À medida que o século 21 avança, as mudanças climáticas se tornam menos teóricas e mais reais. As taxas astronomicamente altas de emissões de gases do efeito estufa na era pós-industrial começaram a atingir a humanidade, já que as consequências iniciais dessas ações estão vindo à tona, com o receio de que o pior esteja a caminho.

O manto espesso de gases que envolve o planeta Terra – principalmente de dióxido de carbono, que de acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, 76% das emissões de gases de efeito estufa vêm na forma de CO2 – é a principal causa do aquecimento global.

Se nada for feito, impactos climáticos como derretimento das calotas polares, aumento do nível do mar, incêndios florestais, ondas de calor sufocantes e fortalecimento dos sistemas de tempestades tropicais tendem a se intensificar.

Vulnerabilidade das florestas terrestres

Os recentes incêndios na Amazônia mostraram a fragilidade dos sistemas naturais de uma floresta de superfície terrestre que, além de sofre os efeitos das mudanças climáticas, também é refém da disparada do desmatamento para o êxito do agronegócio e do déficit de fiscalização.

Não é novidade que os milhões de quilômetros quadrados da área reconhecida como “pulmão do mundo” desempenharam um papel vital na remoção do dióxido de carbono do ar, com a filtragem natural.

Portanto, cultivar – e manter em equilíbrio – florestas que absorvam as emissões de carbono seria uma das grandes soluções para o aquecimento global, mas elas teriam que ser à prova de fogo e se formarem a tempo de salvar o planeta. E a resposta para isso existe: as florestas de algas marinhas podem ser cultivadas submersas.

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O papel das algas marinhas

Uma das características mais inspiradoras das algas é que elas podem crescer entre 10 e 100 vezes mais rápido do que as plantas terrestres. Em vista desta taxa de crescimento rápida – combinada com o fato de que podem prosperar em qualquer lugar, nas condições adequadas – o cultivo de algas marinhas pode fornecer uma gama de soluções para alguns dos problemas mais urgentes do mundo.

Neste contexto, à medida que as florestas tropicais são dizimadas e outros sumidouros de carbono cruciais se extinguem, os cientistas estão estudando o potencial das algas e macroalgas para conter as mudanças climáticas. Na verdade, as florestas oceânicas de algas seriam a forma natural mais eficaz de capturar dióxido de carbono da atmosfera.

Atualmente, as algas são cultivadas em pequena escala para serem usadas como alimento, como biocombustível, em produtos de beleza, medicamentos, entre outros. De fato, estes organismos fotossintetizantes têm chamado a atenção de diversos segmentos da indústria pela sua riqueza de nutrientes – apenas para citar um exemplo, a chlorella (microalga), considerada um ‘superalimento do futuro’, é riquíssima em diversas vitaminas, minerais e compostos bioativos, é já pode ser encontrada na forma de suplemento vitamínico.

Créditos de “carbono azul” para as florestas de algas gigantes

Halley Froehlich, bióloga marinha e cientista da Universidade da Califórnia, em Santa Bárbara (EUA), é a autora de um estudo que quantifica a capacidade global do cultivo de algas gigantes em grande escala para compensar as emissões de carbono da Terra.

O processo envolveria o cultivo de algas marinhas e sua colheita com o objetivo de afundar as algas nas profundezas do oceano, onde o CO2 armazenado em seus tecidos permaneceria “enterrado”.

As macroalgas, que formam as famosas “kelp forests” da Califórnia, seriam suficientes para compensar o carbono produzido por todo o setor agrícola do estado, se cultivadas em uma área de apenas 3,8% das águas do Pacífico (uma zona marinha que não se estende mais do que 320 quilômetros da Costa Oeste), de acordo com a pesquisa publicada na revista de ciência e tecnologia ‘The Current Biology’, em 2019.

Segundo Froehlich e os coautores Jamie Afferbach, Melanie Frazier e Benjamin Halpern, do National Center for Ecological Analysis and Synthesis, que sintetizaram diversos conjuntos de dados da literatura científica, existe uma área adequada substancial nos oceanos – cerca de 48 milhões de quilômetros quadrados – em que algas marinhas poderiam ser cultivadas, e uma proporção de 0,001% seria suficiente para tornar neutra em carbono toda a indústria de aquicultura global, aponta o estudo.

O cultivo de algas marinhas para mitigação de gases de efeito estufa pode ter o maior potencial quando se trata de atingir as metas locais e regionais de neutralidade de carbono, concluiu a pesquisa. A Califórnia está particularmente bem preparada para colher os benefícios atenuantes da aquicultura de algas marinhas, dada a forte política de ação climática do estado e sua longa costa rica em nutrientes.

Apesar de uma longa linha costeira adequada para o cultivo de algas marinhas, os Estados Unidos quase não têm operações de aquicultura no mar. Espera-se que a China e outras nações asiáticas que produzem a maior parte das algas marinhas cultivadas no mundo assumam a liderança no estabelecimento de macroalgas como fonte de “carbono azul”.

Trabalho pioneiro de Alexandra Cousteau


Em outro campo – e mais recente – a Oceans 2050, cofundada por Alexandra Cousteau e Fritz Neumeyer, está concluindo um estudo em cerca de 20 fazendas, em cinco continentes, para estabelecer cientificamente que o cultivo de algas permite o soterramento de uma grande quantidade de carbono nos sedimentos subjacentes.

O projeto de algas marinhas que propõe uma solução para ajudar a enfrentar a crise climática, liderado pelo cientista-chefe da Oceans 2050, Professor Carlos Duarte, foi um dos oito vencedores do Prêmio Keeling Curve de 2021.

“Poderemos então construir um sistema de créditos de carbono que permitirá que grandes empresas invistam nesse tipo de fazenda”, disse a neta do famoso comandante Jacques-Yves Cousteau. Esta é a condição ‘sine qua non’ para o surgimento de um ecossistema completo, permitindo que este recurso cumpra finalmente a sua promessa inegável.

Além de promover a base científica para o “carbono azul”, o projeto visa contribuir para a restauração dos oceanos e criar acesso ao mercado e incentivos para catalisar essa solução. Apoiadores do estudo incluem ClimateWorks Foundation, Jeremy and Hannelore Grantham Environmental Trust e WWF.

A Ocean 2050, estabelecida em 2018, tem a missão de mobilizar uma aliança global para restaurar os oceanos até 2050, no período de uma geração humana. A plataforma identifica e desenvolve soluções que aproveitam o poder dos mercados para reformular uma estratégia oceânica adequada aos desafios atuais e futuros, produzindo impacto em uma escala significativa para os oceanos, o clima e milhões de pessoas que dependem deles.

O prêmio Keeling Curve – que leva o nome do gráfico que representa a concentração de dióxido de carbono na atmosfera da Terra desde 1958 – concede anualmente US $ 250.000 a projetos que demonstrem esforços comprovados de remoção, redução ou sequestro de carbono. Os meios incluem energia renovável, veículos elétricos, inovação com zero de carbono e energia eficiente. Também se concentra em organizações, como a Oceans 2050, que estão desenvolvendo maneiras de aumentar a absorção de carbono e reduzir os níveis atmosféricos de CO2.


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