Um aplicativo do Snapchat chamado “My New Twin”, que, no Brasil, está sendo chamado de “filtro de galã”, viralizou no TikTok .

A ferramenta transforma qualquer pessoa, trazendo uma nova aparência, dita, mais “harmoniosa”.

No entanto, a brincadeira, aparentemente inofensiva, pode trazer transtornos psicológicos, segundo especialistas. Isso porque o usuário pode se tornar obsessivo por essa imagem irreal e buscar procedimentos para chegar num padrão de beleza,  que, muitas vezes, não é alcançável.

Há algum tempo, em uma entrevista, Rafael Portugal no explicou o que sentiu ao modificar a aparência por meio de filtros e aplicativos de edição de imagem.

Segundo o humorista, após as postagens, ele chegou a cogitar uma repaginada no visual.

“Recebi muitas cantadinhas, né? Senti na pele o que é ser um galã”, divertiu-se.

Cirurgia plástica é mania nacional

À IstoÉ, Wendell Uguetto, cirurgião plástico do Hospital Albert Einstein, especialista em cirurgia crânio-maxilo-facial, aproveitou para fazer um alerta sobre o tema.

O especialista destaca que o Brasil é o segundo país do mundo em cirurgia plástica, mas divide com os Estados Unidos essa liderança alternando posições.

“Isso demonstra que o brasileiro é muito focado na aparência. Os filtros antigos de dois ou três anos eram mais estáticos, mudavam algumas estruturas anatômicas, mas de uma fórmula calculada: um filtro modificava o formato da mandíbula, o outro empinava o nariz, e assim por diante. Agora com a melhoria da inteligência artificial, esta identifica o rosto, julga o que está fora do padrão e melhora especificamente essa parte que está em desarmonia. Com isso, qualquer pessoa ficará esteticamente muito mais agradável e atraente”, explica Wendell.

Frustração, ansiedade e depressão

“Todo paciente tem o direito de se sentir melhor, de se expor melhor. Esse é o lado bom, de você mostrar uma melhor face. O grande problema é quando isso gera uma insatisfação consigo mesmo, porque o filtro não é real, e você começa a se espelhar em algo irreal, gerando frustração, ansiedade e depressão pelo fato de não ser aquilo que você gostaria de ser”, destaca o médico, sobre a “incessante pela perfeição e busca pelas cirurgias plásticas”.

“A prova de que esses filtros influenciam a maneira que começamos a nos enxergar é que, a partir do momento que a gente teve a pandemia, ficando mais recluso em casa, usando muito mais computador e videochamadas, os procedimentos cirúrgicos e estéticos da face aumentaram absurdamente. Isso prova também que uma das principais causas é que você usa o filtro, que te embeleza e, consequentemente, chama a atenção para o que a pessoa não gosta no rosto”, continua ele.

De acordo com o profissional, quando, de fato, os procedimentos estéticos e as pequenas cirurgias melhoram a autoestima do paciente e fazem nexo, não “tem problema nenhum também o profissional indicar a cirurgia”.

“O problema é quando o paciente começa a procurar procedimentos, um atrás do outro. Existem alguns procedimentos que são praticamente impossíveis, há casos que não vamos conseguir resolver para o paciente, porque esses filtros vão mexer em parte óssea, na estrutura de todo o rosto, o que não conseguimos através de uma cirurgia plástica”, concluiu.

“O padrão é preocupante”

Para a psicóloga, psicopedagoga, mestre e doutora em Distúrbios do Desenvolvimento Gabriela Luxo os filtros que mudam o visual, a parte do rosto e da identidade fazem o usuário se encaixar em um padrão do que o outro quer que ela seja.

“Isso é preocupante. Se a pessoa já tem predisposição para ter depressão, ansiedade e dismorfia corporal (se olhar no espelho e não se enxergar da forma que vê), pensamentos negativos futuros, como “ninguém vai me querer”, “eu vou ficar sozinha”, “eu não sou boa suficiente para o outro”, “eu não tenho o corpo que o outro deseja”, podem surgir. Algumas pessoas vão desenvolvendo, então, quadros depressivos, por exemplo, por uma dificuldade de se mostrar para o mundo e sair de casa”, pontuou.

“O que é importante é as pessoas entenderem que elas podem ser quem elas são. Todos nós temos habilidades e dificuldades, pontos positivos e negativos”, finalizou a profissional.