Fernando Haddad passou metade de sua curta campanha tentando convencer o eleitorado de que era o representante do carismático ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a outra esforçando-se do contrário. Mas a sombra de seu padrinho político foi gigantesca para este comedido professor universitário, confrontado com uma missão impossível: substituir o líder histórico do PT.

Uma tarefa tão complicada quanto converter os 29% de votos que obteve no primeiro turno em maioria para frear, no segundo turno, em 28 de outubro, o tsunami Jair Bolsonaro, seu adversário do PSL, que teve 46% dos votos e é o franco favorito a se eleger presidente, segundo todas as pesquisas.

Não parecem ter sido suficientes os esforços deste ex-ministro da Educação de 55 anos para seduzir eleitores cansados, nem tampouco seus alertas reiterados sobre o caráter antidemocrático do rival, a quem acusou de fomentar a violência.

“Um professor tem muita mais chance de abrir um diálogo do que alguém como meu adversário, que nunca vi chamar ninguém para dialogar, que nunca aprovou nada relevante em 28 anos de mandato”, declarou em entrevista recente à AFP.

O problema para o ex-prefeito de São Paulo é que poucos mostraram intersse em dialogar com ele, em um país que parece ter dado as costas ao Partido dos Trabalhadores (PT).

Ele percebeu isto e seu antigo slogan – “Haddad é Lula” -, com o qual iniciou sua campanha correndo contra o tempo às portas da Superintendência da Polícia Federal, onde Lula cumpre pena de 12 anos e um mês de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, acabou se transformando em uma imagem muito mais neutra e afastada dos principais símbolos do partido.

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Incluindo o principal: seu mentor político. A última visita a Lula em Curitiba foi em 8 de outubro, horas após quase ter sofrido uma derrota histórica, passando por um fio para o segundo turno.

Até hoje não retornou.

– Comedido –

Se há um ponto em que Haddad tem demonstrado personalidade é o autocontrole diante dos ataques de adversários, que alguns confundem com distanciamento.

“Sou filho do casamento de um comerciante libanês com uma normalista. Aprendi em casa a negociar e conversar, e tenho um temperamento em geral tranquilo, mesmo nas situações mais adversas. As pessoas confundem isso com frieza, mas não é”, declarou em um artigo publicado em junho de 2017 na revista Piauí.

Só foi visto beirar a indignação, ao rebater algumas das muitas notícias falsas que circularam sobre ele na Internet ou negando acusações como a da Procuradoria de São Paulo, que o denunciou em setembro por suposta corrupção em sua gestão na Prefeitura, o que ele nega categoricamente.

Formado em Direito, com mestrado em Economia e doutorado em Filosofia, casado com uma dentista e pai de dois filhos, Haddad chegou ao ministério da Educação em 2005 – uma das pastas das quais Lula se sente mais orgulhoso.

Sua trajetória p colocou na linha de frente do PT, mas ele nunca deixou a sombra de seu mentor.

“Haddad só falava quando perguntado”, afirmou um ex-assessor de Lula à Gazeta do Povo em agosto.

– Paciência –

Não foi a primeira vez que Haddad começa mal em uma eleição. Ele também não era o mais cotado quando se candidatou à prefeitura de São Paulo em 2012, e acabou ganhando.


Aqueles tempos, entretanto, eram outros. Os do início do governo de Dilma Rousseff (2011-2016), quando a influência de Lula no meio político era praticamente incontestável.

Quatro anos depois, em 2016, Haddad sofreu uma esmagadora derrota nas urnas logo no primeiro turno, e teve que passar a prefeitura de São Paulo para o empresário liberal João Dória.

Muito criticado após as manifestações de 2013, desencadeadas pelo aumento nos preços das passagens, sua derrota foi outro grave revés para o PT, pouco depois do impeachment de Dilma Rousseff pelo Congresso.

Ele sempre soube, contudo, que voltaria à linha de frente do partido.

“Eu não sou uma pessoa ansiosa, espero as coisas acontecerem para tomar decisões. Eu sou um ser político, no sentido de ser participativo na vida pública, desde os tempos da faculdade”, afirmou em dezembro de 2016 ao jornal El País sobre uma possível candidatura nacional.


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