Um filme inédito rodado em 1941 por um cineasta amador polonês no gueto judeu de Varsóvia foi exibido pela primeira vez na capital polonesa.

Até agora só eram conhecidos filmes rodados no gueto pela propaganda nazista.

Mas o cineasta polonês-canadense Eric Bednarski conseguiu, com seus pais, o valioso filme, que sua família conservou por mais de 70 anos.

Com 10 minutos de imagens em preto e branco, filmadas em 8mm, ele criou um documentário de 70 minutos com o título “Warszawa – miasto podzielone” (“Varsóvia – cidade dividida”).

Exibido no 16º Festival Docs Against Gravity, o filme conta a história do gueto.

Também aborda a irracional visão arquitetônica que os nazistas conceberam para Varsóvia e o que se tornou o local.

– Tráfico de alimentos –

“Vemos a vida cotidiana no coração do gueto, as multidões nas ruas, os edifício em ruínas, as crianças que traficam alimentos do lado ariano para o lado judeu, crianças desesperadas, que morrem de fome enquanto tentam obter comida através dos buracos no muro”, explica Bednarski.

Um ano depois da invasão da Polônia em setembro de 1939, os alemães criaram um bairro para os judeus na capital.

Quase 480.000 pessoas foram levadas para o gueto, onde sofreram com a fome e as doenças. Os nazistas deportaram 300.000 para as câmaras de gás do campo de concentração de Treblinka, a 80 km de Varsóvia.

Em 1941, Alfons Ziolkowski, que tinha 30 anos, cineasta amador e empresário antes da guerra, com um salvo-conduto, entrou no gueto para documentar a realidade e arriscar sua vida.

Naquele momento as cenas ainda estavam longe do terror dos últimos dias, quando os corpos ficavam empilhados nas ruas, às vésperas da liquidação do gueto em 1943.

A visão de um corpo em uma calçada enquanto pessoas vestidas de modo elegante caminham, no entanto, é um vislumbre do drama. As imagens mostram os muros construídos para dividir a cidade e os bondes em circulação.

Algumas imagens foram rodadas com a câmera oculta em um carro. Mas outras foram registradas ao ar livre, as pessoas olham diretamente para câmera e sabem que estão sendo filmadas, explicou Bednarski no Museu Judaico Polin, onde o filme foi exibido.

“Isto significa que Ziolkowski correu o o risco de sair do carro e filmou abertamente, expondo-se a ser visto pela polícia”, disse.

“Ele era um campeão de rali e sem dúvida estava acostumado ao risco. Talvez gostasse do risco”, acrescentou o diretor.

“Ao filmar, ele poderia ter sido preso pelos alemães e até mesmo fuzilado (…) A análise das imagens permitiu situar o filme na primavera de 1941. É possível reconhecer locais específicos e cruzamentos de ruas como Chlodna e Zelazna ou o edifício do tribunal da rua Leszno”.

Os poucos sobreviventes que assistiram o filme reconheceram os lugares, mas não as pessoas.

Bednarski, que começou a trabalhar no filme há 15 anos, quando saiu da Faculdade de Cinema, não conheceu Ziolkowski. Seus descendentes, que preferem permanecer no anonimato, não conseguiram responder todas as sua perguntas.