Flávio Bolsonaro presidenciável empolga ala bolsonarista, mas gera incerteza política

Senador é visto como garantia ideológica em alternativa a Tarcísio de Freitas, por quem dirigentes do centrão ainda trabalham

Senador Flávio Bolsonaro visita o pai preso na Superintendência da PF, em Brasília
Senador Flávio Bolsonaro visita o pai preso na Superintendência da PF, em Brasília Foto: AFP

O apoio do bolsonarismo à pré-candidatura do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) à Presidência da República, anunciada na última sexta-feira, 5, reforça uma leitura do mundo político de que o campo de oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) irá às urnas fragmentado nas eleições de 2026.

Mais de 72 horas após o lançamento, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), declarou apoio a Flávio, mas acrescentou que outras lideranças “já colocaram seus nomes à disposição”, em sinal de que não haverá desistências com a entrada do filho mais velho de Jair Bolsonaro (PL) na corrida. Preferido do “centrão” para enfrentar Lula, Tarcísio se declara candidato à reeleição.

Ainda no campo dos possíveis herdeiros políticos do ex-presidente, os governadores de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e Romeu Zema (Novo), de Minas Gerais, mantiveram pública a intenção de concorrer ao Palácio do Planalto mesmo após o anúncio de Flávio.

Governadores aliados de Bolsonaro

Governadores participam de ato bolsonarista: candidatos ao espólio da direita em 2026 se acumulam

O mineiro se limitou a classificar a candidatura como “justa e democrática”. O goiano vai reforçar as ambições nacionais em propagandas do partido na televisão. Ambos defendem que a oposição tenha diversos postulantes no primeiro turno da próxima eleição.

O presidente do PSD, Gilberto Kassab, cita ainda seus governadores Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, e Ratinho Júnior, do Paraná, como presidenciáveis. Na raia da direita refratária a Bolsonaro, Renan Santos (Missão) também é pré-candidato.

Candidato ou moeda de troca

Para Marcelo Vitorino, professor de marketing político da ESPM-SP e responsável pelas campanhas de Kassab e do ex-prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (Republicanos), o cenário mais provável é de fragmentação e consequente favoritismo de Lula à reeleição.

“Há uma pulverização de candidaturas de direita e, do outro lado, uma unificação do campo da centro-esquerda. Com a pulverização extrema e alternativas que não despertam paixão [sem o ex-presidente], Lula tem chance até de vencer no primeiro turno“, afirmou à IstoÉ.

Felipe Soutello, estrategista da campanha presidencial de Simone Tebet (MDB) e idealizador da chapa Lula-Alckmin em 2022, ponderou que falta validação para Flávio. “É preciso ver se há uma estratégia da família [Bolsonaro] no sentido de forçar a pauta da anistia ou da redução de penas, um jogo para a plateia, ou se á uma candidatura para valer. O próprio senador gerou essa dúvida ao dizer que havia um preço a ser negociado“, disse à IstoÉ.

O “preço” ao qual Soutello se referiu foi anunciado por Flávio no domingo, 7. “Meu preço é justiça. Não é só justiça comigo, é justiça com quase 60 milhões de brasileiros que foram sequestrados, estão dentro de um cativeiro, nesse momento, junto com o presidente Jair Messias Bolsonaro. A única forma disso [desistência] acontecer é se Bolsonaro estiver livre, nas urnas“, disse à TV Record.

Na prática, a condição para que o senador deixe o páreo é que seu pai deixe a prisão como candidato. O ex-presidente está inelegível até 2060 e preso na superintendência da Polícia Federal, em Brasília, por tentar dar um golpe de Estado após a derrota nas urnas em 2022.

Para reverter a condição judicial, seu grupo político aposta no PL (Projeto de Lei) da Anistia, que revogaria as condenações dos golpistas e dos participantes da invasão às sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023.

Diante da resistência da esquerda ao centrão à ideia, o Congresso trabalha com o PL da Dosimetria, que reduziria penas de Bolsonaro e demais presos sem libertá-lo imediatamente ou devolver seus direitos políticos. “No meu relatório não consta anistia e nem vai constar. O que tem no meu relatório é uma redução de penas”, disse Paulinho da Força (Solidariedade-SP), relator do tema na Câmara, depois que Flávio impôs seu preço.

A leitura é de que, com um presidenciável, a família Bolsonaro ganha poder de barganha para negociar o apoio das bancadas de União Brasil, PP, PSD e Republicanos ao projeto mais amplo de anistia. Mesmo com ministérios no governo, as siglas sinalizam oposição a Lula em 2026 com preferência por um nome que não carregue o sobrenome do ex-presidente. A presença de Flávio é um obstáculo natural para os projetos de Zema, Caiado, Ratinho e mesmo Tarcísio.

Sem que a manobra tenha garantido resultado imediato, o senador se reuniu com os presidentes do PP, Ciro Nogueira, e do União Brasil, Antônio Rueda, na noite de segunda-feira, 8, e pediu apoio à empreitada presidencial. Ao jornal Folha de S. Paulo, mudou o discurso, disse que sua candidatura é “irreversível” e ainda se declarou “mais moderado” do que o pai.

Ciro Nogueira, ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro

Ciro Nogueira: senador articula apoio do bolsonarismo a Tarcísio

Entusiasta conhecido de Tarcísio, Nogueira havia dito que a decisão “não pode ser só do PL” e deve ser pautada pela viabilidade eleitoral. No levantamento mais recente do Datafolha, o senador teve 18% das intenções de voto contra 41% de Lula. Entre os opositores, quem ficou mais perto do petista foi o próprio Jair, com 29% contra os mesmos 41% do atual mandatário. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.

‘Bolsonarismo raiz’ se empolga

No grupo considerado mais fiel ao ex-presidente em Brasília, fato é que nenhuma candidatura havia empolgado tanto quanto a de Flávio até então. O deputado Júnio Amaral (PL-MG) disse à IstoÉ que não há qualquer insatisfação com o plano entre os aliados de “primeira hora” de Bolsonaro, sentimento que se restringe ao que classificou como “surfistas” do partido. “O presidente não tem perfil de fazer testes. Tenho certeza de que definiu o nome do Flávio para ir até o final“.

Questionado sobre o apoio dessa ala a outro nome, como o do governador de São Paulo, avaliou que o entusiasmo não seria o mesmo. “Faremos o que Bolsonaro direcionar, mas todos sabem que Tarcísio, por melhor gestor que seja, não tem empenho na batalha ideológica“.

“Flávio tem mais chances de vitória do que Jair tinha em dezembro de 2017. Essa insatisfação do centrão, como a declaração dada por Ciro Nogueira, é pela frustração de seus próprios planos”, concluiu Amaral.

O deputado Eros Biondini (PL-MG) disse que há apoio integral à empreitada de Flávio no partido e outras legendas “começam a entender” isso, mas atrelou a escolha ao PL da Anistia. “Ele tem total condição de articular nessa semana para que possamos votar a anistia. Queremos buscar aqueles que estão presos injustamente pelo 8 de janeiro antes do Natal”, disse à IstoÉ.