Ao mesmo tempo em que o movimento de compradores diminuiu no interior das livrarias, tanto que diversas delas encerraram suas atividades, aumentou o número de adeptos de clubes de livros. Trata-se de um fenômeno paradoxal e cabe indagar: o que está levando gente apaixonada por leitura a essa mudança de comportamento? A resposta não é única, mas a principal delas é a união daquilo que se pode chamar de tradição mercadológica com a sofisticação da tecnologia. Essa nova forma de demanda fez com que as editoras passassem por uma adaptação nos moldes de comercialização, agora enviando os seus produtos diretamente aos clientes. Os assinantes dos clubes pagam mensalmente um valor fixo e recebem um livro escolhido por renomados curadores que trabalham para essas empresas literárias — é como se a obra escolhesse o leitor e não mais o contrário, já que os títulos são, na maioria das vezes, surpresa. Em um mundo onde tudo é virtual, tais clubes também disponibilizam a possibilidade de conexões. Ou seja: os assinantes têm acesso a encontros e debates onlines e usam aplicativos para interação com demais associados. Aí mora boa parte da magia e sucesso desse novo negócio.

124% foi o índice de aumento de novos adeptos do clube Intrínsecos em 2020

50 mil é o número  de assinantes  da Tag livros

“Os clubes de assinatura de livros tornaram-se um porto seguro para o mercado editorial brasileiro” Marcelo Bueno Catelan, analista de educação corporativa (Crédito:Rodrigo Zaim)

Outra história

O universo dos clubes de livros não é um ambiente totalmente desconhecido. Entre a década de 1970 e o início dos anos 2000 existiu no Brasil o chamado “Círculo do Livro”. A ideia era a mesma: fazer chegar mensalmente uma nova obra na residência dos associados. A diferença é que hoje os livros que os curadores elegem mensalmente seguem critérios editoriais com olhos em temas que estão colocados na sociedade. Por exemplo: acompanhando o justo e bom crescimento da luta contra o racismo, os clubes podem enviar uma obra atual, mas, também, um clássico do século 19 que já condenava a escravatura. Outro ponto: se alguém, em uma suposição, quiser ler somente histórias de terror, basta avisar o clube do qual é cliente e só receberá esse gênero literário. E há algo extremamente sofisticado: se um participante quiser um livro estrangeiro que ainda não foi traduzido no Brasil, pode requisitá-lo. O clube faz a tradução e o envia ao destinatário. “Eu assino cinco clubes diferentes e optei por aqueles que não anunciam qual será a próxima leitura”, diz Shirlei Milane. “Além disso, os encontros virtuais tiram o sentimento de solidão que me abate quando termino de ler e não tenho com quem compartilhar a história”.

Entre as principais editoras que escolheram esse nicho de mercado estão a Tag, Intrínseca, Todavia e Boitempo. Os números mostram que o conceito de comprar e ler está, de fato, mudando. Somente a Tag conta com mais de cinquenta mil assinantes em todo o País. Já o clube da editora Intrínseca teve um crescimento de clientes na casa dos 124% ao longo de 2020. “Eu acho que é uma mudança que vai continuar acontecendo porque a demanda por troca de conhecimento sempre existiu”, diz Marcelo Bueno Catelan. “É uma fórmula que o mercado editorial brasileiro fez bem em descobrir”. Essa nova atmosfera que se criou dentro do mercado editorial claramente expandiu-se para demais horizontes. Aficionados por livros também passaram a se reunir de maneira independente. Pequenos ou grandes grupos fazem leituras orientadas, discutem capítulo por capítulo e reúnem-se para dirimir dúvidas, ampliar descobertas e questionamentos. “São percepções diferentes sobre um mesmo assunto. E, durante a pandemia, serviu como gigantesco refúgio”, diz Letícia Teixeira. “Envolvem estilos de vidas diferentes que transformam o simples fato de ler em uma nova experiência de vida”.