso puro. Pólos da política, fortalecidos pelo desencontro ou mesmo pelo capricho dos moderados.

O pleito municipal de 2020 parece demonstrar e propiciar nova realidade política. Ainda que as eleições municipais não tenham relação direta com a presidencial, o resultado das urnas indica, ao menos por ora, a rejeição daquilo que tomou conta da sociedade em 2018. Aparentemente, grande parcela da população deixou o fígado de lado para votar de forma mais racional. No geral, as campanhas foram equilibradas. A trajetória dos candidatos foi decisiva. Experiência, competência e responsabilidade foram valorizadas. Os extremos perderam como candidatos e como apoiadores. Que a moderação seja o grande legado para 2022!