Na próxima terça-feira, 8 de março, comemora-se o Dia Internacional da Mulher, instituído oficialmente pela ONU em 1975, mas cujas origens remontam a meados do século 19, quando movimentos femininos (alguns já feministas) tomaram as ruas dos EUA e da Europa exigindo melhores condições sociais para viver, garantia dos direitos civis e paridade salarial com os homens. Em Nova York, uma greve de tecelãs acabou criminosamente reprimida em 1857: cerca de 130 trabalhadoras viram-se trancadas em uma fábrica e morreram queimadas em mãos do aparato masculino do Estado, que lhes ateou fogo. Era 8 de março. Agora, no Brasil, no Dia Internacional da Mulher de 2022 pode-se festejar o aniversário de uma grande conquista feminina (o direito ao volto) e deve-se insistir em uma reivindicação (a plena representatividade política) que, muito em breve, com certeza também será alcançada.

GOVERNO PROVISÓRIO Getúlio Vargas (ao centro) com líderes da revolução de 1930: instrumentalização do voto feminino (Crédito:Divulgação)

Vamos, em primeiro lugar, à conquista: esse ano completaram-se nove décadas, no dia 24 de fevereiro, de instauração do voto feminino no País, juntamente com o primeiro Código Eleitoral. Consolidou-se uma vitória das mulheres, em 1932, porque a elas interessava votar, e foi também uma vitória do governo provisório de Getúlio Vargas que politicamente usou a situação contra oligarcas que pretendiam a manutenção da chamada República Velha, essencialmente agrária e com voto cem por cento de cabresto – Getúlio só se enganou ao julgar conservador o voto feminino porque, ao longo da história, tal voto tem-se mostrado bastante progressista. Deixe-se claro que Getúlio não criou o sufrágio universal: fez obrigatório o voto do homem e facultativo o da mulher que não possuísse renda. Como se obstaculizava para as mulheres o trabalho (emprego e maternidade eram incompatíveis, diziam os machistas de então), a maioria delas não foi às urnas, impedidas pelos maridos.

Se a mulher podia votar, então ela podia ser eleita, e a primeira a se eleger deputada federal à Assembleia Constituinte, de acordo com uma legislação nacional já agora existente – e, portanto, reconhecida pela também recém-criada Justiça Eleitoral -, foi a médica paulista Carlota Pereira de Queiroz, em 1933. É ela a pioneira em legalidade e legitimidade, mas a questão já vinha sendo discutida em diversas partes do País – e tais debates cresciam na medida em que aumentava o número de movimentos sociais. O Brasil seguia a tendência mundial, e essa tendência apontava que, inevitavelmente, se caminharia cada vez mais, e a passos largos, rumo à industrialização. Nasciam reivindicações políticas, e lideranças femininas se colocaram na vanguarda desse processo histórico – na Nova Zelândia, primeira nação a implantar o voto feminino, em 1893, elas tiveram papel decisivo.

Também no Brasil muitas mulheres assumiram a iniciativa da luta, e o Rio Grande do Norte ganhou destaque especial. Valendo-se de uma lei específica desse estado, Celina Guimarães Vianna elegeu-se deputada por Mossoró, em 1928 – os votos que recebeu acabaram sendo considerados “inapurados”. Um ano depois, Alzira Soriano tornou-se prefeita da cidade potiguar de Lajes e fez-se, assim, a primeira alcaide do Brasil. Para algumas estudiosas do tema, ela faz parte da história; para outras, está à margem dela. Mas, sem dúvida, Alzira é um fato sociológico que denota a paixão pela vida política do País. O voto e a elegibilidade da mulher, contudo, só valeram mesmo a partir de 1932.

As legendas valorizam mais os homens na destinação de recursos para as campanhas eleitorais, em detrimento das candidatas. Isso é machismo político

Vamos, agora, à reivindicação que deve persistir no Dia Internacional da Mulher, como proposto acima nesse artigo. Somente em 1965 o voto feminino ficou em pé de igualdade com o masculino. Por ironia do cambaio caminhar político brasileiro, já estávamos na ditadura militar, a mesma ditadura que três anos depois cassaria os mandatos de cinco das seis deputadas existentes, por meio do famigerado AI-5. De lá para cá, a mulher foi cada vez mais à luta pelo bem da democracia brasileira, mas ainda é baixa a sua representatividade política. O País possui 5.570 cidades e tem 652 prefeitas. Na Câmara, nas eleições de 2020, a bancada feminina passou de 51 a 77 parlamentares (de 10% para 15% do total de cadeiras). Há uma lei que fixa que partidos têm de reservar 30% de vagas para candidatas. Ocorre, no entanto, que as legendas não liberam às mulheres os recursos necessários para elas se elegerem – ainda que exista normatização sobre o tema -, priorizando sempre os homens. É preciso exigir a mudança dessa situação de machismo político, até porque as mulheres são aproximadamente 53% do universo eleitoral brasileiro.