O jurista Ives Gandra Martins e a filha dele, Angela Gandra, que possui a mesma carreira, responderam nas redes sociais à menção feita a ele no “roteiro de golpe”, que a Polícia Federal (PF) encontrou no celular de Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL). Por meio de um vídeo bem-humorado, publicado no domingo, 18, Angela afirma que o único golpe que eles querem dar “é o da paz e do amor”.

Angela começa o vídeo dizendo que ela e seu pai estão gravando o vídeo para dar a “notícia do golpe”. “Nós dois somos super apaixonados pelo Estado Democrático de Direito. E o único golpe que eu quis dar e meu pai também é o golpe no coração das famílias, para fortalecer os vínculos. Um golpe de paz e de amor.”

“Agir e não reagir, levar as coisas boas e fazer como existe no céu: não há problemas de direito, porque só existe uma lei, a lei do amor. É o que nós procuramos praticar”, afirmou Ives Gandra. O vídeo encerra com um apelo de Angela. “Nada de golpe, tá?”, disse.

Como mostrou o Estadão, dentro do relatório da Polícia Federal sobre a perícia feita no celular de Mauro Cid, preso desde o dia 3 de maio, há vários indícios de uma trama golpista que vinha sendo arquitetada. Além do roteiro para um golpe, havia no aparelho um questionário que o jurista Ives Gandra respondeu em 2017 sobre a “garantia dos poderes constitucionais”.

A citação ao jurista usa a interpretação que ele faz sobre o artigo 142 da Constituição, que inaugura um capítulo sobre a competência das Forças Armadas. Ives Gandra é professor emérito de Direito Constitucional na Escola do Comando e Estado Maior do Exército há mais de três décadas.

No trecho em que o jurista é mencionado, o documento encontrado no celular de Mauro Cid diz que as teorias do professor autorizariam as Forças Armadas a atuar “pontualmente para restabelecer a harmonia constitucional”.

“A base do pensamento do doutrinador está na interpretação de que o art. 142 da Constituição assegura às Forças Armadas o papel de evitar abusos pelo Poder Judiciário”, diz o documento encontrado pela perícia da PF.

O artigo 142 não faz qualquer menção explícita à possibilidade de intervenção do Exército nos demais Poderes. O dispositivo, porém, passou a ser visto por apoiadores do ex-presidente como a grande brecha jurídica para justificar uma intervenção militar contra o Poder Judiciário.

O ponto do qual bolsonaristas partem para construir essa interpretação está no caput, que diz que uma das atribuições das Forças Armadas é a “garantia dos poderes constitucionais”. Os incisos e parágrafos do artigo detalham as patentes e algumas regras sobre a carreira militar.

Não é de hoje que Gandra vem alertando para “distorções” em suas interpretações. Ao Estadão, o jurista informou que as respostas foram dadas há seis anos, têm “caráter estritamente constitucional” e não “inspiram, influenciam ou instrumentalizam a realização de um golpe de Estado”.