Não sabemos se isso foi um milagre, a ciência ou o quê. Todos os 13 Javalis Selvagens estão fora da caverna.” Com essa mensagem, publicada na página do Facebook dos navy seals tailandeses, o capítulo mais tenso da história do jovem time de futebol que ficou preso durante 18 dias em um complexo de cavernas no norte do país acabou com um final feliz. A luta de uma equipe de 90 mergulhadores, 50 deles de fora da Tailândia, ofuscou até as partidas da Copa do Mundo e deixou uma lição de solidariedade e união em prol de uma causa humanitária.

Divulgação

Vendo a imagem mais recente dos meninos, sentados em leitos de hospital e usando máscaras, é possível até esquecer das dificuldades envolvidas no resgate. Foram três dias de trabalho, em que mergulhadores precisaram, muitas vezes, remover seus tanques de oxigênio e levá-los nas mãos. Os túneis eram tão estreitos que os cilindros não podiam ficar nas costas. Um mergulhador tailandês, Saman Gunan, de 38 anos, morreu enquanto transportava tanques para outra parte da caverna. Aposentado da marinha, ele retornou para ajudar as equipes de resgate como voluntário. Foi uma atitude que vários tailandeses — e diversos estrangeiros — também tiveram. Pessoas do país inteiro largaram seus afazeres para aderir ao esforço coletivo. Quem não estava diretamente envolvido na operação dentro da caverna encontrou tarefas, como servir comida para todos que acampavam por ali.

Ye Aung Thu

Personalidades ofereceram ajuda. O inventor Elon Musk, dono da empresa de tecnologia Tesla, enviou engenheiros ao local e deixou uma espécie de cápsula submarina com as equipes. A engenhoca não serviu para nada e sua atitude levantou suspeitas de que ele só queria receber uma parte dos holofotes ­— uma crítica não tão justa, já que ele é reconhecido por suas iniciativas altruístas. Os garotos receberam até um convite da Fifa para assistir à final da Copa da Rússia. Não poderão participar da festa. Por enquanto, precisam cuidados especiais e ficarão no hospital.

Eles estão todos juntos em uma mesma ala e só podem ver os familiares através de um vidro, já que há risco de transmissão de doenças. Dois deles mostraram sinais de pneumonia. Todos foram vacinados contra enfermidades como leptospirose. Alguns ainda usam óculos escuros enquanto não se acostumam com a iluminação natural. A comida tailandesa, conhecida pelos temperos e pela picância, ainda está vetada. Os garotos têm se alimentado com mingau, pão e um pouco de chocolate. Há ainda uma preocupação com o estresse pós-traumático. Por isso, eles estão recebendo assistência psiquiátrica. Além da ajuda profissional, outro fator que pode dar força aos sobreviventes é a quantidade de convites e oportunidades que eles já receberam.

Futuro nos gramados

O Chiangrai United, clube da região que disputa a primeira divisão do campeonato tailandês, vai pagar os estudos dos 12 meninos, além de oferecer a oportunidade para que eles participem das categorias de base. Segundo o técnico da equipe, o brasileiro Alexandre Gama, há quatro anos na Tailândia, o dono do clube pretende ajudar até que os garotos cheguem à faculdade. “O clube vai dar suporte total e trazê-los para perto”, disse, em entrevistas a emissoras de rádios.

Além de convites para visitar times internacionais, os 12 meninos e o técnico poderão treinar em um dos principais clubes da Tailândia

Grandes times do mundo já convidaram os 12 meninos para conhecer de perto alguns dos maiores ídolos do esporte. Barcelona e Manchester United foram os primeiros, mas espera-se que outros façam o mesmo. Paul Pogba, jogador da seleção francesa, dedicou a vitória sobre a Bélgica aos “heróis do dia”, como se referiu aos tailandeses em seu Twitter. Os jogadores ingleses Kyle Walker e Jack Butland também disseram que vão enviar uniformes para todos. Até Ekapol Chanthawong, o treinador resgatado com os garotos, receberá uma oportunidade no Chiangrai United. Após abandonar o monastério para se dedicar aos treinos de futebol, usou sua experiência como monge para jejuar, oferecendo toda sua comida aos meninos, e os ensinou a meditar. Na carta que enviou enquanto ainda estava dentro da caverna, escreveu “Eu prometo cuidar das crianças da melhor maneira possível. Agradeço a todos pelo apoio, e quero me desculpar.” Muito criticado pela imprensa estrangeira por ter levado os garotos à caverna, ele é visto como espécie de salvador pelo povo tailandês. A população acha que sem ele o destino dos 12 garotos poderia ter sido muito diferente. Em uma das charges mais compartilhadas nas redes sociais da Tailândia, ele aparece em pose de meditação, segurando 12 filhotes de javalis.