07/11/2024 - 12:41
Filme nacional mais aguardado de 2024, “Ainda Estou Aqui” estreia no cinema nesta quinta-feira, 7. O lançamento do longa no Brasil acontece em meio a uma turnê de apresentações em festivais pelo mundo, além da expectativa de uma indicação ao Oscar 2025.
Em entrevista exclusiva ao site IstoÉ Gente, Fernanda Torres, protagonista da obra, esclareceu sua declaração a respeito do peso da possibilidade de ganhar uma estatueta dourada. A atriz, que afirmou anteriormente que o Oscar “é importante, mas não é a medida de tudo”, explicou que estava apenas sendo realista com o cenário atual.
“Eu não estou desmerecendo, tá? Eu estou sendo realista. Eu acho que a chance é grande de o filme estar entre os filmes estrangeiros indicados, porque eu acho que o Walter é uma referência de diretor e porque eu acho o filme comovente e muito especial. O que eu não gosto é quando o filme não é reconhecido pelo fato de não receber uma indicação ou não levar um prêmio. O que eu quero dizer é que o filme já aconteceu como filme no mundo”, declarou.
A filha de Fernanda Montenegro acrescentou, no entanto, que acha mais difícil almejar a possibilidade de um Oscar na categoria Melhor Atriz devido à concorrência.
“É um ano muito difícil, que está bastante engarrafado na parte das atrizes. Só de eu estar na shortlist [lista das possíveis indicadas] da ‘Hollywood Report’, ‘Variety’ e ‘New York Times’ já é um milagre”, ressaltou ela, citando as atrizes concorrentes Tilda Swinton, Marianne Jean-Baptiste e Angelina Jolie.
Fernanda reforçou também que o importante de toda a repercussão e das especulações em torno da premiação é que o público reconheça a história.
“Como um certo orgulho nacional de a gente ter feito esse filme, espero que isso se confirme com as pessoas indo ao cinema. Aqui, no mundo, não teve uma sessão que a gente não tenha feito em que as pessoas não viessem falar com a gente comovidas com essa história. Então, é só passar a ideia de que o filme, de certa maneira, já está cumprindo um caminho luminoso. Só isso”, complementou a atriz, que acredita que “Ainda Estou Aqui” entrará para a história.
“Eu acho que tem filmes que entram para a iconografia brasileira, como ‘Terra em Transe’, ‘Central do Brasil’, ‘Cidade de Deus’, ‘Dona Flor’, e que passam a fazer parte das referências. E eu acho que o ‘Ainda Estou Aqui’ é um filme que vai entrar para essa iconografia. Quando tiver retrospectiva de filmes brasileiros ou de imagens icônicas do Brasil, eu acho que ele vai estar entre esses que citei”.
Dirigido por Walter Salles, o filme é baseado no livro homônimo e autobiográfico do escritor Marcelo Rubens Paiva e narra a história da mãe do autor, Eunice Paiva (Fernanda Torres), que teve de seguir em frente com os cinco filhos após o desaparecimento do marido, o ex-deputado Rubens Paiva (Selton Mello). Ele foi levado pelos órgãos de repressão na época da Ditadura Militar.
Ao ser questionada sobre a expectativa que a trama gera a todo o tempo sobre quando – e se – Rubens Paiva voltará algum dia para a família, Torres destacou que a forma como o filme foi rodado implicou em uma imersão completa dos atores nas vidas de seus personagens.
“O Walter [Salles] filmou cronologicamente e isso foi super importante, porque a gente acompanhou o filme como ele é. A primeira parte com o Selton [Mello] era solar, com aquela festa da família, com os amigos. E aqueles são os nossos amigos, o Selton é meu amigo, então eu tinha um amor profundo por ele. Aí, um dia, na filmagem, entraram aqueles agentes do DOI-COD e o Selton foi embora. E no dia que o Selton foi embora, ele nunca mais voltou para o filme. Eu olhei ele indo e falei: ‘Caramba, amanhã o Selton não vai estar aqui'”, revelou.
“A casa solar ficou escura. E a gente, que era tão risonho, comunicativo, ficamos todos mudos”, destacou ela, relatando como foram os dias de filmagem na cela.
“Eu fui levada para filmar o DOI-COD, a cela. Passei duas semanas presa e eu tinha saudade daquela casa. Depois que eu voltei, a casa já era diferente. E no dia em que eu digo que nós vamos todos embora, porque o Rio de Janeiro acabou’, a gente viu aquela casa ser desmontada. Era a nossa casa. O filme é cheio dessas paralelas e ajudou a criar uma realidade na gente, uma experiência real com aquele processo”, afirmou.
Quem assistir ao filme ficará impactado com a forma como Eunice lida com o desaparecimento do marido. Segundo Fernanda, o desespero e a dor da mãe de Marcelo Rubens Paiva a aproxima de um senso comum encontrado no povo brasileiro: o de seguir em frente, apesar de tudo.
“[a Eunice] É uma mulher que foi acometida por uma tragédia. E ela está sendo perseguida pelo Estado. Ela não vai ter nem direito de enterrar o marido e não tem como explicar isso para os filhos dela. Só resta seguir em frente. Eu sinto muitas vezes nas ruas um sentimento introjetado do brasileiro de vida. Não é uma vida fácil. Você vê alguém que passa três horas por dia em um ônibus para ir e voltar do trabalho. Há uma tragédia introjetada no Brasil também. Eu acho que [essa tragédia] está ali na Eunice. Ela sofre uma tragédia e a única maneira de ela existir e existir para os filhos é fazendo isso de forma grave, em silêncio”, refletiu.
Fernanda Torres também discordou da imagem que pintam do brasileiro ser extrovertido e, mesmo em um processo de luto, tentar encontrar o lado bom da vida.
“A gente tentou seguir muito a própria Eunice. E eu acho que o brasileiro está cada vez menos extrovertido. Mas a própria ficção é extrovertida, então a maneira da gente exibir a dor ou exibir a alegria é um certo código de atuação que a gente segue. Fica bom, mas de vez em quando você bate em um personagem como a Eunice ou em um diretor como o Walter, que exigem de você algo mais sutil. E aí realmente cria uma zona de emoção muito diferente. Foi muito diferente para mim fazer a Eunice”, encerrou.
Assista ao trailer: