15/09/2023 - 13:06
O pintor e escultor colombiano das figuras voluptuosas, Fernando Botero, que morreu nesta sexta-feira (15) aos 91 anos, foi um dos artistas da América Latina mais reconhecidos no mundo, que defendeu ao longo de sua excepcional carreira a arte da generosidade através de suas obras.
“Penso com frequência sobre a morte e lamento deixar este mundo e não poder mais trabalhar porque tenho grande prazer trabalhando”, afirmou em entrevista à quando completou 80 anos.
Botero nasceu em 19 de abril de 1932 em Medellín, a segunda maior cidade da Colômbia, localizada nos Andes do noroeste do país. Filho de um modesto trabalhador do comércio, iniciou na arte precocemente e contra a vontade da família. Aos 15 anos, vendia desenhos com temas de touradas na entrada da Plaza de Toros La Macarena.
“Quando comecei, era uma profissão incomum na Colômbia. Não era aceita e não tinha nenhuma perspectiva. Quando disse à minha família que iria me dedicar à pintura responderam: ‘Bom, está bem, mas não vamos apoiá-lo’. Felizmente, fiz assim mesmo”, contou.
Após uma primeira exposição em Bogotá nos anos 1950, partiu para a Europa, passando por Espanha, França e Itália, onde descobriu a arte clássica. Sua obra também foi influenciada pelo muralismo do México, onde mais tarde se estabeleceu.
Sua carreira decolou nos anos 1970, após conhecer Dietrich Malov, diretor do Museu Alemão, em Nova York, com quem organizou exposições de sucesso.
“Passei de um completo desconhecido, que não tinha sequer uma galeria em Nova York, a ser requisitado pelos maiores ‘marchands’ do mundo”, contou Botero.
As formas dilatadas de sua arte, sua marca registrada, apareceram como uma revelação em 1957, por acaso, quando ao pintar um bandolim fez uma boca pequena demais para o instrumento e “entre o pequeno detalhe e a generosidade da linha exterior, criou-se uma nova dimensão, mais volumétrica, mais monumental, mais extravagante”, disse.
Botero não aceitava que suas figuras fossem classificadas como “gordas”. Apaixonado pelo Renascimento Italiano, apresentava-se como “defensor do volume” na arte moderna. Sua escultura, também marcada pelo gigantismo, ocupou um espaço muito importante em sua carreira, em boa parte desenvolvida em Pietrasanta (Toscana, Itália).
Botero se estabeleceu ali, embora nos últimos anos tenha vivido entre Mônaco e Nova York, onde tinha residências, e retornava a cada janeiro à sua fazenda nos arredores de Medellín.
“Gostaria de morrer sem perceber. Em um avião seria ideal”, confessou à revista Diners, em uma entrevista por seu aniversário de 90 anos.
Segundo a imprensa local, morreu por uma pneumonia.
O artista, que dizia que nunca sabia o que pintaria no dia seguinte, inspirou-se na beleza, mas também nos problemas de seu país, afetado por um conflito armado de mais de meio século. Assim, sua obra mostra cenas de guerrilhas, atentados e matanças.
Em 1995, uma bomba no centro de Medellín matou 23 pessoas e destruiu parcialmente uma de suas esculturas, “El Pájaro”, cujos restos permanecem no local.
Ele afirmava que a política “não é trabalho do pintor”, embora tenha feito uma exceção em uma série sobre agentes da prisão americana de Abu Ghraib, no Iraque.
Artista latino-americano mais vendido em vida, Botero bateu seu próprio recorde em 2022, quando sua escultura “Hombre a Caballo” alcançou US$ 4,3 milhões (R$ 22,43 milhões na cotação da época), em um leilão da casa Christie’s.
Também foi um importante patrocinador da arte, com doações estimadas em mais de US$ 200 milhões (mais de US$ 1 bilhão). O artista doou muitas de suas obras para museus de Medellín e Bogotá, que em 2012 foram declarados bens de interesse cultural pelo governo.
Foi “o pintor das nossas tradições e imperfeições, o pintor das nossas virtudes. O pintor da nossa violência e da paz”, escreveu o presidente Gustavo Petro na rede social X, antigo Twitter.
Muitas das obras de Botero decoram parques e praças, já que o artista afirmava que as exposições ao ar livre são uma “aproximação revolucionária” entre a arte e seu público. Uma ideia que estreou em 1992 em Paris, com uma exposição na Champs-Élysées, e que mais tarde levou ao grande canal de Veneza e para as pirâmides do Egito. Seus personagens com curvas imensas também desembarcaram na China em 2015, um sonho realizado, segundo comentou.
Casado três vezes e viúvo da última esposa, a escultora grega Sophia Vari, que morreu em maio, Botero enfrentou o luto pela morte de um dos filhos, de apenas quatro anos, após um acidente de trânsito. Mais tarde, outro filho se envolveu em um escândalo de corrupção.
Seu legado, que inclui mais de 3.000 pinturas e 300 esculturas, foi pautado por sua insaciável sede de criação. Nos últimos anos, trabalhou 10 horas por dia.
A mera ideia de abandonar os pincéis “me aterroriza mais do que a morte”, disse ele.
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