A decisão da Meta – dona do Instagram e do Facebook – de pôr fim à checagem de fatos em suas empresas nos Estados Unidos pode reacender a discussão sobre o projeto que regulamenta as redes sociais no Brasil. O texto está travado na Câmara dos Deputados, mas parlamentares avaliam haver chances de novas discussões caso essa medida chegue ao país.
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Na terça-feira, 7, a Meta anunciou o fim do programa de fact-checking e deve substituir o sistema pelas Notas da Comunidade, semelhante ao praticado pelo X, em que os usuários apontam erros e inconsistências nas publicações. A medida, porém, preocupa, pois pode aumentar a disseminação de desinformação na plataforma.
Como justificativa, o CEO da companhia, Mark Zuckerberg, usou acusações de correções enviesadas da equipe de fact-checking. A decisão, por enquanto, deve impactar apenas os Estados Unidos.
O anúncio acendeu o alerta em deputados e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) para o andamento do PL das fake news, que regulamenta as redes sociais e coloca as big techs como responsáveis pelos conteúdos publicados pelos usuários. O projeto está em discussão há pelo menos quatro anos no Congresso Nacional, já foi aprovado pelo Senado, mas está na geladeira da Câmara, sem perspectiva de votação.
Primeiro relator da proposta na Casa, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) acha cedo cogitar a possibilidade de inclusão do tema na pauta neste ano. Com o recesso e as eleições para a Mesa Diretora, as discussões sobre os projetos devem ficar apenas para depois do Carnaval.
“No momento, estamos em recesso no Parlamento e haverá a eleição para as mesas das casas legislativas. É preciso aguardar essa conformação para avaliar como se dará o andamento deste e de outros projetos importantes para o país”, afirmou ao site IstoÉ.
A primeira proposta determinou o pagamento para as classes jornalística e artística, além de colocar um dispositivo que responsabiliza as empresas pelas publicações em caso de notificação judicial. Parlamentares, no entanto, ficaram de fora dessas regras e poderiam publicar sem qualquer restrição.
Mesmo com as mudanças, os parlamentares optaram por engavetar o projeto e criar um grupo de trabalho para a elaboração de um novo relatório. Os membros do GT chegaram a ser nomeados, entretanto, nenhuma reunião foi realizada em seis meses.
“A tramitação do projeto está paralisada, uma vez que o novo grupo de trabalho sobre o tema sequer foi formalizado ou se reuniu”, ressalta Orlando Silva.
Autor do projeto no Senado, Alessandro Vieira (MDB-SE) concorda com Orlando Silva e vê dificuldade de o texto sair da geladeira momentaneamente. O senador ainda creditou o atraso na aprovação à “baixa capacidade” de parlamentares em entender o contexto da regulamentação.
“A decisão da Meta não altera a tramitação do projeto, que parece irremediavelmente travado pelas dificuldades conhecidas”, afirma.
“O que afeta a tramitação deste ou qualquer outro projeto complexo é a baixa capacidade dos parlamentares para entender o problema e enfrentar a pressão midiática. Zuckerberg só está preocupado com o lucro das suas empresas, não com liberdade de expressão ou saúde mental.”
Outros deputados e senadores ouvidos pelo site IstoÉ veem apenas uma chance de o texto voltar à tona: uma pressão do governo ou uma ação enérgica do Supremo Tribunal Federal (STF).
Ronda nos bastidores que o STF monitora as mudanças do grupo Meta. Caso o fim do fact-checking chegue ao país, a Suprema Corte poderia tomar medidas mais duras, como fez com o X, pressionando o Congresso a agilizar o texto que regula as redes sociais.
Enquanto isso não acontece, os parlamentares garantem a estagnação do projeto, com olhos apenas para as eleições internas e para o pagamento de emendas parlamentares.
Críticas à decisão da Meta
Orlando Silva vê a decisão da Meta como uma forma de submissão ao presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump. O deputado avalia que a medida deve enfraquecer as discussões sobre moderação das redes e aumentar a propagação de notícias falsas na internet.
“A decisão da Meta é muito mais do que uma nova política de moderação. Representa alinhamento e submissão aos objetivos políticos do governo Trump e da extrema-direita em âmbito mundial”, afirmou.
“Ao que tudo indica, se de fato implantada, deve ampliar o alcance e o protagonismo das pautas da extrema-direita nas redes, como a disseminação de informações falsas, propagação de violência e extremismo político, além de conteúdos de ódio e preconceituosos”, opina o deputado.
Opinião que vai ao encontro da do senador Alessandro Vieira, que afirma ver uma despreocupação da Meta com a saúde mental dos usuários. O parlamentar apontou que a empresa não tem compromisso com a informação, visando apenas os lucros.
“A Meta nunca teve preocupação real com a qualidade da informação que circula nas redes, seu foco sempre foi maximizar lucros. Certamente, [a decisão] vai impactar o enfrentamento à difusão de notícias falsas”, ressaltou.